Bairro em que a tranquilidade cedeu espaço ao medo, o Sion, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, vem acumulando ocorrências de assaltos, arrastões em restaurantes, arrombamentos de veículos, furtos e sequestros-relâmpago. Ontem, esse clima de insegurança chegou ao seu ponto mais alto com uma execução à luz do dia, em um dos pontos mais movimentados da área. Logo pela manhã, o flanelinha Cleiton Roberto Lopes, de 30 anos, conhecido como Neném, foi assassinado na Praça JK, às 7h, quando diversas pessoas se exercitavam e crianças brincavam no local, usado habitualmente para a prática de atividades físicas e lazer. O que mais impressionou testemunhas do crime foi a frieza dos três assassinos, que atiraram à queima-roupa no homem, que morreu no local, próximo à casa do vice-governador, Antônio Andrade. “Escutei um barulho, que achei que era bomba, e vi os três fuzilando o rapaz na minha frente. Depois de baleado, ele ainda fez um movimento final de cabeça. Um dos assassinos voltou e deu um tiro de misericórdia”, contou um morador do bairro. Ao todo, foram pelo menos 13 disparos. A testemunha havia acabado de chegar à praça e entregaria o carro ao lavador, que trabalhava diariamente no local. Com o susto, a testemunha voltou pela contramão pela Rua Engenheiro Caetano Lopes e estacionou bem longe do ponto onde faz caminhadas todas as manhãs.
Depois das vários crimes em pontos comerciais – especialmente nas avenidas Uruguai e Nossa Senhora do Carmo – e de rotineiros casos de assaltos e arrombamentos de veículos nas ruas mais desertas, moradores se queixam da mudança de perfil do bairro. “Antes era tranquilo viver aqui. Atualmente, estou impressionada com a violência. Todo mundo tem uma história para contar. Eu já fui assaltada e recentemente minha irmã também, em plena Avenida Uruguai. À noite, as ruas ficam escuras e se chego em casa de carona, desço do carro correndo, com a chave na mão e morrendo de medo”, disse a universitária Jéssica Vieira Taves, de 23. Ele reclama da falta de policiamento no bairro e diz que há poucos dias uma loja de móveis vizinha à sua casa foi arrombada. “Chamamos a polícia, mas eles chegaram depois de 50 minutos, quando os bandidos já tinham fugido e deviam estar bem longe. Até os donos da loja chegaram antes da polícia e entraram sozinhos no estabelecimento”, contou a moça.
Frentista de um posto na Avenida Uruguai, Bruno Marra, de 37, disse também ter sido vítima de bandidos no Sion. “A violência no bairro está geral. Já fiquei refém de um rapaz que chegou aqui com uma faca imensa e me ameaçou de morte. Ele foi embora levando o troco que eu tinha na hora e também o meu sossego. Fiquei amedrontado por muito tempo. Não podia ver uma faca que me lembrava do caso”, disse. Segundo o colega dele André Felipe Monteiro, de 28, são frequentes os casos de furtos em ruas vizinhas ao estabelecimento.
Um morador do bairro que pediu para não ser identificado fez coro às queixas quanto aos problemas de segurança. Segundo ele, havia um pelotão da Polícia Militar instalado no Sion que servia de base para policiais da 127ª Companhia, responsável pelo patrulhamento da área. Há cerca de três anos, no entanto, a corporação encerrou as atividades no local para dar lugar a rondas táticas pela região. “Foi uma luta da comunidade para que a polícia estivesse mais presente. O sossego havia retornado, mas, depois que abandonaram o posto e descentralizaram o serviço, o Sion ficou desguarnecido. Falta policiamento. O bairro está entregue à própria sorte”, critica o morador.
Na avenida Nossa Senhora do Carmo, corredor já apontado pelo site Onde fui Roubado como um dos 10 locais onde mais ocorrem assaltos, os relatos também são de perigo e medo. De acordo com comerciantes, criminosos em motocicletas são os principais responsáveis pelos crimes. Eles costumam abordar as vítimas em sinais ou pontos de ônibus, fugindo com carteiras e celulares.
