Se você estiver passeando pela França, próximo à pequena cidade de Cosse- Le-Viven, na Região Nordeste do país, pode visitar o museu do escultor e pintor Robert Tatin (1902-1983). O espaço repleto de esculturas é um parque, com obras expostas a céu aberto e muito bem recomendado em sites de viagem. Porém, para conhecer um pouco da obra de Tatin não é preciso ir tão longe. Basta desembarcar em um dos 20 ônibus com ponto no primeiro quarteirão da Avenida Amazonas, no Centro de Belo Horizonte, caminhar poucos passos até o Hotel Amazonas Palace, no número 120, e pedir – com gentileza – a algum funcionário da recepção para visitar o Bar Tejuco, no primeiro andar dos 13 do edifício, de estilo arquitetônico protomoderno. No bar, estão três painéis pintados por Tatin em 1953, ano seguinte à inauguração do hotel.
O Amazonas Palace chegou a ser um dos mais importantes da cidade e hoje ostenta três estrelas, aspecto nostálgico, mobiliário original de 60 anos atrás e diárias que vão de R$ 130 até R$ 200, dependendo da época e das dimensões dos quartos – 96 no total. Para entender o motivo de os quadros estarem ali é preciso voltar ao final dos anos 1940 e início da década seguinte, quando as arrancadas e frenagens dos ônibus em frente ao hotel não faziam o tenebroso barulho de atualmente e as maritacas cantando nas palmeiras-imperais podiam ser escutadas com mais clareza.
O projeto do prédio é dos arquitetos Mazoni e Magalhães e foi encomendado pela família Haas, de tradicionais comerciantes de origem judaica de Belo Horizonte.
INFLUÊNCIA “O tempo que ele passou no Brasil é de fato muito importante na vida e criação dele”, explica à reportagem Hélène Guédon, uma das coordenadoras do Museu Robert Tatin, na França. A especialista na obra do francês detalha que Tatin ficou cinco anos viajando pela América do Sul, entre 1950 e 1955, principalmente no Brasil, mas também visitou Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile. “Ele fez diversas exposições e vendia suas obras de arte para ser capaz de continuar sua jornada”, diz Hélène.
Aliás, o ex-presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), filho ilustre de Diamantina, foi frequentador contumaz do Bar Tejuco, onde apreciava o jazz e bossa-nova tocada no piano junto a seus pares da elite mineira. Outro frequentador famoso do hotel foi o ator Marco Nanini. O pai de Nanini gerenciou o hotel entre a década de 50 e 60, quando o ator era criança e a família viveu em um dos quartos.
OUTRAS OBRAS Na recepção do hotel há ainda um quadro do pintor paraense Theodoro Braga (1872-1953). Chamada Brasil, a pintura datada de 1953 segue o estilo de Tatin. Outro quadro no hotel é um desenho de Tatin mostrando o cotidiano da cozinha do hotel. O desenho foi ampliado e está na parede do restaurante, anexo ao espaço do Bar Tejuco.
O estilo de Tatin era controverso quando começou a ser notado no país. Adriane guarda um recorte de jornal de Florianópolis, de maio de 1954, em que uma exposição do francês é resenhada: “O estilo do professor Tatin não é moderno, não é surrealista, nem abstracionista. O academicismo passa longe. O professor criou uma escola própria, através de um estilo que, fugindo da preocupação das cores vivas, imprime aos seus trabalhos e aos dos que adotam seu estilo algo impressionante”.
Robert Tatin nasceu em 1902, em Laval, na região da Bretanha, e em 1918 mudou-se para Paris para trabalhar como pintor e decorador. Estudou desenho e pintura na Ecole des Beaux-Arts e, entre 1922 e 1924, fez o serviço militar em Chartres, onde se especializou em trigonometria e geometria. Aos 28 anos, em 1930, voltou para sua cidade natal e fez sucesso, conseguindo dinheiro para viajar pela Europa, África e Nova York. Após a Segunda Guerra Mundial, em 1945, Tatin deixou a França e veio para o Brasil a convite de Ciccillo Matarazzo. No Brasil, aprofundou os conhecimentos em cerâmica e participou da Bienal Internacional de São Paulo, em 1951, que trouxe ao país obras de Picasso, Alberto Giacometti, René Magritee eGeorge Grosz. Além de viajar pelo Brasil, percorre a América do Sul até a Terra do Fogo, na Argentina. Retorna à França em 1955 e recebe prêmio da crítica de Paris, em 1961. No ano seguinte, compra casa em Cosse-Le-Viven, onde monta museu. Ele morreu em 1983..