Queixando-se de abandono e cobrando providências de órgãos públicos, moradores do Bairro Coração Eucarístico, na Região Noroeste de Belo Horizonte, denunciam negligência nos serviços de segurança, fiscalização e no cumprimento do Código de Posturas do Município. As queixas, segundo os moradores, extrapolam o episódio ocorrido na madrugada de sábado, quando, em uma calourada organizada por estudantes em um bar no entorno da PUC Minas, houve tumulto, bloqueio de ruas, uso de drogas e sexo em via pública, além de acidente de trânsito e muitas brigas, entre elas a que resultou no assassinato de Daniel de Melo Vianna, enterrado ontem. “Temos problemas sempre. Nas calouradas, eles apenas se potencializam e o bairro vira terra sem lei”, afirma o presidente da associação de moradores, Walter Freitas. Responsável pelo policiamento no bairro, a 9ª Cia da PM admitiu ter sido surpreendida com um público tão grande para um evento não informado com antecedência, nem autorizado. Comandante de setor, o tenente Rafael Botelho adiantou que a corporação tentará barrar a realização de festa semelhante, comunicada à companhia de forma extraoficial e programada para a próxima sexta-feira.
Como explicam os moradores, as calouradas, com público que chega a aproximadamente 5 mil pessoas, ocorrem de modo geral em vários dias do início e término de semestres, e também em datas pré-feriado e no Carnaval. Eles afirmam que praticamente todos os bares do entorno imediato da PUC cometem irregularidades e que já é “cultural” infringir a lei na região. “Somos um bairro universitário e não vejo outras áreas de BH que também têm faculdades sofrer tanto como sofremos aqui. O resultado dessas festas é sempre o mesmo: tumulto, brigas, sujeira, som alto, gente fazendo sexo na rua, urinando no portão das casas, usando drogas. O problema é que ninguém faz nada”, afirma a administradora Danielle Salgado, vizinha da PUC Minas e do Bar do Kareca, onde o jovem foi assassinado.
A moradora diz colecionar protocolos da BHTrans, nos quais solicita reboque de carros parados de forma irregular nas ruas do entorno de casa. Um dos pontos mais críticos, segundo ela, é no cruzamento da Avenida Dom José Gaspar com Rua Dom João Pimenta, por onde circulam ônibus e viaturas do Samu. “Os veículos não têm como passar, pois os carros param até do lado em que é proibido e bloqueiam o trânsito. A gente chama o reboque, mas na maioria das vezes ninguém vem”, afirma, lembrando ainda ter ligado inúmeras vezes na noite da última sexta-feira para a PM. “A resposta era sempre a mesma: ‘Não temos viatura no momento’. Lamentável”, criticou.
Críticas à universidade
Também morador do bairro, o engenheiro Carlos Alberto Carvalho, de 56 anos, confirma os problemas, que podem ser vistos da janela de seu apartamento, e afirma que, além da ausência de intervenção do poder público, a própria PUC é omissa na solução dos transtornos. “A universidade pode até não ser a promotora dessas festas, mas os alunos que vêm aqui estão no bairro por causa da instituição. Outros são convidados via redes sociais, sem nenhum controle. A direção precisa atuar também junto à comunidade, o que não tem feito”, afirmou, criticando a nota enviada à imprensa pela instituição no sábado, na qual a PUC afirma manter diálogo com a população do entorno. Ontem, por meio do pró-reitor de Logística e Infraestrutura, Rômulo Albertini, a instituição informou que também está preocupada com a situação e se comprometeu a liderar um movimento junto ao poder público para enfrentar o problema, além de procurar a comunidade.
O tenente Rafael Botelho afirmou que a reclamação da comunidade é justa, diante das várias infrações, delitos e acidentes que foram registrados na última festa. “Atendemos dentro da capacidade do nosso efetivo. Conduzimos pessoas por diversas ocorrências de agressão. Houve também um grave acidente de trânsito, em que o motorista bateu em cinco veículos, quase atropelou uma pessoa e correu risco de ser linchado. Emitimos muitas multas de trânsito e realizamos prisões. Mais tarde, houve reforço, com policiamento especializado”, afirmou. A corporação informou que vai reforçar o monitoramento de calouradas.
O Estado de Minas tentou contato com representantes da Prefeitura de BH e com a BHTrans, mas ninguém foi localizado. O dono do Bar do Kareca também foi procurado, mas não atendeu às ligações da reportagem.