Tumiritinga – Depois do desastre, o medo. Moradores de Tumiritinga, cidade de pouco mais de 6 mil habitantes, no Vale do Rio Doce, temem que o pacato município, distante 350 quilômetros de Belo Horizonte, se veja no meio de uma violenta batalha motivada pela disputa de terras. Desde a queda do avião sobre um acampamento do Movimento dos Sem-Terra (MST) – em desastre que matou o prefeito da vizinha Central de Minas, Genil Mata da Cruz (PP), e outro ocupante –, o policiamento da cidade, que normalmente se resume a cinco militares, foi reforçado pelo pelotão de Governador Valadares, maior cidade da região. A informação é de que duas pequenas aeronaves faziam voos sobre a área invadida, uma fazenda em litígio, que pertenceria a Genil, quando ocorreu a queda, a sete quilômetros do Centro. Entre as versões para o episódio estão a denúncia de que os aparelhos estivessem sendo usados para atacar os acampados, e a hipótese de que o monomotor tenha sido abatido. Ambas as suspeitas são negadas pelos envolvidos. Equipes da Aeronáutica investigam o caso, que é apurado também pela Polícia Civil.
Já os sem-terra relatam ter havido pânico e correria por quase meia hora. Nenhuma pessoa em terra se feriu, mas uma grávida com 7 meses de gestação passou mal e permanece internada em uma unidade de saúde. Policiais militares da cidade e de municípios vizinhos foram acionados e chegaram ao acampamento em poucos minutos. A corporação recolheu artefatos que, segundo os sem-terra, foram lançados das aeronaves. “Começaram a nos atacar por volta das 16h15. Um avião caiu em torno das 16h40. O outro foi embora em seguida. Havia crianças e idosos. Somos 120 famílias, 300 pessoas. Foi o segundo ataque em menos de uma semana. Na madrugada da sexta-feira, por volta das 2h, dois tratores com cabines protegidas com material blindado chegaram, com mais dois carros. Os ocupantes atiraram e dispararam rojões. A barraca onde era a cozinha pegou fogo. Graças a Deus ninguém se feriu”, disse Edilene dos Santos, uma das líderes do grupo.
Os sem-terra montaram acampamento em 5 de julho último e atribuem os ataques ao prefeito de Central de Minas. Aliados de Genil dizem que o político comprou as terras de um grupo produtor de celulose. Já os acampados sustentam que o Genil ainda negociava a compra da fazenda, cuja plantação de eucaliptos não vingou. “A empresa comprou a propriedade com financiamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Portanto, dinheiro público. A terra não é do prefeito. É da firma. E é improdutiva, porque não há eucalipto plantado”, disse Edilene. Amigos e defensores do político refutam as acusações dos ataques. Segundo eles, a propriedade não estaria ainda em nome do prefeito, mas Genil já teria quitado duas parcelas da compra.
VERSÕES O episódio rende várias versões na cidade. Além das denúncias de ataque e de revide, que teria levado à queda da aeronave, especula-se que o avião teria caído depois de uma bomba ter explodido em seu interior. Outra tese levantada é a de que produtos tóxicos a bordo teriam causado mal-estar nos ocupantes da aeronave. A Polícia Civil investigará os fatos. O Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes (Seripa III), ligado à Aeronáutica, vai apurar as causas da queda. Deputados da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e representantes do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) também entraram no caso.
Enquanto isso, na área urbana, moradores temem o desenrolar dos acontecimentos. Nas esquinas e nas portas do fraco comércio do município, o assunto é a disputa de terras. “Fico receosa com o que pode vir pela frente”, teme Helena Batista, dona de um restaurante e de uma pousada. O mesmo sentimento tem a conselheira tutelar Matilde Gonçalves. O comerciante Paulino Oliveira, o Careca, é outro que não disfarça a preocupação: “A gente teme, porque não sabe o que vai acontecer”.