Jornal Estado de Minas

Shoppings de BH barram adolescentes desacompanhados dos pais e geram revolta

Os malls adotaram o procedimento de identificação de jovens na portaria, depois de uma onda de rolezinhos em 2014. A medida causa indignação em pais e filhos na capital

Luana Cruz Cristiane Silva
Adolescentes desacompanhadas de pais e responsáveis estão sendo barrados na porta de dois shoppings de Belo Horizonte.
Os malls adotaram o procedimento de identificação de jovens na portaria, depois de uma onda de rolezinhos em 2014. A medida causa indignação em pais e filhos na capital. A Comissão de Defesa dos Direitos das Crianças, Adolescentes e Jovens informou que nunca foi chamada para debater o tema e não sabia que a situação vinha acontecendo na cidade.

O delegado Geraldo Eustáquio viu os filhos serem barrados no sábado, dia 24 de abril. Ele relata que deixou a adolescente de 13 anos e o rapaz de 17 no Minas Shopping para assistir a um filme. De carro, o pai levou os filhos até a portaria e seguiu para casa. No entanto, Geraldo Eustáquio precisou voltar porque os adolescentes não conseguiram entrar sem a presença do responsável.
O delegado se apresentou, colocou os adolescentes dentro do centro de compras e foi embora, voltando para buscar os filhos cerca de duas horas depois.

“Havia um vigilante patrimoninal na entrada onde as pessoas têm acesso e não os deixaram entrar. Quando questionei, informou que era uma medida contra os rolezinhos no shopping. Segundo o vigilante, eles fazem isso porque há uma lei em São Paulo”, relata o delegado. Geraldo Eustáquio achou estranha a argumentação e afirma: “A meu ver foi arbitrário. Eles não têm amparo na lei para fazer isso”. Quando voltou para buscar os filhos, o delegado observou que a abordagem aos menores continuava sendo feita na portaria do mall.

Na página do shopping no Facebook, a mãe de um estudante denunciou que o filho foi barrado no dia 14 de abril no mesmo shopping. “Meu filho foi impedido de entrar porque tem 14 anos e estava com colegas da sua escola. Essa atitude pode ser entendida como preconceituosa e quero esclarecimentos da administração”.

Por meio das redes sociais, adolescentes também reforçam a existência do controle de entrada no centro de compras. “Eu fui barrada no Minas shopping ontem kkkkkkkkkkkkk tava sem identidade”, comenta uma garota, no Twitter. "minas shopping só entra com os país rasrasrasrsa" KKKKKKKKKKK TEVE UMA EPOCA Q O ESTAÇAO TB ESTAVA BARRANDO”. “Esse trem do Minas Shopping barrar é muito zzzz”, reclama outra jovem.

A situação também acontece no Shopping Estação BH, em Venda Nova. “Sem critério algum ao discriminar (vulgo 'barrar') alguma pessoa na entrada.
Tenho 25 anos e todas as vezes que vou ao shopping sou constrangida na porta”, disse uma jovem em uma postagem de avaliação no Facebook, publicada no último domingo, dia 26. “Conheço menores de idade que nunca foram barrados. Exijo, pelo menos, uma explicação para esse tipo de abordagem, pois, além de ser mal sucedida é passível de um dano moral bem grande”.

No Estação BH, a “fiscalização” acontece todo fim de semana, quando são instalados gradis no entorno das entradas da Avenida Cristiano Machado e da Estação Vilarinho do metrô. Seguranças, normalmente em dupla, checam as carteiras de identidade de adolescentes e jovens. Menores de idade desacompanhados de maiores são barrados. A medida foi tomada há mais de um ano, quando o shopping foi cenário de tumultos durante rolezinhos.

Segundo um comerciante, que pediu para não ser identificado, os adolescentes barrados mostram revolta e saem xingando, mas permanecem no piso L-0 do estabelecimento, que dá acesso à Avenida Vilarinho, conversando e ouvindo funk. “Agora está mais tranquilo, era pior. Eles sempre vêm em bandos mesmo, muitos de uma vez. Só que ficam seguranças aqui na porta mesmo, olhando essa questão da identidade. Alguns eles não deixam entrar”, relata uma lojista que também pediu anonimato.
Ela diz que desde que a medida foi tomada não houve mais confusões ou notícia de roubo. “(O cliente) quando vê a confusão vai embora, então é bom barrar, nesse sentido”, afirma.

Por meio de nota, o Minas Shopping informou que realiza ações estratégicas pontuais para garantir a segurança. Ainda na nota, o mall afirma: “Importante esclarecer que, em locais públicos ou de concentração pública, todo menor de idade deve estar acompanhado de seu responsável legal”.

O Estação BH, também por meio de nota, destaca que o espaço físico de um shopping e seus lojistas “não são planejados para receber eventos e aglomerações, que estejam acima da capacidade de público do local”. O empreendimento diz, ainda, que “quando necessário, adota medidas preventivas que estão em conformidade com a lei e com as determinações do poder judiciário”.

Inversão

A presidente da presidente Comissão de Defesa dos Direitos das Crianças, Adolescentes e Jovens, Renata Roman, disse que, pela lei, apenas menores de 12 anos precisam estar acompanhados dos pais em locais públicos, mas que até a presença dessas crianças sozinhas é questionável dependendo da situação. “O shopping é privado e poderia estabelecer normas para que as pessoas entrem. No entanto, as normas são colocadas por um perigo que estes adolescentes estariam representando ao entrar no local. Eles restringem porque os menores podem gerar algum risco, mesmo que eles não gerem. É um veto antecipado. Eles imaginam que podem cometer algum tipo de infração”, afirma Roman.

Segundo ela, quando são marcados eventos e rolezinhos pela internet, os estabelecimentos podem conseguir, na Justiça, autorização para restrições sob a justificativa de previsão do evento. Conforme Roman, o que se percebe agora é uma rotina de restrições adotadas pelos centros de compras.

De acordo com a advogada, não há legislação que fale especificamente sobre acesso de menores em shoppings, mas ela considerou as restrições dos malls “drásticas demais”. “Existe uma inversão neste caso. A legislação é para proteger os menores de idades de algo que os ameaça e não para proteger os shoppings desses adolescentes. Neste caso é como se o pai e a mãe precisassem estar presentes para proteger o shopping desses adolescentes”, afirma. Para Roman, os shoppings deveriam ter condições de manter a ordem estando os adolescentes acompanhados ou desacompanhados. .