Jornal Estado de Minas

EM segue combate a incêndio no Rola-Moça e mostra perigo enfrentado por bombeiros

- Foto: Arte EM
As chamas altas que carbonizavam árvores e dizimavam a vegetação rasteira ardiam a até 370°C, o suficiente para derreter barras de chumbo ou o asfalto das estradas. A apenas cinco metros de distância do fogo, as ondas de calor beiravam o insuportável, com temperaturas acima de 60°C. A mata densa e a fumaça sufocante também eram obstáculos, mas não impediam o avanço da guarnição de oito bombeiros acompanhada ontem pela reportagem do Estado de Minas durante o combate ao pior incêndio do ano no Parque Estadual da Serra do Rola-Moça. Em um dos momentos mais tensos, um vento forte levou as labaredas em direção aos combatentes, que precisaram fazer uma retirada de emergência para se salvar.


A queimada, que em dois dias consumiu 450 hectares (ha) da unidade de conservação entre Belo Horizonte, Brumadinho, Ibirité e Nova Lima e ainda não tinha sido controlada até a noite de ontem, é exemplo das dificuldades enfrentadas por bombeiros e brigadistas e da destruição provocada por incêndios em áreas de conservação. De janeiro a setembro, o número de focos de calor em unidades de conservação estaduais e federais em Minas já supera em 10% o registrado no mesmo período do ano passado – passou de 2.848 para 3.126, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A unidade mineira mais afetada por queimadas este ano é o Parque Nacional da Serra da Canastra, onde nasce o Rio São Francisco: foram 638 focos. Ontem, o fogo devastou ao menos metade do Parque da Serra da Boa Esperança, em Boa Esperança, no Sul de Minas.

No Rola-Moça, um dos principais objetivos do grupo de combate ao fogo, formado por 139 bombeiros e brigadistas, era evitar que as chamas chegassem a cinco mananciais usados em abastecimento pela Copasa. Três, porém, acabaram atingidos: os córregos Bálsamo e Taboões, responsáveis por levar água a 66 mil pessoas, em Ibirité; e o Córrego Rola-Moça, que ajuda no fornecimento para 21 mil pessoas em BH e Nova Lima.
O abastecimento a consumidores desses três sistemas foi normalizado ontem.

“Nesses três mananciais, o fogo afetou nascentes e os atingiu”, confirmou o diretor do parque, Marcos Vinícios Freitas. “Mas conseguimos barrar o incêndio antes que chegasse ao Ribeirão Catarina, no Jardim Canadá (responsável por abastecer parte da capital mineira e de Nova Lima), e também ao Córrego Pitangueiras (que leva água a Ibirité)”, acrescentou. Para o diretor do parque, o incêndio pode ter sido criminoso, principalmente por ser essa a origem da “maioria absoluta” das chamas que se alastram pela unidade.



DEVASTAÇÃO Ontem, mais de 24 horas depois do início do incêndio, as estradas que cortam a mata atlântica e a vegetação de cerrado no Rola-Moça estavam tomadas pela poeira dos carros e caminhões-bomba usados no combate às chamas. No ar, dois aviões com capacidade para despejar até 3 mil litros de água e um helicóptero extinguiam focos em pontos íngremes demais para o combate humano ou em pontos onde as labaredas fugiram do controle. Atrás de um grupo de bombeiros, a reportagem do EM deixou uma das estradas e entrou numa área devastada, com um palmo de fuligem sobre o solo e tocos fumegantes – foi o que restou de árvores e canelas-de-ema. No céu, pássaros circulavam áreas queimadas, como se procurassem pelos seus ninhos.

Ao chegar à linha de fogo, os bombeiros de macacões cinzas e amarelos se distribuíram ao longo da faixa de chamas usando abafadores. Mesmo no trabalho de rescaldo, um calorímetro a laser mostrou que a temperatura da lenha queimada e do mato ultrapassava os 200°C.
O calor no ambiente fazia os combatentes suar por dentro das roupas antifogo e das balaclavas usadas para proteger os rostos. Num ponto mais alto, onde o fogo avançava ameaçando o Córrego Pitangueiras, a vegetação mais densa obrigou os combatentes a agir em duas frentes. Uma das primeiras coisas que combinaram foi o ponto de recuo em caso de ameaça: “Se tivermos problemas, nos dirigimos até uma região que chamamos de ancoragem, a área queimada onde o fogo não se propaga por já ter consumido todo o material combustível”, disse o tenente Warley de Paula Vieira Barbosa, líder da guarnição.

CINTURÃO Quando parecia que as chamas estavam dominadas, uma onda de calor intensa surpreendeu quem estava no alto do morro. Era o vento que soprava forte e empurrou as chamas na direção dos combatentes. Em uma fração de segundos, a temperatura aumentou a níveis insuportáveis e obrigou a um recuo. “Para a área queimada! Voltem para a área queimada!”, repetiam os bombeiros uns para os outros. Em meio à fumaça, gritavam uns os nomes dos outros, para ter certeza de que os companheiros tinham escapado. O incêndio não só se alastrou na direção dos homens como os cercou ao formar um cinturão.
Nessa corrida para se salvar, o perigo é tropeçar em pedras e nos ramos da vegetação baixa, o que poderia significar ser atingido pelas chamas.

O calor foi tão intenso que chegou a derreter a sola das botas de integrantes da equipe de reportagem. Quando todos chegaram à área queimada, as labaredas já tinham destruído toda a vegetação que estava no ponto de onde os bombeiros foram “expulsos”. Só restou ao grupo pedir ajuda aos aviões, que, em poucos minutos, despejaram água em voos rasantes nessa linha de frente. “Vamos debelar esse fogo, mas temos de ter atenção o tempo todo. Cada virada de vento como essa nos impede de prosseguir e são perigos reais”, disse o tenente Barbosa. Na noite de ontem, a direção do parque informou que o incêndio só deve ser completamente controlado na manhã de hoje..