Os meses de junho e julho de 2013 deixaram marcas para milhares de pessoas em BH. Mais do que a disputa dentro de campo na Copa das Confederações, os protestos por melhores serviços que tomaram conta de ruas e avenidas da capital mineira e os episódios de vandalismo e violência não serão esquecidos por quem se envolveu direta ou indiretamente. Dois anos depois das primeiras manifestações – elas começaram no dia 15 em BH e se estenderam até o fim da competição –, três personagens afetados pelos protestos relembram como aqueles dias de tensão transformaram suas vidas.
Mariza Soares de Almeida, de 47 anos, não participou de protestos nem foi a jogos. Mas teve a pior experiência da vida. O filho dela, Luiz Felipe Aniceto, de 22 anos, morreu devido a uma queda do Viaduto José Alencar, na Avenida Antônio Carlos. Ele estava em manifestação realizada em 22 de junho, antes da partida entre Japão e México. Ao tentar correr em meio a um confronto entre policiais e manifestantes, ele se desequilibrou na mureta do viaduto e caiu de uma altura de seis metros. Luiz ficou internado durante 19 dias no Hospital de Pronto Socorro João XXIII, com traumatismo craniano, fratura exposta nos dois braços e perfuração no pulmão.
“Tive que reaprender a viver diante dessa dor imensa que foi a morte do Luiz. Na época, fiquei mal da cabeça e tive que fazer terapia para dar conta dessa saudade”, conta Mariza. “Me joguei no trabalho para não adoecer. Ainda hoje, a tristeza e a falta que ele faz são enormes”, acrescenta ela, que trabalha como agente de combate a endemias na PBH. Com a voz embargada, ela lembra de como foi duro receber a notícia de que o filho tinha caído do viaduto. “Já sabia que ia ter manifestação e fiquei tentando falar no celular dele desde cedo, mas dava caixa postal. Ele largou serviço às 13h naquele sábado, e foi sem eu conseguir falar com ele. Aquilo me torturou. Foi me dando uma aflição. Por volta das 11 da noite, ligaram do hospital. Foi horrível”, conta.
Mariza lembra que o filho se dedicava aos estudos e tinha muitos sonhos. “Luiz tinha acabado de concluir o curso de manutenção de aeronaves. Já trabalhava como atendente na UAI Praça Sete e iria começar um estágio na área em que se formou.
Ao todo, seis pessoas caíram do Viaduto José de Alencar durante as manifestações. Além de Luiz, Douglas Henrique de Oliveira, de 21, morreu após queda em 26 de junho, data da partida entre Brasil e Uruguai. As outras quatro pessoas ficaram gravemente feridas após despencar do vão do mesmo viaduto.
Destruição A loja de número 7.367 da Antônio Carlos, na Pampulha, também foi palco de violência. No local, onde funcionava uma concessionária Kia Motors, as portas nunca mais se abriram depois de 26 de junho, quando vândalos invadiram o local e queimaram carros, maquinário, móveis, computadores e roubaram peças automotivas e outros bens.
“A loja estava fechada nos dias de protesto. No primeiro dia, quebraram as vidraças da fachada. No segundo, mais vidros, mesmo com os tapumes instalados. No terceiro protesto, a destruição foi geral”, lembra. Bruno conta que assistiu às cenas de destruição pela TV e ficou assustado com tanta violência. “O sentimento foi de decepção, de uma tristeza muito grande. Ali não era só o meu lugar de trabalho, mas também de muitos pais e mães de família”, afirma. “Hoje, vejo que o estado não estava preparado para o que aconteceu. A população não teve segurança e o resultado foi um comércio todo destruído”, opina. Apesar de avaliar que os protestos não surtiram o efeito social que se buscava, Bruno afirma que a reivindicação era justa, mas o vandalismo, inadmissível.
Segurança Na linha de frente do Comando de Policiamento da Capital (CPC) à época da Copa das Confederações, a coronel Cláudia Romualdo também reconhece que os protestos marcaram a carreira dela. “Era um misto de indignação por parte do povo por causa dos investimentos feitos para a Copa e da realidade do país. Mesmo com todo o planejamento, enfrentamos situações inusitadas”, diz.
Durante os protesto em BH, a coronel Cláudia manteve contato direto com os manifestantes, marchou junto a eles e investiu em negociações com aqueles que tentavam ultrapassar limites de acesso impostos pela Fifa. Em muitas ocasiões foi aplaudida. Mas também sofreu pressões, foi vaiada e enfrentou o corre-corre para fugir de bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral.
No balanço que a militar faz, a palavra que fica é aprendizado. “Foi um aprendizado, o mais significativo de minha carreira. Diferente de tudo a que estava acostumada”, diz a coronel Cláudia, lembrando outro exercício necessário à época. “Tivemos que ter uma tranquilidade muito grande. Ouvimos insultos, mas cumprimos nossa missão”, avalia a militar, que em fevereiro deixou o CPC para comandar a Diretoria de Recursos Humanos da PM e que, no ano que vem, vai para a reserva da corporação.
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