A polícia de João Pinheiro, na Região Noroeste de Minas Gerais, está à procura do proprietário de uma falsa clínica terapêutica que foi fechada em uma operação do Ministério Público (MP) com as polícias Civil e Militar no fim de março. Outras três pessoas foram presas. Segundo o promotor da cidade, os internos do local estavam em cárcere privado, e viviam sob constante ameaça e torturas. Entre as vítimas, há crianças. Armas de fogo, medicamentos e um aparelho de choque foram apreendidos.
A iniciativa da operação partiu do promotor Luís Gustavo Patuzzi Bortoncello, autor de uma ação civil pública contra a clínica. O caso veio à tona a partir da denúncia de um ex-interno no fim do ano passado. A partir de então, o MP da cidade começou a recolher provas que confirmavam as irregularidades. “Eles recebiam o contato de alguma pessoa próxima de usuários de drogas ou álcool, e sequestravam a pessoa na residência, trabalho ou na própria via pública. Um grupo de quatro abordava essas pessoas, injetava um tranquilizante e a pessoa só acordava no local”, explica o promotor.
A falsa casa de recuperação tinha muros altos, cerca elétrica e grades nas portas e janelas dos alojamentos. Além de ser levados contra a vontade, os pacientes não passavam por tratamento ou avaliação psicológica. “Dos 38 internos, apenas três tinham decisão judicial encaminhando para clínica, mas sem avaliação psiquiátrica, o que contraria a lei antimanicomial”, afirma Bortoncello.
O Ministério Público descobriu que as visitas em proibidas. Só havia permissão para um telefonema mensal pela família, com a supervisão de um monitor. As famílias desconheciam o que acontecia no local. Crianças, adolescentes, adultos e idosos conviviam no mesmo ambiente e eram alvo de violência. “Sempre que um interno questionava as normas, ele era eletrocutado com uma máquina de choque de fabricação caseira. Ou amarravam o interno, misturavam remédios de uso restrito e obrigavam o interno a ingerir”, explica o promotor. Segundo ele, vítimas relatavam que ficavam desacordadas por mais de 24 horas.
A comunidade recebia internos de todo o estado, além do Distrito Federal e Goiás. “A clínica retinha todos os documentos pessoais, cartões bancários com a senha. Era dali que ela se alimentava financeiramente, além da família ou municípios”, detalha o promotor. O auxílio vinha por meio de dinheiro ou cestas básicas.
A operação que libertou os pacientes começou às 7h e terminou às 16h de 27 de março. Durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão, MP e os policiais apreenderam medicamentos de uso controlado sem receita médica enterrados em uma horta, três armas e a máquina para eletrocutar as vítimas. As pessoas foram levadas para suas casas em transporte oferecido pelo município.
Conforme o promotor, os homens detidos negaram todos os crimes. Atualmente eles estão no Presídio de João Pinheiro. Eles foram indiciados por formação de quadrilha, tortura, cárcere privado e posse ilegal de arma de fogo. Os suspeitos ainda foram impedidos de exercer qualquer atividade nesta área e tiveram bens móveis, imóveis e contas bancárias indisponibilizados. O Ministério Público também busca a restituição dos valores cobrados dos internos, pagamento de dano moral coletivo e encaminhamento dos pacientes para tratamento ambulatorial.