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Estado de Minas

Apesar de proibição, bingos resistem em Belo Horizonte

Reportagem do EM visita locais de jogos na capital mineira e mostra como estabelecimentos, ilegais há mais de 10 anos, funcionam sem maiores preocupações com a fiscalização


postado em 18/07/2015 06:00 / atualizado em 18/07/2015 07:34

Bingo que funciona em cima de um bar no Bairro Alto Barroca, Região oeste de BH: reportagem presenciou premiação de R$ 1,2 mil(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
Bingo que funciona em cima de um bar no Bairro Alto Barroca, Região oeste de BH: reportagem presenciou premiação de R$ 1,2 mil (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

Os bingos – proibidos há mais de 10 anos no Brasil – desafiam a fiscalização e resistem em Belo Horizonte. Escondidas em imóveis que abrigam estacionamentos, bares e outras atividades, casas clandestinas funcionam na capital sem muita preocupação com batidas policiais e atraem milhares de pessoas. A reportagem do Estado de Minas esteve no Bairro Colégio Batista e no Alto Barroca, nas regiões Nordeste e Oeste da capital, e flagrou, com câmera escondida, estabelecimentos oferecendo prêmios de um salário mínimo e eletroeletrônicos. Estimativa do Instituto Brasileiro do Jogo Legal (IBJL) aponta que por ano, em todo o país, os bingos são responsáveis por movimentarem R$ 1,3 bilhão.


O bingo do Colégio Batista, conhecido como Bingo do Túnel, se esconde atrás da fachada de um estacionamento, acima do túnel da Avenida Cristiano Machado. Nos dias de semana, começa a funcionar às 18h. Na quinta-feira, pouco antes da abertura das portas, vários carros de apostadores já estavam estacionados nas proximidades. A entrada é pelo estacionamento. À esquerda de quem entra, há uma pequena porta vermelha que dá acesso ao salão de jogos. Os apostadores sobem uma sinuosa e escura escada até chegar ao amplo espaço.

Lá, estão dispostas quase 100 mesas, com quatro lugares cada. No fundo do salão, há um grande painel com os números que são sorteados e os valores dos prêmios pagos. Na outra extremidade do espaço, uma mulher “canta” os números, sorteados por uma máquina. Por todo o local estão espalhadas televisões com informações sobre o sorteio.

Funcionários da casa, vestidos com camisa verde-claro, circulam pelas mesas e vendem os cartões para as apostas. Cada cartão custa R$ 1 e tem 15 números. Os prêmios são variados. Durante o período em  que a reportagem permaneceu no local foram sorteados três prêmios de um salário mínimo (R$ 790). Cartazes no espaço anunciavam prêmios especiais nos próximos dias, como uma televisão e também cortesias. No próximo sábado, o local oferecerá feijoada aos apostadores.

O público da casa tem idade variada, porém, a grande maioria é de idosos. Os mais experientes compram a série, com seis cartões, e conseguem marcar os números de todos simultaneamente. No local – apesar de fechado – é permitido fumar e muitos bebem cerveja e lancham salgados e porções da lanchonete do local.

Confira onde as casas estão localizadas na Grande BH
Confira onde as casas estão localizadas na Grande BH


Cada cartão tem quatro linhas, com cinco números cada. Quando um apostador consegue marcar os cinco números de uma linha ganha um prêmio menor. O apostador grita “linha” e um dos funcionários vai à mesa conferir. Quando alguém acerta os 15 números do cartão grita “bingo” e o processo se repete. Poucos minutos depois, outro funcionário retorna à mesa e faz o pagamento em dinheiro.

Insistência Em novembro do ano passado, policiais militares estiveram no prédio ao lado do Bingo do Túnel, prenderam duas pessoas e apreenderam material suficiente para encher três caminhões. O major Anderson Sales, do 16° Batalhão, que comandou a apreensão, disse à época que o local já havia sido fechado no início do não passado.

O outro bingo em que a reportagem do EM esteve, no Alto Barroca, fica em uma pequena praça, perto da Avenida Silva Lobo, acima de um bar. Logo na chegada ao local, um apostador que dividia a mesa com a equipe de reportagem ganhou. O prêmio era de R$ 1,2 mil. No local, que é chamado pelos apostadores de “Bingo do João”, o funcionário que fica na entrada não pergunta nada para quem chega – assim como ocorreu no Bingo do Túnel. O funcionamento é parecido com o do Bairro Colégio Batista, mas, em vez de telão, há um projetor com a imagem dos números sorteados em uma parede branca. No espaço do Alto Barroca, os funcionários não são uniformizados. A reportagem também teve acesso a mensagens de celular que outro bingo envia para os clientes. No texto, informações sobre os prêmios que serão sorteados e o horário do funcionamento

Exploração Para o major Gilmar Luciano, responsável pela comunicação da Polícia Militar de Minas Gerais, os bingos não trazem transtorno apenas para a corporação. “É um malefício para a sociedade, pois as pessoas que estão ali perdem dinheiro e se viciam no jogo”, entende o policial. O major destaca também que os apostadores não devem ser presos, mesmo se flagrados durante o jogo. “Eles (apostadores) estão sendo explorados e são vítimas”, diz. Segundo o policial, não há estatísticas sobre outros crimes praticados dentro dos bingos e que as questões fiscais, como o não pagamento de imposto, não são responsabilidade da PM. A exploração do bingo é considerada uma contravenção penal e a pena deve ser cumprida em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semi-aberto ou aberto.



 

Empresários defendem legalização

O bingo é proibido no país desde fevereiro de 2004, após o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinar a medida provisória que vetou o jogo. À época, várias entidades, entre elas a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), consideraram a medida casuísta, para blindar o então ministro José Dirceu, cujo assessor, Waldomiro Diniz, era acusado de ter recebido propina de empresários envolvidos com o jogo. Desde então, empresários do setor se mobilizam em associações na tentativa de criar uma legislação permitindo o retorno do bingo.

No mês passado, foi criada no Congresso uma comissão especial para analisar os projetos de lei que legalizam jogos de azar no país, entre eles o bingo e o jogo do bicho. No Congresso tramitam pelo menos nove projetos sobre o assunto. O principal argumento contrário – e que foi usado pelo governo federal à época da proibição – é que os bingos são viciantes. O vício em jogo é chamado de ludopatia.

A Associação Brasileira dos Bingos argumenta, em sua página na internet, que a legalização não aumentará o número de ludopatas. De acordo com estudos apontados pela associação, o problema atinge entre 1% e 3% da população. “O doente sempre encontrará alternativas para saciar a sua compulsão, seja na clandestinidade, em cruzeiros marítimos, viajando para países onde o jogo é legalizado ou até mesmo na internet”, argumenta a associação.
 


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