Jornal Estado de Minas

Corte financeiro e demissões na UFMG criam ambiente de tensão

Servidores temem que trabalhos acadêmicos e pesquisa se percam com crise. Situação gera incerteza quanto ao futuro da instituição

Jefferson da Fonseca Coutinho

Falta de manutenção de equipamentos deixa banco quebrado no câmpus Pampulha - Foto: Jefferson da Fonseca Coutinho/EM/D. A PRESS

Nos dois dias de volta ao câmpus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a reportagem do Estado de Minas encontrou estudantes revoltados e trabalhadores, pais de família, apreensivos, além de biblioteca com horário reduzido por falta de pessoal; materiais escassos para trabalhos acadêmicos; pesquisas em campo suspensas e ajuda de custo reduzida para a pós-graduação. Sem falar em guaritas vazias, obras abandonadas e serviço de limpeza insuficiente. O clima é ainda mais tenso entre alunos e servidores com a expectativa de que, mesmo com a normalidade no repasse dos recursos pelo governo federal, a administração mantenha os cortes nos gastos. Para os manifestantes menos otimistas, o que está em curso é o “desmonte da universidade pública”, como diz a faixa afixada em um dos bandejões.


Izabella Lourença, de 21 anos, lamenta a situação de necessidades comprometidas do hospital universitário e de outros departamentos da universidade fora do câmpus. A estudante de comunicação social critica as demissões e chama a atenção para a falta de materiais que já começam a afetar os trabalhos acadêmicos. “A biblioteca da Letras já não funciona 24 horas por falta de funcionário na portaria. Na psicologia, tem uma matéria que depende de alguns testes que foram suspensos. O corte está inviabilizando uma disciplina inteira”, considera.

Izabella enumera ainda a pós-graduação prejudicada pela falta de ajuda de custo para pesquisas.


Na Praça de Serviços, os professores Tarcísio Mauro Vago e Rodrigo Ednilson de Jesus, ambos da Pró-reitoria de Assuntos Estudantis (Prae), estão na arena para encontro com os alunos da universidade. Além do drástico corte de recursos, questões emergenciais como a situação dos alunos estrangeiros e a falta de assistência às estudantes mães tomaram a pauta e sensibilizaram os presentes. Ana Gabriela Chaves Ferreira, emocionada, criticou a falta de apoio da universidade aos jovens pais e exigiu transparência no processo seletivo da Unidade Municipal de Educação Infantil (Umei) no câmpus. “A prioridade é para filhos de professores, de servidores e, por último, de estudantes. Não está certo”, criticou.


As duas mulheres em fim de expediente caminham rumo à Avenida Antônio Carlos. Mesmo apressadas, as duas topam conversar sobre o clima entre os prestadores de serviços, desde que, por medo de retaliações, não sejam identificadas. A mais velha, com tempo maior de trabalhos prestados no câmpus, é a mais otimista. “Com o dinheiro que vão ter que me pagar, vou montar um negócio com o meu irmão”, diz. A senhora está de aviso prévio? “Não. Ainda não. Mas tem gente falando que vão mandar mais gente embora”. A outra diz que já está procurando um novo trabalho e que está preocupada é com os filhos pequenos. Ela conta que a melhor amiga foi demitida e que ainda não sabe o que vai fazer da vida.


No rastro das demissões em massa, a Liga Operária busca convencer estudantes, professores e servidores pela greve geral.

O sindicalista junto às faixas de “luto contra os cortes” prega a união de todos os cidadãos do câmpus em defesa da universidade pública, “cada vez mais precária e sucateada pelo governo”. O coletivo UFMG sem catracas, que conta com 20 integrantes mobilizadores, levou cartazes para os restaurantes populares para sensibilizar e engrossar o coro dos manifestantes. Vários sujeitos toparam posar com as mensagens em defesa da educação para publicação nas redes sociais.

Nos dois dias de imersão e encontros com alunos, professores e servidores, foram muitas as conversas informais e anotações. O aluno da pós-graduação, com receio de aparecer e ser prejudicado, enviou mensagem para colaborar com a matéria: “Percebi a insegurança dos alunos com relação ao pagamento das bolsas, já que tivemos atrasos. Não sabemos até quando não teremos greve. O combustível dos automóveis utilizados para transportar os alunos está acabando, o que poderá comprometer as aulas de campo. Não sabemos até onde essa situação chegará”.


Nas duas arenas de encontros, para o representante da reitoria, as conversas com os alunos caminharam no sentido da construção, em conjunto, de soluções para a crise. Professor Tarcísio garante que as “opções duríssimas, que também nos causam dor” não provocam impacto na vida acadêmica da universidade. Parafraseando Paulinho da Viola, o pro-reitor diz que o momento é fazer como “o velho marinheiro, que durante o nevoeiro leva o barco devagar”. O professor Tarcísio fala em constrangimento.

“Pela necessidade de muitas das reivindicações, que, infelizmente, não estão nas nossas mãos”, pontuou. Na próxima quinta-feira, dia 26, lideranças sindicais e estudantis esperam parar a UFMG em ato de protesto.

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