Santa Bárbara – De longe, quase escondidas pelas linhas simétricas das copas de eucaliptos, as folhagens de árvores de madeiras de lei da mata atlântica sacodem, depois envergam e com um estalo desaparecem, como que engolidas pela floresta. A cada aceleração das motosserras, exemplares da vegetação que abriga a mais rica biodiversidade nacional – e também a mais ameaçada – vão abaixo para se tornar carvão de churrasco ou para alimentar autofornos de siderúrgicas, não estando a salvo nem sequer nos espaços de parques e áreas de proteção. Comparando fotografias de satélites dos últimos oito anos, a reportagem do Estado de Minas encontrou 41 clareiras abertas por lenhadores e empreendimentos em áreas florestais que devastaram cerca de 380 hectares do Parque Nacional da Serra do Gandarela e da Área de Preservação Ambiental da Serra da Pedreira, em volta do Parque Nacional da Serra do Cipó. Para abrir pastagens, plantar eucalipto ou fazer carvão, reservas ambientais federais próximas a Belo Horizonte vêm sendo derrubadas por fazendeiros e silvicultores que não temem a fiscalização em propriedades limítrofes com as unidades, nas áreas de amortecimento que as circundam e dentro dos parques.
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Árvores viram carvão e dão lugar a pastagensObras malfeitas do poder público agravam desmatamento em MinasCresce o número de pessoas que praticam atividades físicas no horário da noite em BHRua São José, no Centro Histórico de Ouro Preto, é fechada para veículosAs áreas desmatadas são de difícil acesso, bem na transição entre os eucaliptos e a floresta nativa confinada entre vales e precipícios rochosos, próximos ao distrito de Cruz dos Peixotos, em Santa Bárbara, na Região Central do estado. É preciso transpor estradas rurais abertas em antigas trilhas de animais e carroças e ainda penetrar nos labirintos formados pelos eucaliptos.
“FOI ENGANO” A reação dos desmatadores ao ser contestados pela reportagem foi primeiro dizer que não estavam dentro do parque, apesar de o GPS confirmar a localização e de a mata atlântica ser protegida por lei, não podendo ser derrubada sem licença específica. “Essas estradas fomos nós que abrimos. Esse eucalipto nós plantamos. Agora vem o governo e fala que vai virar parque e não vai pagar para a gente nada?”, protestou o proprietário da fazenda, que não quis se identificar.
Para Paulo Baptista, membro do Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela, os atrasos na implantação de uma estrutura administrativa e de vigilância no parque permitem que a devastação continue. “A gente vê, pelos outros parques, que mesmo onde há um plano de manejo e fiscais ocorrem danos ambientais. Onde não tem então, a situação fica mais grave”, compara. O ambientalista projeta problemas futuros se as questões fundiárias não forem resolvidas. “Muitas áreas dessas (dentro do parque), com plantações de eucaliptos, precisam ser desapropriadas e recuperadas, já que o impacto ali é muito grande. Uma coisa que tememos é que, aproveitando que o parque foi demarcado, mas não há cercas nem fiscais, esses produtores avancem suas ocupações para dentro da mata, derrubando as árvores, plantando eucalipto e construindo estruturas para depois pedirem indenizações”, alerta.
31 mil - hectares é a área do Parque Serra do Gandarela
380 - hectares já foram devastados na recém-criada área de preservação ambiental