O manto azul com aplicações douradas, as rendas no contorno do véu branco e os bordados do vestido deram majestade à imagem de Nossa Senhora das Dores, que seguiu em procissão no andor em busca de Nosso Senhor dos Passos, na noite dessa quarta-feira, em Santa Luzia, na Região Metropolitana Belo Horizonte. O cuidado com as imagens de Maria e Jesus é uma tradição centenária no município repassada de geração a geração. A imagem de Jesus saiu da Capela do Carmo e se encontrou com a de Nossa Senhora das Dores, que saiu da Capela de Nossa Senhora da Conceição, na praça da Igreja do Rosário, e ambas seguiram para o Santuário de Santa Luzia, na praça da Matriz.
Durante todo o dia, dezenas de fiéis foram à capela admirar as novas vestes da santa. O tecido foi comprado na Espanha pela luziense Beatriz de Almeida Teixeira, quando visitou o conterrâneo Marco Aurélio Fonseca, que faz mestrado em Madri. Depois coube à modista e estilista Branca Diniz dos Santos criar o desenho das vestes. Ela recebeu os tecidos na quarta-feira de cinzas e desde então abriu seu ateliê em Belo Horizonte, para que as amigas pudessem colaborar na confecção. Um grupo ajudou a confeccionar as peças durante a quaresma. “Observamos e estudamos o barroco mineiro para fazer as vestes.
O costume de cuidar dos santos é tão antigo quanto a cidade de Santa Luzia e passa de mãe para filha. Prestes a completar 100 anos, Luzia Fonseca é uma das mais antigas guardiãs da tradição. Recebeu a missão quando tinha 18 anos de Maria da Assunção Vieira. Ao lado de Lúcia Dolabella cuidou, lavou e guardou as vestes de Nossa Senhora. Como a amiga já é falecida, Luzia é quem repassa para outras mulheres a maneira de conservar as vestes da mãe de Jesus.
Lúcia já havia passado a responsabilidade para Alexa Gabrich, e Luzia passou para Maria Goretti Gabrich. “Tem que ter responsabilidade e zelar para que tudo fique direitinho”, ensina Luzia. Depois de 82 anos na função, ela sentiu que era o momento de transmitir o legado para as gerações seguintes. Ainda assim, acompanhou todo o processo de vestimenta da imagem na terça-feira. “Antigamente, as senhoras olhavam os altares. Cada imagem tinha uma responsável.”
A arquiteta Albertina de Almeida Gabrich, de 49, é uma das mulheres que mantém a tradição. Ela herdou da avó a tarefa de cuidar da imagem de Nosso Senhor morto.
Quem viu o novo manto de Nossa Senhora aprovou. É o caso da auxiliar de dentista Antônia Maria das Graças Rezende, de 58, que foi até a capela, onde a imagem estava, para fazer orações. “Não tem outra santa bonita como esta. Em todas as outras cidades em que já fui, nunca vi uma Nossa Senhora tão bonita. As pessoas que fizeram essa roupa são luzienses mesmo. Têm amor pela cidade e pela história”, elogiou..