Uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. É assim que delegados de Minas comparam a situação das unidades sob suas chefias diante do déficit de vagas para custódia de detentos no estado. No interior, e principalmente na Grande BH, a falta de espaço para acautelamento dos presos em flagrante gerou clima de insegurança e complicou o trabalho da corporação, já afetado pelo histórico de baixo efetivo e infraestrutura precária. Problema já ameaça outras frentes de trabalho. Diante da superlotação dos presídios, operações para cumprimento de mandados de prisão em aberto e de busca e apreensão estão sendo evitadas e até mesmo canceladas. Em outras situações, é a pressão de interdições das unidades presidiárias que bate à porta e aumenta o clima de incerteza em relação aos locais para destinação dos detentos.
Em Ribeirão das Neves, na região metropolitana, por exemplo, a situação é complicada. A cidade que abriga hoje cinco unidades prisionais enfrenta dificuldades para acautelar seus presos em flagrante. Na 3ª Delegacia Regional da cidade, responsável também por Esmeraldas, presos que deveriam permanecer somente horas, até serem transferidos para centros provisórios, chegam a ficar até quatro dias à espera de vagas no sistema.
Segundo Bianca, a unidade não tem estrutura para esse tipo de acolhimento, tanto na questão de segurança, quanto no transporte, atendimento e alimentação dos presos. “As próprias famílias dos presos têm trazido a comida deles. Com isso, a delegacia tem ficado mais movimentada. Cada equipe de plantão tem apenas um delegado, um escrivão e três ou quatro investigadores. Eles ficam sobrecarregados para atuar em suas funções do dia a dia e ainda tomar conta desses detentos que não deveriam permanecer aqui”, contou a policial, lembrando que a segurança na unidade fica comprometida. A delegada revelou a dificuldade de lidar com a situação. “Ontem (anteontem), um homem foi preso em um ônibus, na BR-040, vindo de São Paulo, com três quilos de cocaína. Não tenho como liberar em um caso desses.
População Segundo dados da Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi), até a última terça-feira, a população carcerária em Minas é de 58.603 detentos, distribuídos em 32 mil vagas, o que representa um déficit de 26 mil vagas. Somente nos primeiros 125 dias deste ano, 3.336 pessoas foram presas, de acordo com a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds). Do total de presos, 30.500 são provisórios.
A crise do sistema prisional também pressiona as delegacias de Sete Lagoas, na Região Central. Por lá, houve determinação judicial em maio do ano passado para que providências fossem tomadas em relação ao presídio – que tem capacidade para 400 detentos, mas abriga cerca de 600 –, sob pena de interdição da unidade. “Na época, foi dado prazo de seis meses, até novembro. O prazo expirou e foi prorrogado por mais seis meses, até maio. Neste mês, foi novamente renovado. Temo pelo que possa acontecer ser as portas forem fechadas. Teremos que assumir uma responsabilidade para a qual não estamos preparados”, afirmou o delegado Ricardo Rodrigues Silva, da Delegacia de Plantão de Sete Lagoas.
Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, também tem situação delicada. De acordo com o chefe de 8º Departamento de Polícia Civil da cidade, Ailton Lacerda, a superlotação do presídio causa apreensão.
Críticas ao planejamento
Um problema antigo que se agravou. De acordo com o presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil de Minas Gerais, Mário Correia Santos, a situação do sistema carcerário já poderia ter sido sanado se houvesse planejamento para evitar situações críticas, como o as enfrentadas atualmente. “É preciso que o governo encontre uma solução urgente. Essa é uma bomba que está prestes a explodir”, comentou.
Já o diretor jurídico da Associação dos Policiais Militares e Bombeiros Militares de Minas Gerais (Aspra-MG), soldado Berlinque Cantelmo, afirmou que a crise do sistema carcerário tem refletido também no trabalho da Polícia Militar. “Em visita nesta semana em várias delegacias de Belo Horizonte, contatamos que viaturas estão paradas durante todo o dia com policiais esperando para registrar a ocorrência. Na Central de Fragrantes I, por exemplo, havia 13 viaturas e mais de 20 policiais”, revelou. Segundo ele, a situação complica o policiamento e é um prejuízo enorme para a segurança pública. Ele lembrou ainda que a crise tem relação primária com o sucateamento da Polícia Civil. “A corporação já sofre com problemas de falta de estrutura, de viaturas e efetivo”. O Sindicato dos Servidores da Polícia Civil de Minas Gerais (Sindpol) foi procurado, mas ninguém foi encontrado para comentar o assunto.
AÇÕES De acordo com a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), a atual gestão tem realizado ações, como remanejamentos entre unidades da Suapi, com o objetivo de administrar o problema da superlotação do sistema prisional. Como medida emergencial, está sendo feito um levantamento de carceragens no interior de Minas , como cadeias públicas atualmente desativadas, que tenham condições de serem reformadas para receber presos provisoriamentes. Outros imóveis de propriedade do estado também estão sendo mapeados e, em casos mais urgentes, adaptados para ampliar a capacidade do sistema prisional. O detalhamento desses projetos, como custos, locais das adaptações e início das transferências, por exemplo, ainda está sendo estudado. (VL)