- Foto: Um ano de transtornos e sofrimento para os moradores do entorno do Estádio Independência, no Horto, Região Leste de Belo Horizonte, causado pela presença de grandes públicos nas partidas disputadas na arena. Já em 21 de janeiro, quando o Atlético e o time ucraniano Shakhtar Donetsk fizeram uma partida amistosa, mais de 20 mil pessoas compareceram ao estádio. De lá pra cá foram pelo menos 47 partidas de pequeno, médio ou grande portes em que os incômodos voltaram a ocorrer. Quem mora ou trabalha próximo à arena denuncia a rotina de problemas desde 2012, quando o estádio foi reinaugurado: sobra sujeira e faltam lixeiras e banheiros químicos, há abuso de flanelinhas e de ambulantes e as pessoas têm dificuldade para entrar e sair em casa por causa da grande movimentação de carros e torcedores. Mas anteontem, no jogo entre Atlético e Corinthians, decisivo para o sonho do Galo chegar ao título, houve uma explosão de problemas. Moradores tiveram residências invadidas e até apanharam da Polícia Militar (PM), que tentava conter tumulto entre as torcidas.
De modo geral, a população denuncia: houve falha da PM. Por outro lado, a corporação alega: “O Independência é seguro, mas seu entorno não tem estrutura para receber um jogo desse porte, com torcidas rivais”, afirma o comandante do Batalhão de Choque, tenente-coronel Gianfranco Caiafa. Desde a chegada dos ônibus dos torcedores paulistas no Horto, até depois do início da partida, foram pelo menos três confrontos em pontos diferentes do bairro: Praça Estevão Lunardi, na Avenida Silviano Brandão, cruzamento das ruas Pitangui e Nancy de Vasconcelos Gomes, e cruzamento das ruas Alexandre Tourinho e Ismênia Tunes. Em todos os pontos, houve uso de bombas de gás e de efeito moral e moradores e torcedores ficaram feridos.
Passado o pânico do cenário de guerra do domingo, a ressaca da confusão ainda pairava sobre o Horto ontem.
Moradores disseram estar cansados de tantos incômodos e mostraram enorme descontentamento com o conflito e o uso de bombas numa área tranquila e tipicamente residencial. Dono da residência na Rua Alexandre Tourinho invadida por corintianos e, posteriormente, pela PM, o vendedor autônomo Anderson Cardoso, de 39 anos, mostrou ontem as marcas no corpo, resultado da força policial. Com uma guia para fazer exame de corpo de delito nas mãos, ele contou que sua casa, onde estavam seis crianças, sua mulher e uma jovem grávida, foi tomada por cerca de 30 corintianos, que disseram estar esperando a polícia sair. “Os PMs começaram a empurrar o portão e entraram no banheiro onde alguns torcedores estavam. Meu irmão estava lá dentro e mesmo dizendo que havia morador, eles jogaram bomba, empurraram minha filha e me bateram. Foi uma ação truculenta. A polícia tinha que cercar a área e negociar uma saída pacífica dos corintianos”, afirmou Anderson.
As pessoas reclamam ainda da mudança do plano historicamente usado em jogos desde que o estádio foi reinaugurado.
Ônibus de torcidas rivais, de modo geral, param para embarque e desembarque na Rua Córrego da Mata. Mas com 26 ônibus e uma van do time paulista, o comandante Gianfranco alega que a Rua Nancy de Vasconcelos era o único corredor com capacidade de receber a frota. “Aquele ponto é o que a torcida corintiana menos teria contato com atleticanos. Tínhamos informação de que viriam 12 ônibus e vieram 26. Não há no entorno do Independência nenhuma área com capacidade para tantos veículos e conduzir a torcida mantendo separação entre as rivais”, explica Gianfranco.
O problema é que, como conta a aposentada Bernadeth Rodrigues Ávila, moradora da Rua Nancy de Vasconcelos, os veículos ficaram muito próximos da torcida atleticana. “Aí começou a confusão, as bombas, as balas de borracha. O bairro não pode receber esse tipo de jogo. Pra mim, não deveria ter nenhum tipo de jogo aqui, porque a gente sofre muito com o impacto das partidas”, conta.
Para o presidente da Associação Comunitária dos Amigos do Entorno do Estádio Independência e Adjacências (Aameia), Adelmo Gabriel Marques, o que houve no domingo foi o limite do que a população pode suportar.
“Estamos cansados de fazer reclamações na Prefeitura, sem solução. Há regras para a operação do estádio, mas houve um afrouxamento de todos os órgãos. Ambulantes e flanelinhas tomaram conta do bairro. As pessoas não podem sair de casa nos dias de jogos. Para piorar, a polícia colocou em prática um plano operacional diferente do que sempre dava certo e expôs as torcidas rivais ao confronto”, criticou o presidente. Segundo ele, a associação fará uma representação no Ministério Público Estadual ainda nesta semana cobrando providências.
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