Um dos casos de maior repercussão na Nossa Senhora do Carmo ocorreu em 27 de maio do ano passado: uma troca de tiros entre policiais militares e dois criminosos causou pânico entre comerciantes e pedestres na via, exatamente na altura do Bairro Sion. Os assaltantes roubaram dois estabelecimentos na Avenida Uruguai e foram surpreendidos na fuga pela PM. A dupla saiu em direção à avenida, onde houve o tiroteio. Um cliente e um frentista foram atingidos. Um comerciante que trabalha perto e pediu para não ser identificado, por medo de represálias, presenciou o caso. “A polícia saiu atirando na rua. Foi um perigo. Os dois bandidos foram presos, mas as pessoas atingidas poderiam ter morrido”, lembra. Segundo ele, assaltos são rotineiros na avenida, que serve ainda como corredor de fuga para os bandidos.
Dois policiais que faziam o patrulhamento ontem na Avenida Uruguai contaram que grande parte dos crimes no Sion e nos bairros do entorno são praticados por moradores de aglomerados vizinhos, especialmente o Morro do Papagaio. “Existe uma disparidade econômica muito grande na região. Os criminosos vêm praticar assaltos aqui, porque sabem que o poder aquisitivo dos moradores do Sion é alto”, disse um deles. “Mantemos presença policial para intimidar a ação dos bandidos, especialmente nos corredores comerciais”, afirmou o outro militar.
Apesar da queixa dos moradores, a Polícia Militar sustenta que os crimes estão em queda no Sion. “A curva é decrescente, se comparado este trimestre com o mesmo período do ano passado. Recebemos, sim, ocorrências, principalmente de arrombamento de veículos, mas as estatísticas do Sion não são diferentes do restante da cidade”, afirmou o comandante da 127ª Cia, major Fabiano Rocha. Segundo ele, o pelotão que funcionava no bairro foi desativado porque a filosofia de trabalho da polícia mudou. “O policiamento fixo não é mais estratégia da PM. Temos o patrulhamento da base móvel, de duas duplas de bike-patrulha, equipes de moto-patrulha, além do monitoramento de rotina e as redes de vizinhos e comerciantes protegidos.” Segundo o comandante, não há previsão de aumento no efetivo do bairro.
O major Fabiano Rocha afirmou ainda que a morte do flanelinha na manhã de ontem foi um caso isolado. “Ele já tinha envolvimento anterior com a criminalidade. Há anos o Sion não registrava nenhum homicídio.” O filho da vítima dos disparos na Praça JK, desolado, esteve no local após o crime. Cleiton era morador da Vila Acaba Mundo, vizinha à praça. Até o fechamento desta edição, os três assassinos não haviam sido presos, segundo a sala de imprensa da PM.
Outros casos de violência
27/5/2014
» Dois homens foram presos, suspeitos de assaltar várias lojas na avenida Nossa Senhora do Carmo. O crime ocorreu à tarde, horário de grande movimento na via. De acordo com a Polícia Militar, os dois fizeram um arrastão na região e roubaram pelo menos três lojas. Uma viatura que fazia o patrulhamento no local flagrou os suspeitos em uma motocicleta. Os homens chegaram a atirar contra a viatura na avenida Uruguai, mas foram detidos e encaminhados à Companhia da PM no Bairro São Pedro.
30/5/2014
» Uma tentativa de assalto terminou com uma pessoa baleada na Nossa Senhora do Carmo. A vítima, um advogado que estava parado no sinal de trânsito, foi abordado em seu veículo, um Volvo XC60 por um rapaz que estava em uma motocicleta preta. O assaltante exigiu que ele entregasse o Rolex que usava. A vítima disse aos policiais que estava tirando o relógio quando o criminoso disparou e atingiu uma de suas pernas. O ladrão fugiu em seguida.
8/8/2014
» Assaltantes fizeram um arrastão em um restaurante na Rua Flórida. Cerca de 20 pessoas estavam no local e enfrentaram momentos de pânico. Segundo as vítimas, enquanto um criminoso armado recolhia os objetos, outro dava instruções para o comparsa atirar. Os bandidos fugiram levando celulares, tablets, dinheiro e outros pertences dos clientes.
6/10/2014
» Dois menores, um de 14 e outro de 17 anos, foram apreendidos, suspeitos de fazer um arrastão em um restaurante de comida japonesa no Sion. Outros dois envolvidos no assalto conseguiram fugir. Foram levados dinheiro e pertences pessoais dos clientes, como celular.