As restrições de uso da água que alimenta os reservatórios Serra Azul, Rio Manso e Vargem das Flores, integrantes do Sistema Paraopeba, com base nas três portarias publicadas nessa quinta-feira pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), vão afetar principalmente a captação de água da Copasa. Do volume total que precisa ser cortado em 26 outorgas para atender o que determinam as portarias – calculado em 2.648 litros de água por segundo (l/S) –, 96,33% está na conta da empresa de saneamento, o que significa 2.550 l/s, em sete autorizações. Na conta das empresas mineradoras, por exemplo, o corte em 11 outorgas significará 87 l/s a menos nas captações, ou 3,26% de tudo que deverá parar de ser sugado, pelo menos nos próximos 30 dias, dos cursos d’água que contribuem para o abastecimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Como a companhia de saneamento informa que já havia reduzido sua captação antes mesmo da determinação do Igam, a economia no sistema com as novas medidas tende a ser mínima.
As portarias 13, 14 e 15 de 2015 indicam que a água acumulada no Sistema Paraopeba não será capaz de atender a totalidade das outorgas até o fim do período de seca, um dos pré-requisitos para que se determine o estado de escassez hídrica. Neste momento, as medições dos mananciais que alimentam os três reservatórios apontam para um quadro de restrição de uso, o que significa quatro tipos de cortes na captação nos próximos 30 dias. Para o abastecimento humano, é necessário reduzir em 20% o volume retirado. Para a irrigação, a retirada deve ser reduzida em 25%, enquanto a coleta de água destinada a uso industrial deve diminuir 30%. Outros usos precisam cortar 50%. Neste primeiro momento, o Igam identificou apenas 26 outorgas sujeitas a esses cortes, que se referem exclusivamente às retiradas de água de superfície. As captações subterrâneas ainda serão alvo de outra deliberação, a ser definida em até seis meses. Essa realidade reduz ainda mais o efeito prático das portarias do Igam.
O professor Luiz Rafael Palmier, do Departamento de Engenharia Hidráulica e Recursos Hídricos da UFMG, lembra que, se houvesse respeito à lei das outorgas e não houvesse captações clandestinas, o quadro poderia se outro. “Certamente, a necessidade de corte seria menor, mas a dificuldade de fiscalização faz com que o problema tenha que ser resolvido com a limitação nas outorgas regularizadas, especialmente a água da Copasa, que abastece a população”, afirma o especialista.
Além das 18 outorgas que autorizam captação para Copasa e para mineradoras, outras oito fecham a conta das 26 que serão alvo das restrições anunciadas pelas portarias do Igam. Nesse grupo se enquadra, por exemplo, a retirada do recurso para irrigação de lavouras, cujo corte deverá ser de 25% do total autorizado. Economizar um quarto da água que pode captar não é uma tarefa impossível, na análise do agricultor Sílvio dos Santos, encarregado de uma plantação de 8,4 hectares, em Itatiaiuçu, na Grande BH, parte da Bacia do Rio Manso. Contudo, investimentos e adaptações precisariam ser feitos. Assim como ele, os demais produtores contatados pelo Estado de Minas na região não sabiam que a partir de ontem deveriam reduzir suas captações, seguindo o que determina o Igam.
As ramas de chuchu que Sílvio cultiva são abastecidas por um sistema arcaico de valas, que se distribuem por um labirinto de caminhos escavados na terra. Uma bomba elétrica suga a água de um afluente do Rio Manso, por uma tubulação de 540 metros, até o alto do terreno, antes de despejá-la em uma vala central. Esse canal principal é conectado a diversos ramais, que ficam bloqueados por terra e precisam ser abertos a enxadadas pelos agricultores, para que a água chegue aos canteiros.“Se a gente mudasse para um sistema de gotejamento, teria mais ganhos, economizaria mais água e até o serviço seria mais leve. Mas daí precisamos negociar, porque o custo disso não é baixo. Mas, se for lei e não tiver outro jeito, a gente tem como fazer”, afirma.
Para garantir o cumprimento das captações com base nas portarias publicadas ontem, o Igam pretende instalar equipamento que meça o número de horas trabalhadas pelas bombas nos pontos de captação das represas do Rio Manso, Vargem das Flores e Serra Azul. O aparelho, chamado horímetro, vai reforçar o controle do consumo de água, atualmente feito apenas por hidrômetros. “Estamos trabalhando uma portaria nesse sentido”, informou a diretora-geral do Igam, Fátima Chagas. Atualmente, a fiscalização do uso de recursos hídricos pelas empresas, entre elas a Copasa, é feita por 70 fiscais da Subsecretaria de Fiscalização, da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, com apoio de 10 técnicos do Igam e cerca de 1,4 mil policiais militares.
PUNIÇÃO Segundo Fátima, os fiscais estão preparados e são suficientes para fazer cumprir o decreto de escassez hídrica. As empresas que não cumprirem a meta da portaria em 30 dias podem ter as outorgas canceladas, até que se regularizem. “A fiscalização será maior no Rio Manso, que tem o maior número de outorgas. Além disso, vamos reforçar a fiscalização para descobrir possíveis captações clandestinas”, disse a diretora, lembrando que a prioridade é o abastecimento público. Dentro de 30 dias, será feito um novo balanço hídrico no Sistema Paraopeba. A concessão de mais outorgas está suspensa na bacias que alimentam as três represas, enquanto valerem as normas de restrição de uso, pelo menos pelos próximos 30 dias ou até que a portaria eventualmente seja revogada.
A Copasa informou que, devido à campanha de redução do consumo, já vinha captando cerca de 20% a menos do que tem autorização no Sistema Paraopeba. Por isso, neste momento, o abastecimento não sofrerá alteração. “Medidas como racionamento ou rodízio só serão tomadas em caso de extrema necessidade e terão como critério o menor impacto possível para a população. Todos os estudos da Copasa estão sendo compartilhados e analisados com a Agência Reguladora dos Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário de Minas Gerais (Arsae/MG)”, diz nota enviada pela companhia.