Jornal Estado de Minas

Iate Tenis Clube diz que verba para obras e adaptações deve vir do poder público

Clube afirma não colocar obstáculo a adequações necessárias para retomar o projeto original, mas diz que dinheiro tem de vir dos cofres públicos. Órgãos oficiais não comentam imposição

Mateus Parreiras
Demolição do anexo onde hoje funciona academia e salão de festas é uma das principais intervenções - Foto: Leandro Couri/EM/D.A Press

Sem garantia de recursos, o comprometimento do Iate Tenis Clube, da Prefeitura de Belo Horizonte e dos institutos de patrimônio nacional (Iphan) e estadual (Iepha) pode não ser o suficiente para as obras e adaptações de que o edifício do clube necessita. Enquanto o Iate diz que o capital para as obras necessárias para a demolição de parte do anexo onde funciona uma academia e um salão deverá vir do poder público, nem a prefeitura nem os órgãos do patrimônio confirmam a intenção de usar recursos públicos para que a estrutura volte a ser como Oscar Niemeyer a projetou e não atrapalhe o título de patrimônio da humanidade pretendido pelo Complexo da Pampulha. Enquanto para a Igreja de São Francisco de Assis e para o Museu de Arte da Pampulha foram liberados no ano passado R$ 6 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) das Cidades Históricas, não se tem sequer o custo que as adaptações no clube demandariam.

Assim, não há certeza de que as adequações necessárias serão feitas. “Na parte que é tombada, busca-se recursos do PAC das Cidades Históricas, mas seria necessário que o clube tivesse uma função social, o que ainda não foi acordado com sua diretoria”, disse a diretora de Museus e Centros de Referência da Fundação Municipal de Cultura, Luciana Seres. O superintendente do Iate, Alfredo Lomasso, informou que o compromisso já foi firmado, mas que não há ainda sequer projetos para as alterações necessárias. “O clube não será, de forma alguma, um obstáculo para que a Pampulha consiga o título de patrimônio da humanidade. Esse é um compromisso nosso, mas que depende do Iepha e do Iphan também”, afirma, sem dar detalhes de que tipo de intervenções seriam feitas ou a partir de quando começariam.

De acordo com Luciana Seres, em junho do ano que vem ocorrerá uma votação, que é parte do processo de concessão do título. Já nesse encontro é preciso que intervenções estejam em curso, dentro de um cronograma.
Mas todas as reformas devem ser feitas até o fim do ano que vem ou a Pampulha pode não alcançar o reconhecimento mundial. “Temos também interesse em usar parte do Iate como um memorial de Oscar Niemeyer, mas isso ainda depende de acerto com o clube”, afirma Seres.

A superintendente do Iphan, Célia Maria Corsino, está otimista e acha que os entendimentos entre o Iate e os órgãos de patrimônio devem sanar os problemas. “Essa questão de puxadinhos é muito comum e em Brasília (no conjunto arquitetônico), por exemplo, é um grande problema também. O importante é que o clube, a prefeitura e todos os envolvidos demonstraram vontade de resolver tudo”, definiu. De acordo com o clube, a aceitação da candidatura prova que não há um entrave, mas no que diz respeito às adaptações necessárias, afirma que os recursos serão públicos e que cabe ao Iphan buscá-los.

Entre o final dos anos 1970 e os anos 1980, várias obras foram feitas no Iate, todas criticadas pelo próprio arquiteto Oscar Niemeyer, por descaracterizar a edificação original concebida por ele. Em 2010, o próprio clube chamou especialistas para organizar um dossiê que exibisse quais as alterações necessárias. No documento, todas as intervenções necessárias foram apontadas, mas nada foi feito de lá para cá.

Estrutura foi projetada para ser pública

 Construído em 1943 com o nome Yacht Golf Club, o atual Iate Tênis Clube foi encomendado por Juscelino Kubitschek para ser um clube público, que permitiria a prática de esportes náuticos na capital. É uma das mais importantes obras de Oscar Niemeyer na cidade, parte do conjunto composto pela Igreja São Francisco de Assis, a Casa do Baile e o Cassino (hoje Museu de Arte da Pampulha), obras consideradas percussoras da modernidade arquitetônica brasileira. Em forma de casa-barco que aparenta zarpar sobre as águas da Pampulha, o espaço inicialmente sediou atividades esportivas e de entretenimento. O andar térreo abrigava uma garagem de barcos e lanchas. Nos prédios os pisos eram revestidos de tacos de madeira, dividido em espaços sociais e esportivos, contando com vestiários, salão de cabeleireiro, lavanderia, hangar, copa, cozinha, restaurante, playground para crianças, piscina, quadras de tênis, basquete e vôlei. Dois salões de festas exibiam trabalhos de Estergilda Menicucci e Portinari e, na parte externa, aberta ao público, compunham o paisagismo os jardins de Roberto Burle Marx. Com o rompimento da barragem da Pampulha, em 1954, os esportes náuticos acabaram aos poucos, sendo o espaço do clube usado como garagem de barcos particulares.

Na década de 1960, a prefeitura decidiu vender o espaço para arrecadar fundos para uma nova captação de água para a cidade. Com a poluição se agravando, na década de 1980 a prática náutica foi proibida. Parte dos sócios tentou impedir a venda, mas em 1961 o negócio se concretizou sob a administração do prefeito Amintas de Barros, e os insatisfeitos se uniram para fundar o Pampulha Iate Clube (PIC). A nova administração então mudou o nome da instituição para Iate Tênis Clube e a partir daí se iniciou um lento e progressivo processo de alteração da edificação.

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