Tumiritinga – Depois do desastre, o medo. Moradores de Tumiritinga, cidade de pouco mais de 6 mil habitantes, no Vale do Rio Doce, temem que o pacato município, distante 350 quilômetros de Belo Horizonte, se veja no meio de uma violenta batalha motivada pela disputa de terras. Desde a queda do avião sobre um acampamento do Movimento dos Sem-Terra (MST) – em desastre que matou o prefeito da vizinha Central de Minas, Genil Mata da Cruz (PP), e outro ocupante –, o policiamento da cidade, que normalmente se resume a cinco militares, foi reforçado pelo pelotão de Governador Valadares, maior cidade da região. A informação é de que duas pequenas aeronaves faziam voos sobre a área invadida, uma fazenda em litígio, que pertenceria a Genil, quando ocorreu a queda, a sete quilômetros do Centro. Entre as versões para o episódio estão a denúncia de que os aparelhos estivessem sendo usados para atacar os acampados, e a hipótese de que o monomotor tenha sido abatido. Ambas as suspeitas são negadas pelos envolvidos. Equipes da Aeronáutica investigam o caso, que é apurado também pela Polícia Civil.
Leia Mais
População de Central de Minas se despede de vítimas de acidente com aviãoFamílias fazem exigências para deixar terreno onde caiu avião em TumiritingaAdvogado contesta versão de arremesso de bombas por avião em acampamento do MSTAnálise preliminar da Polícia Civil descarta tiros contra avião de prefeito em Tumiritinga Equipe da Aeronáutica vai a Tumiritinga investigar queda de avião que matou prefeito Sem-terra reafirmam que foram alvo de bombas antes de queda de avião que matou prefeitoPolícia Civil de Minas investiga morte de prefeito em acidente aéreoPrefeito morto em acidente aéreo em Minas tinha perfil polêmicoExecutores de chacina em Tumiritinga são condenados a 106 anos de prisãoConflito agrário deixa seis feridos em Capitão Enéas no Norte de MinasPrefeito morto na queda de avião viria a BH para negociar fazenda com o IncraCorpos de prefeito e funcionário vítimas de acidente aéreo são enterrados em Central de MinasJá os sem-terra relatam ter havido pânico e correria por quase meia hora. Nenhuma pessoa em terra se feriu, mas uma grávida com 7 meses de gestação passou mal e permanece internada em uma unidade de saúde. Policiais militares da cidade e de municípios vizinhos foram acionados e chegaram ao acampamento em poucos minutos. A corporação recolheu artefatos que, segundo os sem-terra, foram lançados das aeronaves. “Começaram a nos atacar por volta das 16h15. Um avião caiu em torno das 16h40. O outro foi embora em seguida. Havia crianças e idosos. Somos 120 famílias, 300 pessoas. Foi o segundo ataque em menos de uma semana. Na madrugada da sexta-feira, por volta das 2h, dois tratores com cabines protegidas com material blindado chegaram, com mais dois carros. Os ocupantes atiraram e dispararam rojões. A barraca onde era a cozinha pegou fogo. Graças a Deus ninguém se feriu”, disse Edilene dos Santos, uma das líderes do grupo.
Os sem-terra montaram acampamento em 5 de julho último e atribuem os ataques ao prefeito de Central de Minas. Aliados de Genil dizem que o político comprou as terras de um grupo produtor de celulose. Já os acampados sustentam que o Genil ainda negociava a compra da fazenda, cuja plantação de eucaliptos não vingou. “A empresa comprou a propriedade com financiamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Portanto, dinheiro público. A terra não é do prefeito. É da firma. E é improdutiva, porque não há eucalipto plantado”, disse Edilene. Amigos e defensores do político refutam as acusações dos ataques. Segundo eles, a propriedade não estaria ainda em nome do prefeito, mas Genil já teria quitado duas parcelas da compra.
VERSÕES O episódio rende várias versões na cidade. Além das denúncias de ataque e de revide, que teria levado à queda da aeronave, especula-se que o avião teria caído depois de uma bomba ter explodido em seu interior. Outra tese levantada é a de que produtos tóxicos a bordo teriam causado mal-estar nos ocupantes da aeronave. A Polícia Civil investigará os fatos. O Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes (Seripa III), ligado à Aeronáutica, vai apurar as causas da queda. Deputados da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e representantes do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) também entraram no caso.
Enquanto isso, na área urbana, moradores temem o desenrolar dos acontecimentos. Nas esquinas e nas portas do fraco comércio do município, o assunto é a disputa de terras. “Fico receosa com o que pode vir pela frente”, teme Helena Batista, dona de um restaurante e de uma pousada. O mesmo sentimento tem a conselheira tutelar Matilde Gonçalves. O comerciante Paulino Oliveira, o Careca, é outro que não disfarça a preocupação: “A gente teme, porque não sabe o que vai acontecer”.