Elas estão em todos os lugares do câmpus: caminhando apressadas com as mochilas nas costas, conversando com colegas sobre o curso escolhido, relaxando, na lanchonete ou atentas às novidades da vida universitária. Nem bem recomeçou o ano letivo, e as mulheres na faixa etária de 18 a 25 anos continuam dominando na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Dos 34.130 estudantes de graduação, 18.221 são mulheres – 53% do total. Na pós-graduação, a proporção aumenta: dos 14.079 estudantes, 8.247 são do sexo feminino (58,5%). Entretanto, a distância para os homens ficou menor neste semestre. De acordo com levantamento da instituição, as novas “calouras” representam 47% dos 2.714 estudantes que chegaram à Federal neste semestre – a primeira queda em cinco anos.
As diferenças nas salas de aulas são evidentes, atesta um grupo de futuras biólogas, lembrando que no curso diurno predominam as mulheres, algo em torno de 60%. “Gostei da turma, e não vejo qualquer problema em ter tantas alunas. Uma vai ajudar a outra”, acredita Jéssica Santana Pires, de 20, ao lado das colegas do primeiro período Roberta Frade Madeira, de 17, Giovanna Rotondo, de 18, Isadora Cristina Hanke de Faria e Maria Luíza Camisasca, ambas de 19.
Atenta à conversa, Roberta, de Arcos, no Centro-Oeste, lembrou que o curso de engenharia é mais procurado pelos homens.
A série histórica de 2011 a 2014 demonstra uma divisão de gênero em boa parte dos cursos da universidade. As mulheres são maioria naqueles relacionados aos cuidados e saúde, como terapia ocupacional, enfermagem, nutrição e pedagogia, enquanto os homens ocupam mais vagas nas ciências exatas (veja arte). As exceções ficam com estatística e engenharia de produção, ambos com um número maior de mulheres.
TENDÊNCIA A coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem), Marlise Matos, afirmou que o maior número de alunos na UFMG segue uma tendência mundial, que indica um percentual maior de mulheres em todos os níveis escolares. “As mulheres superaram a barreira do mundo privado, e estão se escolarizando maciçamente”, pontua. No entanto, ela aponta que há uma segregação ocupacional, uma vez que o número de mulheres não é igualmente distribuído entre os diferentes cursos, o que a pesquisadora aponta como herança dos papéis desempenhados pelo sexo feminino na esfera privada.
A mestre em ciência política Áurea Carolina de Freitas, que atuou como subsecretária de Políticas para as Mulheres em Minas Gerais, considera que o processo de socialização das crianças influencia na maneira como homens e mulheres se relacionam com o conhecimento e o mundo do trabalho. Elas são educadas para cuidar do espaço doméstico, enquanto eles para ocupar a esfera pública. “Uma socialização que reproduz o machismo limita as escolhas profissionais das mulheres”, diz.
De acordo com as especialistas, a presença de um número maior de mulheres na universidade deve ser comemorada. No entanto, somente isso não garante a superação das desigualdades de gênero. “A presença tem potencial de mudar. Traz uma perspectiva de melhora social para as mulheres, incorporando suas experiências de vida à produção de conhecimento e à formação profissional”, diz Áurea. Ela ainda ressalta a questão de gênero na educação. “O acesso é fundamental, mas não garante a superação das desigualdades. É importante ter uma inserção equilibrada de mulheres e homens em todas as áreas.”
Inclusão traduz predomínio
Enquanto esperava o começo das aulas na lanchonete da faculdade, Karine Luize Oliveira Esteves, de 18 anos, aluna do primeiro período de engenharia civil, explicava que o mundo é feito de oportunidades, portanto, é preciso aproveitá-las. “Na área de ciências exatas, está meio a meio.
Com a experiência de quem já passou por faculdades de direito e publicidade, Matheus Carvalho de Lima, de 25, futuro engenheiro ambiental, foi categórico: “A sociedade evoluiu e é muito importante a abertura de espaço para as mulheres. Resta aos empregadores reconhecer essa capacidade”, afirmou.
METAS A mestra em ciência política Áurea Carolina afirma que o desafio é superar as barreiras de atuação para homens e mulheres. “É preciso romper alguns estereótipos de gênero associados a algumas áreas de formação e carreiras.” Também, segundo ela, é preciso democratizar as estruturas internas da universidade para que “as mulheres assumam as chefias de departamentos, coordenação dos cursos e atuem como pesquisadoras”. (MMC/GW).