Se, por um lado, Belo Horizonte supre a necessidade da população de cidades da Região Metropolitana que suspenderam a realização de partos em suas maternidades, abrir as portas para gestantes de fora traz um impacto para o serviço de saúde da capital. No Hospital Municipal Odilon Behrens (HOB), por exemplo, onde 240 nascimentos são atualmente feitos por mês, o atendimento a parturientes da Grande BH representa 40% do total de partos. A unidade, referência em procedimentos de alto risco, diz ter aumentado em 30% sua demanda depois do fechamento de maternidades nos municípios vizinhos e também em Belo Horizonte. “Tal aumento gera transtornos, como superlotação da maternidade, sobrecarga da equipe assistencial, diminuição do conforto para pacientes e contratempos nas pactuações existentes, o que dificulta o atendimento aos usuários”, informou o hospital por meio de nota.
Por ser um pronto-socorro de portas abertas, ou seja, trabalha sem restrição de atendimento, independentemente da classificação de risco do paciente, o Odilon Behrens recebe muitas gestantes já em trabalho de parto. Uma delas, a cabeleireira Natália Rosa da Silva, de 25 anos, acabou de dar à luz ao bebê Arthur. Ainda internada em um dos leitos do HOB, ela conta que não teve outra saída a não ser vir para a capital. Moradora de Santa Luzia, na Região Metropolitana, Natália chegou a fazer o pré-natal em sua cidade, mas foi obrigada a sair às pressas para o parto em BH já que a bolsa do líquido amniótico havia estourado. “É ruim ter que sair da cidade da gente para fazer o parto, mas ainda bem que temos essa possibilidade, já que a maternidade em Santa Luzia está fechada. Fiquei apreensiva. Tive medo de que algo acontecesse comigo ou com o bebê. Ainda bem que deu tudo certo”, disse.
RISOLETA NEVES Pamela Cristina Cardoso, de 17, moradora do Bairro Nova Conquista, também em Santa Luzia, passou pela mesma situação. Miguel, de 5 meses, filho dela com o repositor Pablo Moreira de Jesus, de 19, também nasceu em BH, no Hospital Risoleta Neves. “Meu médico avisou que não tinha jeito de o bebê nascer em Santa Luzia, que eu tinha que ir para outra cidade mais perto. O Risoleta Neves estava lotado no dia. Só fizeram o meu parto porque meu filho já estava nascendo quandocheguei. Todo mundo da região agora só ganha nenê lá. É muito parto e sobrecarrega o hospital”, disse Pamela, que é menor e teve a gravidez considerada de risco. “Depois de tanto sufoco que passei, vou pensar duas vezes antes de ter outro filho”, decidiu.
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, como Belo Horizonte sempre foi referência em atendimento, é inegável que tenha sofrido impacto com o fechamento de maternidades na Região Metropolitana. Gerente de Regulação e Atenção Hospitalar, Christine Ferretti diz, no entanto, que a pressão sobre a rede da capital é percebida em todo tipo de procedimento, especialmente nos mais estrangulados, como alguns tipos de cirurgias. Sobre os partos, afirmou não ser possível, de imediato, mensurar o impacto, no atendimento, que chega pulverizado nas maternidades que atendem ao SUS em BH.
Prefeituras das cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte alegam dificuldades financeiras para manter equipes de especialistas e, consequentemente, ter o serviço de partos ativo. Ao mesmo tempo, as unidades da capital afirmam não haver pactuação direta entre os municípios e o hospital, sendo esta feita pelo estado, município a município, para casos de gestantes de alto risco. No caso do Odilon Behrens, a direção garante que o atendimento extra gera um significativo impacto nos investimentos que poderiam ser realizados no hospital.
Falta de dinheiro é a maior dificuldade
No caso de Vespasiano, a prefeitura informou que os partos foram suspensos devido ao atraso de repasse financeiro da Secretaria de Estado da Saúde, o que ainda permanece. De acordo com o órgão, os procedimentos serão retomados nos próximos dias, depois de recomposto o plantão de obstetrícia. “O município tem uma maternidade que foi reformada e ampliada com recursos próprios e que era mantida em parceria com o estado. Com o atraso, os pacientes estão sendo encaminhados para cidades próximas e para a capital”, informou a administração municipal por meio de nota.
Sabará afirma que a suspensão dos partos, em 2008, se deu porque o custo da maternidade da Santa Casa era superior à arrecadação, além da média de partos previstos não ser suficiente para custear os gastos, segundo a direção administrativa do hospital. De acordo com a prefeitura, há um projeto de construção da maternidade municipal, previsto para começar em junho, com prazo de execução de um ano. A cidade não tem mais o credenciamento para realização dos procedimentos e as crianças filhas dos moradores nascem na Santa Casa de Belo Horizonte e no Sophia Feldman, também na capital. Segundo a administração municipal, Sabará tem pactuação financeira com BH para a realização desses partos.
EM BUSCA DE SOLUÇÃO Por meio de nota, a SES informou que as cidades da RMBH, citadas nesta reportagem, suspenderam os partos por decisão do próprio serviço hospitalar, mas que continuam realizando procedimentos ginecológicos eletivos e fizeram outros tipos de cirurgias no último ano. Segundo a secretaria, além da pactuação para realização de partos entre os diversos municípios, o governo está trabalhando para construção de fluxos que contemplem, inclusive, os períodos de sobrecarga. O secretário de Saúde, Fausto Pereira dos Santos, informou que equipes da secretaria estão atuando diretamente com os gestores de unidades que suspenderam serviços ou estão com problemas de fluxo para tentar resolver os problemas.
Em Lagoa Santa, a prefeitura informou que assinou pactuações com cidades da região e as gestantes são encaminhadas para fazer o parto nas vizinhas Vespasiano, Pedro Leopoldo e, se necessário, em Belo Horizonte. Os nascimentos na cidade foram suspensos em outubro de 2013, quando a maternidade da Santa Casa foi fechada por decisão judicial, por suspeita de irregularidades dos ex-dirigentes. De acordo com o secretário municipal de Saúde, Fabiano Moreira, a direção antiga alegou que o valor repassado era insuficiente para manter o serviço da maternidade em funcionamento. Mas no acórdão da decisão do TJMG foram citadas irregularidades administrativas. A Prefeitura de Santa Luzia foi procurada, mas não se posicionou sobre o assunto.