A vida em estado líquido recupera suas forças na Vila Acaba Mundo, comunidade de 600 famílias incrustada na região da Serra do Curral, no Centro-Sul de Horizonte. Em tempos de torneiras sob controle, uma nascente a um quilômetro da Avenida Bandeirantes está livre de entulho, da ameça de invasão e, principalmente, da falta de árvores. O novo cenário é fruto da ação de alunos de engenharia ambiental do UniBH, empenhados, desde março, em capinar o mato, plantar mudas de espécies nativas e frutíferas e conscientizar moradores sobre a necessidade de preservação do espaço. Na tarde de ontem, a equipe apresentou o resultado final à direção da associação comunitária e se mostrou feliz com a missão. “Nascentes são áreas de preservação permanente, de acordo como o novo Código Florestal. De agora em diante, é fundamental fazer a manutenção”, disse o estudante Davi Correa, do oitavo período, que trabalhou com os colegas Flávio Santos e Eduarda Nascimento.
Correndo em direção ao córrego Desenganos, integrante da Bacia do Rio as Velhas, o pequeno riacho tem grande serventia na comunidade, conta o aposentado Laerte Gonçaves Pereira, que mora no local há mais de 20 anos e integra a associação. “Na estação seca, a nascente sempre diminui um pouco, mas estamos certos de que ela não vai desaparecer”, disse. “Há dois meses, a vila ficou no seco e as pessoas vieram encher latas e baldes aqui. Chegou até gente do Bairro Mangabeiras. Guardamos aqui um tesouro que não é só da vila, mas de toda a capital”, completou.
TÉCNICAS Com uma enxada nas mãos e muitas ideias para o presente e o futuro, Laerte se empolga com o envolvimento da comunidade, em especial das crianças. “Os estudantes de engenharia ambiental fizeram um bom serviço e também nos ensinaram técnicas de preservação, indicando, por exemplo, as melhores árvores para proteger a nascentes, o lugar certo de plantar e outros detalhes essenciais. Estamos até mesmo planejando a construção de um viveiro de mudas nativas”, disse.
A revitalização do entorno da nascente, que fica numa altitute de 1,1 mil metros, trouxe à tona uma história que traz muita saudade – e indignação – aos moradores mais antigos da vila. Alguns metros acima, ficava uma cachoeira cujo curso foi desviado há cerca de 20 anos, por uma mineradora, para alimentar uma lagoa de lavagem de minério. “Queremos a cachoeira de volta!”, diz com firmeza Laerte, que não se conforma com o desaparecimento da queda de água natural – um ponto de beleza e lazer. Da mesma forma, também por obra da empresa, foi plantado capim-elefante na encosta, numa medida compensatória, quando deveriam ser introduzidas árvores nativas.
Na companhia da coordenadora do curso de engenharia ambiental, professora Gabriela Camargos, o estudante Davi Correa, de 29 anos, conta que se envolveu com a comunidade, e, em quatro meses de trabalho, pode colher muitos frutos nas áreas pessoal, profissional e universitária. “Viemos aqui sempre aos sábados e feriados e acredito que será possível voltar de 15 em 15 dias para fazer a manutenção do espaço. Tivemos muita prática e devemos ressaltar o lado social da atividade”, afirmou Davi.
CONTRA A EROSÃO A ação foi desenvolvida como parte do trabalho interdisciplinar de graduação, dentro do tema “Recuperação de áreas degradadas”. Davi explica que, ao ser feita a proposta, equipe pediu autorização à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e depois conversou com a diretoria da associação de moradores. “Já tinha conhecimento da nascente no Acaba Mundo e via a necessidade de proteção contra a erosão e de aumento da infiltração de água no solo. O terreno não é particular, está na região da Serra do Curral, e, portanto, trata-se de área de proteção ambiental”, disse.
Sempre observando os aspectos do terreno, Davi destacou que havia poucas árvores. Assim, num parceria com o Parque das Mangabeiras, foram plantadas 23 mudas de frutíferas (jabuticabeira, ameixeira, abacateiro, goiabeira e amoreira) e 40 nativas (pau-ferro, pata-de-vaca, aroeira-pimenteira). “Abraçamos com força este trabalho”, revela o estudante, que cita mais uma parte da iniciativa: para não haver perdas, a equipe usou todo o capim-elefante cortado e o espalhou no solo, a fim de garantir adubação.
Lixo ameaça córrego na vila
A nascente no alto da Vila Acaba Mundo está cristalina, mas poucos metros abaixo, quando se encontra com o Córrego Desenganos, começam os perigos. Ao longo de cerca de 800 metros, quando passa entre as casas, o curso d’água recebe toda sorte de lixo, principalmente garrafas pet. A presidente da associação comunitária, Generosa Costa de Oliveira, diz que já entrou em contato com a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) para que os serviço seja executado. “Ainda não tem data marcada, mas aguardamos com esperança”, afirmou.