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Estado de Minas

Medo e silêncio tomam conta dos vizinhos de seita em Minduri, no Sul de Minas

Denúncia da PF de que integrantes são acusados de estelionato, lavagem de dinheiro e de manter pessoas trabalhando em suas fazendas e comércio em situação análoga à escravidão pegou todos de surpresa


postado em 20/08/2015 06:00 / atualizado em 20/08/2015 13:33

Eder Macedo diz que os integrantes da seita não falam com ninguém(foto: Jair Amaral/EM/DA Press)
Eder Macedo diz que os integrantes da seita não falam com ninguém (foto: Jair Amaral/EM/DA Press)

Minduri –
O clima que já era de mistério se transformou em medo na segunda-feira na pacata Minduri, cidade de 4 mil habitantes no Sul de Minas. Desde 2005, os moradores convivem com a indiferença de centenas de forasteiros que se mudaram para seis cidades da região para morar em fazendas e trabalhar em comércio administrados por grupos de religiosos pertencentes à seita “Jesus, a verdade que marca”. Eles são muito reservados e não se misturam com quem  não é do seu convívio. Mas, por volta das 5h de segunda-feira, vários carros da Polícia Federal entraram na cidade “queimando pneu”, segundo moradores, para fazer buscas em imóveis dos “paulistas”. A denúncia da PF de que integrantes da seita são acusados de estelionato, lavagem de dinheiro e de manter todas aquelas pessoas trabalhando em suas fazendas e comércio em situação análoga à escravidão pegou todos de surpresa.

Em Minduri, a comunidade  religiosa tem poucos negócios, bem diferente das vizinhas São Vicente de Minas, Andrelândia, Cruzília e Caxambu. “Há apenas uma loja, uma fábrica de artesanato e uma pequena propriedade rural alugada, onde plantam cebola”, conta o prefeito José Ronaldo da Silva, o Goiano, (PMDB), que mora ao lado de uma casa alugada pela seita, onde vivem os funcionários da fábrica. “São meus vizinhos. Moram cerca de 10 crianças e adultos. Conversam pouco, mas são muito educados”, disse.

O prefeito conta que ficou surpreso com a informação de trabalho escravo. “Fui algumas vezes à fazenda deles e ninguém reclamou de nada. Mas sabe como é religião, tem esse tal de dízimo”, comentou. “Se existe trabalho escravo, este é o melhor momento para algum deles denunciar, com a Polícia Federal e toda a imprensa em cima”. Os “paulistas”, segundo o prefeito, nunca causaram problemas. “Não saem para beber, não fazem festa, não brigam, nada”, disse.

Os poucos momentos em que membros da comunidade se integram à cidade é quando há festas. “Eles montam barraquinhas para vender comida. Tudo deles é muito bem-feito”, conta José Ronaldo, lembrando que o grupo montou um restaurante na Chapada do Abanador, no município vizinho de Carrancas, para atender a equipe da gravação da novela Império. “Eles são violentos na comida. Têm uma rede de restaurantes em Caxambu e em Pouso Alegre”, disse. Segundo a PF, entretanto, os estabelecimentos comerciais são usados para lavagem de dinheiro e os funcionários trabalham sem carteira assinada e sem salário.

O prefeito conta que a cidade ficou assustada na segunda-feira com o “circo armado” pela PF. “Entraram mais de seis carros no município em alta velocidade, cantando pneus, e o pessoal que acorda cedo para varrer rua começou a me telefonar desesperado dizendo: ‘Prefeito, tem um monte de homens de preto procurando os paulistas. Deram batida até na casa dos outros.’ Os paulistas tinham vendido uma casa lá em cima e os policiais não sabiam. Chegaram de uma vez e o novo dono do imóvel quase morreu”, conta o prefeito. A casa ao lado da dele também foi vasculhada. Ninguém foi preso na cidade, disse.

A fábrica de artesanato também foi alvo da fiscalização e a loja que vende os produtos permanecia fechada ontem. “A funcionária me disse que está tremendo até hoje. Falou: ‘Entrei em pânico’”, conta o prefeito. A Rádio Rede FM, também do grupo religioso, permanece funcionando na cidade.

O dono da padaria, Eder Wesley Macedo, de 41 anos, sabia da existência da fábrica de artesanato e da loja dos paulistas, essa, por sinal, em frente ao seu comércio. “O pessoal deles de vez em quando compra um pão aqui, mas só de vez em quando. Não puxam conversa com ninguém”, comentou.

Uma família que mora em frente à fábrica demonstrou medo em comentar qualquer coisa sobre os vizinhos da frente. “Não sei de nada deles”, disse uma senhora idosa. “Não mexem com ninguém. Não sei o que tem lá dentro. A gente é pobre, sabe, e temos que ficar quietinhos”, disse a mulher, que foi repreendida por uma outra mais jovem, possivelmente filha, que a mandou “calar a boca”. “Bate lá. Conversa com eles. Não vamos falar mais nada”, reagiu ela.  Com a chegada da reportagem, as luzes do interior da fábrica foram apagadas e os funcionários ficaram em silêncio.

A reportagem retornou à Fazenda Paraíso Manancial, em São Vicente de Minas, onde vivem mais de 130 famílias adeptas da seita. No dia anterior, o diretor da fazenda, Paulo Henrique da Silva, havia recebido  prometido  abrir as portas da fazenda para mostrar como ela realmente funciona, mas ontem voltou atrás.

 

‘Prisão injusta’
O advogado do pastor Cícero Araújo, Leonardo Campos, considerou “injusta” a prisão de seu cliente e de outros cinco líderes da seita sob suspeita de explorar trabalho escravo de fiéis.  “Em 2005, o Ministério Público do Trabalho (MPT) declarou que não havia isso na comunidade. Se houvesse teriam que libertar os escravos, não?”, questiona.


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