Jornal Estado de Minas

"Vi minha casa coberta de lama": sobreviventes de tragédia em Mariana relatam cenário de horror

- Foto: Arte Valf/Marcelo Monteiro/Paulinho Miranda/Janey Costa/Soraia Piva
Mariana –
O cenário era devastador, como se um tsunami tivesse varrido o subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais. Ao redor, agonia, incerteza e dor, muita dor. Mais do que isso, medo. Moradores, parentes das pessoas que trabalhavam na área em que se rompeu a Barragem Fundão, da mineradora Samarco, permaneciam em estado de choque com a tragédia que provocou pelo menos uma morte.

“Perdi tudo, mas, graças a Deus, minha esposa e minha filha estão bem, eu estou bem”, desabafava, emocionado, Fernando Santos, de 33 anos. Ele é uma das pessoas que conseguiram escapar. “Eu estava trabalhando, fui avisado e saí correndo. Foram horas de angústia, quase seis. Ficamos ilhados”.

Como outras pessoas, ele buscou os pontos mais altos do lugar. “De lá, felizmente consegui falar com minha mulher pelo telefone. Ela estava em outra parte alta, com minha filha. Elas estavam assustadas, mas bem”.

Leia Mais

Equipes começam o dia contando vítimas, estragos e prejuízos em povoado de MarianaRompimento de barragens em Mariana: siga em tempo real o atendimento e resgate às vítimasDilma oferece ajuda no socorro às vítimas de tragédia em Bento RodriguesFuncionário relata que tremores foram sentidos horas antes de tragédiaEm vídeo, funcionários de mineradora fogem do estouro de barragem: "Acelera, p...."Bombeiro relata destruição em Bento Rodrigues: 'Tsunami de lama, árvores e pedras'Vídeo: sertanejo Fabiano, da dupla com César Menotti, lamenta tragédia em MarianaCom dificuldade de acesso, resgate a feridos em Mariana avança na madrugada#ForçaMariana: campanha na internet pede ajuda e doações para as vítimas; colaboreBarragens de rejeito já causaram diversas tragédias em Minas Gerais; relembreFotos e vídeo: barragem se rompe e enxurrada de lama destrói distrito de MarianaBarragem de rejeitos se rompe em mineradora de Mariana; acompanhe ao vivoTragédia em Bento Rodrigues: barragem de rejeitos se rompe em mineradoraApesar de não atingidas, casas ficam isoladas em Ponte do Gama e região vira área de riscoRompimento de barragens destroi também patrimônio histórico em Minas Sobreviventes resgatados de Bento Rodrigues dão depoimentos emocionadosBarra Longa é atingida pela lama de rompimento de barragensTragédia com barragens em Mariana ganha repercussão internacionalPopulação já inicia rede de solidariedade para ajudar vítimas de tragédia em Bento RodriguesBarragem que rompeu em Mariana era empreendimento de alto riscoEmpresa admite tragédia com barragens em Mariana e não confirma causasLaudo técnico alertou para instabilidade em área de barragem em MarianaRelatório indica que 8% das barragens de contenção em Minas não são seguras
Outro morador, Cleiton Jacques, de 24 anos, também buscou refúgio num dos locais em que o terreno era elevado, depois de ser alertado por vizinhos. “Eu e um colega conseguimos abrir uma trilha no meio do mato e subimos. Acho que muita gente escapou desse mesmo jeito. Ao chegar à parte alta, havia por lá cerca de 200 pessoas”.
Mesmo com medo, elas ficaram à espera de socorro. Bento Rodrigues tem cerca de 620 habitantes. Sidney Paula, de 36 anos, vivia a incerteza sobre o destino dos pais, até que Cleiton o tranquilizou, contando que não haviam se ferido. “Passei oito horas de agonia, sem notícias deles”, relatou.

Em Mariana, havia dezenas de voluntários, um corre-corre intenso, movimentação de ambulâncias e muita desinformação. Ronaldo Antunes Xavier, de 28 anos, beirava o desespero, porque não tinha localizado o irmão, Marcos Roberto Xavier. “Um dos sobreviventes contou que meu irmão estava trabalhando num dos dois tratores que foram arrastados. Até agora, ninguém falou nada para a gente. Fui até a portaria da Samarco e nos direcionaram para cá (a Arena).
Fomos ao hospital e nos mandaram de volta. A esposa dele está em estado de choque. Tem dois filhos. Está desesperada”.

Fabiana Conceição Sabreira, de 21 anos, estava no Hospital Monsenhor Horta com a filha, Maria Fernanda, de 2 anos, para ser atendida. Ela havia inalado muito gás, cuja origem a mãe não soube explicar. O desespero maior, descreveu, foi chegar até lá. “Peguei a estrada e estava totalmente interditada por causa da lama. De lá vi minha casa inteiramente coberta. Liguei para meu pai, ele me buscou e fomos por outro caminho”.

Além do Hospital Monsenhor Horta, preparado para receber feridos de maior gravidade, as policlínicas de Mariana e do distrito de Santa Rita Durão estavam atendendo as vítimas. Parte foi encaminhada para o HPS, em Belo Horizonte.
Até o fim da noite, o movimento era intenso. “Estou muito desnorteado, foi uma catástrofe. Todos estão desnorteados. Estamos pedindo a Deus para que as pessoas tenham conseguido sair dos locais mais atingidos a tempo”, disse o prefeito de Mariana, Duarte Júnior, de 34 anos.

Havia apoio montado não só no principal ginásio da cidade, a Arena Mariana, como pousadas e hotéis se mobilizavam para acomodar os desabrigados. A Prefeitura de Ouro Preto havia enviado 10 ambulâncias. A Santa Casa local e a Unidade de Pronto Atendimento (Upa) estavam mobilizados para o atendimento imediato.

Inicialmente, duas equipes da Defesa Civil de Minas Gerais com suporte de quatro aeronaves da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros de Belo Horizonte cuidariam do resgate de pessoas ilhadas. A dificuldade de acesso, diante do mar de lama, era um desafio extra aos bombeiros.

- Foto: Arte Valf/Marcelo Monteiro/Paulinho Miranda/Janey Costa
.