Cresce a violência dos ladrões de carros em Belo Horizonte. De acordo com dados de furtos e roubos de veículos na capital, divulgados pela Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), em 2014 houve aumento de 29% nas ações em que os criminosos usaram armas ou outro instrumento para abordar motoristas, em comparação com 2013. De janeiro a novembro do ano passado, foram registradas 4.670 ocorrências de roubo com o emprego de violência, contra 3.594 registros desse mesmo tipo de ação em igual período anterior.
Em contrapartida, os furtos, que se configuram quando o carro é retirado sem a percepção do responsável e, consequentemente, sem violência, caíram 9% em BH. Esse aumento fez, em 2014, os roubos superarem os furtos, o que não ocorreu em 2012 e 2013, segundo o levantamento da Seds.
No caso das motocicletas houve aumento tanto de furtos como de roubos (veja quadro). Quanto aos carros, a Polícia Civil atribui a diferença de comportamento entre furtos e roubos ao fato de ser muito mais fácil o ladrão usar uma arma e intimidar o motorista do que insistir em técnicas de arrombamento e acionamento do veículo sem a chave.
Enquanto isso, a população sofre com as tentativas dos bandidos, como ocorreu com o advogado G., de 29 anos. Em 8 de abril, ele voltava para casa no Bairro Camargos, Noroeste de BH, depois de um culto em uma igreja de Contagem, na região metropolitana. Quando foi deixar um amigo em casa, no mesmo bairro onde mora, acabou surpreendido por dois bandidos armados, um com revólver e outro com pistola.
“Um assumiu a direção e o outro ficou no banco do passageiro com a arma apontada para nós dois. O tempo todo ele estava com o dedo no gatilho e nos ameaçava. Diziam que não teriam problema em nos matar”, relembra G.. Depois de seguir por alguns quilôtross na BR-040, os dois amigos foram abandonados em uma estrada de terra aparentemente em Ribeirão das Neves, na Grande BH. “Estávamos com nossos instrumentos musicais. Eles jogaram tudo para fora do carro e mandaram que ficássemos de costas. Nessa hora pensei que ia morrer. Pensei também no meu filho de apenas 20 dias”, contou.
O jeito foi andar com os equipamentos nas costas por cerca de dois quilômetros até chegar à BR-040, onde conseguiram carona de ônibus até o Bairro Gameleira (Oeste) e depois de táxi até o Camargos, onde houve o registro da ocorrência. “Esse modus operandi é muito mais vantajoso. Eles nos abordam, nos levam para um lugar difícil e ganham umas duas horas de frente para fugir. Muito melhor do que arriscar a mexer em carros com alarme ou outros dispositivos”, afirma.
Mário Marriel Pedro, de 40, viveu situação semelhante no mesmo dia. Depois de sacar dinheiro, transitava pelo Bairro das Indústrias, no limite de BH e Contagem, quando parou para comprar uma pizza. No carro ficou a esposa e um de seus três filhos, um bebê de cinco meses. As outras crianças, de 12 e 7 anos, respectivamente, desceram com o pai.
“Minha menina falou que tinha dois homens entrando no carro. Quando cheguei perto, eles apontaram o revólver e levaram o carro com minha mulher eo bebê. Foi muito assustador, eles a abandonaram a 1,5 quilômetro dali”, contou Mário. Na quinta-feira, ele esteve em um dos pátios credenciados pelo Detran para buscar o veículo, encontrado no Bairro Tirol, Região do Barreiro.
Segundo o delegado Adriano Assunção, titular da Delegacia Especializada em Investigação de Furtos e Roubos de Veículos Automotores (Deifra), a prática do roubo é mais fácil para o bandido. “É muito mais prático subtrair o veículo se você tiver uma arma de fogo do que usar um mecanismo ou técnica sem empregar violência. Os veículos mais modernos, com mais equipamentos de segurança e com rastreador, inibem um pouco esse tipo de ação”, acrescenta o policial.
O delegado afirma ainda que já tem os dados fechados para todo o ano de 2014, porém, alguns ajustes ainda estão sendo estudados antes da divulgação. Com o ano fechado, ele diz que o aumento dos roubos é menor do que o apresentado pela Seds, que considerou o período de janeiro a novembro.
Assunção acrescenta que o trabalho feito a partir de 2014 surtiu efeito para diminuir os furtos de automóveis e que agora a meta é diminuir os roubos. “Iniciamos um processo de investigação e atuação principalmente em relação aos receptadores em Belo Horizonte. Em 2014, os criminosos que consideramos alvos principais foram presos. De certa maneira, isso resultou na redução do furto, porque os veículos eram desaguados nesses receptadores. Grande parte dos veículos furtados são populares, que têm o desmanche como destinos”, diz o policial.
Para o vice-presidente do Sindicato das Seguradoras de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Distrito Federal (Sindseg), Ângelo Vargas Garcia, os roubos estão aumentando porque a violência empregada pelos bandidos institucionalizou um tipo de comportamento nos motoristas. “Os casos de maior repercussão criaram um código entre as pessoas de que em roubo de carro você nunca deve reagir. Os bandidos se aproveitam disso e sabem que dificilmente serão surpreendidos”, diz Garcia.
Memória
- Três mortos por bandidos
Três casos de roubo de veículos com desfecho trágico chamaram a atenção em Belo Horizonte nos últimos anos. Em 23 de maio de 2012, a universitária Bárbara Quaresma Andrade Neves, de 22 anos, estava no seu carro, na porta da casa do namorado, no Bairro Cidade Nova, quando foi surpreendida por dois assaltantes. Assustada com a situação, ela foi morta com um tiro na cabeça quando, sem querer, deixou o carro se movimentar. Em janeiro do ano passado, o funcionário público Christiano D’Assunção Costa, de 34, morreu em circunstâncias semelhantes. Ele saía de uma academia no Bairro Buritis, quando, já dentro do carro, foi abordado por um bandido armado. Na confusão, Christiano foi morto com dois tiros. Em fevereiro do ano passado, o estudante Matheus Salviano Botelho de Morais, de 21, foi mais uma vítima de um roubo de veículo seguido de morte. Ele acabava de visitar um amigo no Bairro Gutierrez quando dois homens o interceptaram e dispararam três vezes contra ele antes de roubar seu carro.