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Estado de Minas

Votação no STF esquenta debate sobre porte livre da maconha para uso pessoal

Polícia diz que grandes apreensões serão mantidas, mas agentes de saúde preveem "tráfico-formiguinha"


postado em 13/09/2015 06:00 / atualizado em 13/09/2015 16:37

Na quinta-feira, dois ministros votaram a favor da descriminalização do porte somente da maconha, a droga mais apreendida em Minas(foto: Carlos Humberto/SCO/STF - 10/09/15)
Na quinta-feira, dois ministros votaram a favor da descriminalização do porte somente da maconha, a droga mais apreendida em Minas (foto: Carlos Humberto/SCO/STF - 10/09/15)

O entendimento de dois dos três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que já votaram no processo que vai definir se a posse de drogas para consumo pessoal é ou não passível de pena abriu caminho para que pelo menos o uso de maconha não seja considerado crime. Historicamente, a maconha é a substância entorpecente mais apreendida pelas forças de segurança pública. Neste ano, ela representou 47,85% das drogas apreendidas pela polícia mineira na capital, 50,80% na Grande BH e 55,75% no interior. Mas não há um consenso sobre o que mudará com a descriminalização, pois, enquanto a Polícia Civil declarou que grandes quantidades e situações de tráfico continuarão a ser reprimidas, especialistas em saúde pública e mental alertam que a permissão de posse de pequenas quantidades pode criar a modalidade de tráfico-formiguinha, de pequenas porções por vez.

Enquanto o relator Gilmar Mendes votou em agosto pela descriminalização do porte de todos os tóxicos em situação de uso pessoal, na quinta-feira os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin se manifestaram a favor da despenalização apenas da posse de maconha para consumo particular. Ainda faltam os pareceres de oito ministros para definir a questão. O ministro Teori Zavascki pediu vista ao processo, o que suspendeu a votação. Faltam, além de Zavascki, os pareceres de Cármen Lúcia, Celso de Mello, Dias Toffoli, Luiz Fux, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber.

Atualmente, não é pequena a quantidade de pessoas detidas por posse de entorpecentes em porções que os juízes consideraram de uso pessoal e que por isso receberam penas como trabalho em instituições de tratamento de dependentes químicos ou pagaram multa. Em levantamento feito pelo Estado de Minas nos processos publicados pelo Diário do Judiciário, em 2014, dos 642 casos relativos à Lei Antidrogas em Belo Horizonte, 143 (22%) eram de condenações pelo artigo 28, que trata de quem é pego com quantidade para próprio uso, sendo os demais relativos a tráfico, plantio e depósito de substâncias entorpecentes.

Para o psiquiatra Valdir Ribeiro Campos, da Comissão de Dependência Química da Associação Brasileira de Psiquiatria, qualquer substância que cause dependência deveria ser controlada, e a descriminalização pode funcionar como porta para nova estratégia para traficantes fazerem seu comércio ilegal e aliciar novos consumidores. “Se você legalizar a droga, vai permitir que o pequeno portador se torne interessante para o traficante. Ele vai poder aumentar o número de pessoas portando a droga para passá-la para outros, o que vira tráfico como já conhecemos”, afirma. De acordo com o psiquiatra, a Lei Antidrogas já não trata o usuário como criminoso. “Não vejo usuários sendo presos, apenas sujeitos a penas alternativas. O juiz dá, se é dependente. Nas clínicas em que trabalho, recebo internações compulsórias. O juiz determina o tratamento e o Estado paga se (o dependente) não tiver condições. Só vejo traficante sendo preso”, afirma.

Já o chefe do Departamento de Investigação Antidrogas de Belo Horizonte, delegado Márcio Lobato, disse o tráfico continuará sendo definido por uma grande quantidade, arbitrada pelo juiz, e por quem esteja plantando, transportando, guardando ou oferecendo as substâncias, entre outras atitudes que caracterizam o crime, segundo o artigo 33 da Lei Antidroga. “A conduta do agente é que pode caracterizar essa infração penal. É óbvio que alguém que porte grande quantidade de drogas, quilos, toneladas, jamais poderá alegar que seria para o consumo próprio.”

O processo em votação no STF refere-se a um mecânico que assumiu a posse de três gramas de maconha numa carceragem de Diadema (SP). A Defensoria Pública argumenta que o artigo 28 da Lei Antidrogas, que define penas alternativas e multa para quem porta entorpecentes em quantidade de uso, fere os princípios constitucionais da intimidade e da individualidade e que a pessoa não prejudica a sociedade com essa ação, não podendo, portanto, ser punida. Se a maioria simples dos 11 ministros considerar o artigo inconstitucional para maconha, a posse da substância em quantidades de uso individual pode ser despenalizada. O mesmo pode ocorrer para todas as drogas, se o entendimento dos ministros for mais amplo.

Ponto crítico

Você é a favor da descriminalização da maconha?

Felipe Martins Pinto,
professor de Direito da UFMG e membro do Conselho de Criminologia e Política Criminal (CCPC)

A FAVOR

Em primeiro lugar, outros países em que temos nos espelhado têm, de maneira crescente, tratado a questão do consumo de drogas pela saúde pública, e não pelo direito penal. O usuário é visto mais como um doente do que como alguém que mereça uma pena. O esvaziamento penal permite que trabalhemos como devemos com as drogas lícitas, como álcool e outras substâncias, pois não é só o ilícito que ofende a saúde. Com isso, não se está fazendo apologia do uso, mas reconhecendo que o direito não é o espaço adequado para dar a resposta para essa questão. Dizer que a descriminalização pode estimular o consumo é um raciocínio simplista, que não procede. Se fosse assim, todas as pessoas beberiam e fumariam, por serem a bebida e o cigarro drogas lícitas.

Psiquiatra Valdir Ribeiro Campos,
da Comissão de Dependência Química da Associação Brasileira de Psiquiatria

CONTRA

Não posso ser a favor de legalizar qualquer substância que leve à dependência ou traga danos diretos e indiretos à saúde humana. Temos dois exemplos legalizados, o álcool e o cigarro, que já provocam doenças e enormes despesas para os sistemas de saúde e previdenciário, danos que poderiam ser ampliados com a legalização de outras drogas. Indiretamente, essas drogas podem ainda levar a um aumento no número de acidentes de trânsito. Há muito tempo se luta para reduzir o consumo de álcool e assim diminuir os acidentes, e, no caso de outras drogas, precisaríamos de pesquisas para ter um certo controle. Atendo caminhoneiros que cheiram cocaína ou fumam crack e motoristas de ônibus que fazem o mesmo antes de pegar a direção conduzindo 40 vidas. O uso de drogas afeta não apenas os usuários, mas expõe também suas famílias e outras pessoas da sociedade a situações advindas da dependência.


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