Pelo telefone, um dos funcionários da Unidade de Atendimento Imediato (UAI) Petrolândia, em Contagem, na Região Metropolitana de BH, informa que o serviço de pediatria está suspenso há dois anos. Na UAI Ressaca, no mesmo município, a busca pela especialidade também não encontra resposta positiva. “A última vez que o pediatra veio aqui foi quarta-feira. Não tem previsão de quando vai voltar a ter consulta”, informou a atendente, por telefone, acrescentando que nos últimos dias o serviço estava irregular. Em ambos os casos, os funcionários encaminharam a demanda para a UAI Nova Contagem, distante quase 20 quilômetros. Não é um caso isolado quando se trata de complicações no atendimento infantil. Assim como o município, muitas cidades mineiras estão com serviço desfalcado por falta de recursos e de profissionais.
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Para Raquel Pitchon, o contingenciamento de recursos na área da saúde agrava uma situação que já era preocupante na especialidade. “Já estamos vivendo uma desestruturação na pediatria, tanto do atendimento ambulatorial quanto no hospitalar”, afirma. Segundo ela, esse quadro tem dois impactos negativos: há cada vez mais unidades com escalas desfalcadas e profissionais sobrecarregados. “Isso prejudica o paciente, pois aumenta a chance de erro médico, e expõe os profissionais a cargas excessivas e ao risco de violência por parte da população”, afirma.
Uberlândia, no Triângulo, também sofreu enxugamento no serviço. De acordo com a pediatra Telma de Souza Miguel, o atendimento infantil foi interrompido nas UAIs Pampulha e Tibery, que tiveram parte de seus pediatras transferidos. “As alegações do município são sempre as mesmas: falta verba e não há demanda suficiente em determinadas unidades, já que a pediatria tem procura sazonal”, afirma.
Segundo a Secretaria de Saúde de Uberlândia, a pediatria na unidade Tibery foi fechada por falta de espaço físico para manter todas as clínicas, e para atender a um acordo firmado com o Ministério Público. Durante esse período, os pediatras estão prestando atendimento na UPA Sul, para onde também foram transferidos profissionais da unidade Pampulha. Ainda segundo o órgão, a rede pública da cidade conta com 120 pediatras e não faltam profissionais.
Já em Betim, as UPAs Guanabara e Alterosas tiveram os pediatras transferidos e clínicos serão capacitados para atender demandas infantis de urgência. O Samu dará prioridade para a transferência de crianças para os núcleos criados nas unidades de pronto-atendimento Sete de Setembro e Teresópolis. A decisão de reestruturar a rede foi tomada por falta de regularidade nas escalas de pediatras.
Segundo o Hospital Santa Margarida, de João Monlevade, o atendimento chegou a ficar desfalcado porque médicos não queriam assumir os plantões. Atualmente, 15 pediatras trabalham na unidade, que garante estar com atendimento normal .
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde de Santa Luzia, o corte do governo federal deverá impactar diretamente a assistência. “A dificuldade de contratação de pediatras ocorre há algum tempo e tem uma série de fatores que resultam no baixo número de profissionais disponíveis no mercado”, diz a nota. Segundo a secretaria, na UPA São Benedito, a pediatria conta com quatro especialistas, em cada plantão de 12 horas. Já a Secretaria de Saúde de Lagoa Santa informou que não faltam pediatras nas unidades de saúde.
Arrocho adia a normalização
Apesar da crise no atendimento infantil – setor em que o contingenciamento de 11,3% nas verbas para a saúde se somou à histórica falta de especialistas –, o número de profissionais tem aumentado nos últimos dois anos, segundo o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, Paulo Poggiali. “Os acadêmicos de medicina estão se interessando mais pela área nas faculdades”, disse. Ele afirma ainda que médicos-residentes ou já formados estão voltando o olhar para a especialidade, mas lamenta o arrocho no Orçamento, que impede a normalização do setor. “Essa é a expressão maior do sucateamento do estado, e quem sofre com isso é a população”, afirmou.
No caso de Minas, o Ministério da Saúde ainda não detalhou qual será o tamanho do corte de verbas. No ano passado, R$ 7,4 bilhões de recursos federais para a saúde foram executados no estado.
Questionada sobre os impactos do contingenciamento no Orçamento, a Secretaria de Estado da Saúde (SES) não se posicionou sobre o assunto. Informou, no entanto, que o número de pediatras – entre especialistas clínicos, oncologistas e cirurgiões – aumentou de 9.862, em 2011, para 10.424, neste ano. Ainda segundo a pasta, em Minas, 456 instituições oferecem leitos pediátricos para internações. Sobre o orçamento destinado à clínica pediátrica hospitalar de média complexidade, foram investidos no estado R$ 90,49 milhões no ano passado, praticamente o mesmo valor de 2013 (R$ 90,44 milhões). Neste ano, de janeiro a setembro, foram destinados ao setor R$ 67,9 milhões.
Há, no estado, segundo a Sociedade Mineira de Pediatria (SMP), cerca de 2.830 pediatras, aproximadamente 50% em Belo Horizonte. “Não podemos falar que haja déficit na capital. Mas a distribuição é muito heterogênea no interior. Há municípios que nem mesmo contam com pediatras”, afirma Raquel Pitchon.
De acordo com a Secretaria de Saúde da capital, a prefeitura tem investido no reforço no número de pediatras. Em 2011, foi realizado concurso para a área no SUS-BH.
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