O termômetro marcava 39,5 graus enquanto o pequeno Bruno Souza, de 4 anos, esperava na Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) do Bairro 1º de Maio, na Região Norte de Belo Horizonte. Foram cinco horas ardendo em febre no colo do pai, o padeiro Cesar de Souza, de 35, até ser medicado. Nesse meio tempo, foi o próprio pai quem teve de dar dois banhos, para baixar a temperatura e evitar convulsão. Dentro de um dos consultórios da unidade, a médica, sobrecarregada, reclama que a equipe faz o que pode e não dá conta de todos os que chegam. Há 20 anos na função, ela conhece bem a rotina: “Temos de nos desdobrar, porque as equipes estão sempre desfalcadas. Faltam medicamentos e constantemente os aparelhos para exames estão quebrados”, conta ela, que prefere não se identificar. O caso do menino Bruno é cruel, mas está longe de ser o mais grave: “Há pouco tempo, uma criança deu entrada com meningite e não havia a medicação indicada. Ela esperou entre oito e 10 horas para ser transferida. Morreu. Fica a pergunta se essa morte não poderia ter sido evitada”, diz a mesma profissional.
Na unidade – e em várias outras do Sistema Único de Saúde (SUS) estado afora –, doutor e paciente são os dois lados da mesma rotina de escassez que gera sofrimento, revolta e impotência. Às vezes, estão separados apenas por um biombo: enquanto doentes mofam na fila, dentro dos consultórios profissionais de saúde enfrentam uma sequência de atendimentos quase industrial.