Jornal Estado de Minas

Barragem que rompeu em Mariana era empreendimento de alto risco

- Foto: Arte Valf/Marcelo Monteiro/Paulinho Miranda/Janey Costa/Soraia Piva
A Barragem do Fundão, localizada no complexo Germano da Samarco, apresentava alto potencial de dano ambiental, de acordo com o Inventário de Barragem do Estado de Minas Gerais ano 2014, elaborado pela Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam). No documento, o dique é tratado como de classe III. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) instaurou inquérito para apurar as causas do rompimento da barragem e os responsáveis pelo acidente. “Trata-se de uma tragédia sem precedentes na história de Minas Gerais”, afirmou, na noite de ontem, o coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Carlos Eduardo Ferreira Pinto.

Apesar da classificação no mais alto risco de dano ambiental, o empreendimento teve a condição de estabilidade assegurada por auditor´da Feam. De acordo com o inventário, depois de estudos geotécnicos, hidrológicos e hidráulicos, de análises visuais, condições de construção e estrutura, o auditor garantiu a estabilidade física do maciço e também a hidráulica da barragem. O documento destacou não haver “naquele momento, risco iminente de rompimento.”

Em 2013, para a renovação da licença ambiental, o MPMG determinou a inclusão de três condicionantes ao projeto, sendo uma delas a apresentação de um plano de contingência em caso de risco de acidentes “especialmente em relação à comunidade de Bento Rodrigues”, no município Mariana. Outra determinação propunha a realização de análise da ruptura da barragem, cuja entrega à Superintendência Regional de Regularização Ambiental (Supram) foi prevista para julho de 2007. O terceiro ponto era realizar monitoramento geotécnico e estrutural dos diques e da barragem no intervalo máximo de um ano da amostragem.
O documento data de 24 de outubro de 2013 e foi assinado pelo promotor de justiça Carlos Eduardo Ferreira Pinto.

Estarrecido e preocupado com a situação em Bento Rodrigues, sobretudo com as vítimas do acidente – até o fechamento desta edição, não havia um número oficial de pessoas soterradas pela lama –, Carlos Eduardo afirmou com tristeza: “Vamos rezar para não haver um grande número de pessoas atingidas”, disse.

O promotor de Justiça vai sobrevoar, hoje pela manhã, a região afetada pela destruição da estrutura da Samarco. Em Bento Rodrigues, já está, desde a tarde de ontem, uma equipe do MPMG para fazer os primeiros levantamentos sobre o acidente. Além de Carlos Eduardo, assinam o inquérito aberto ontem os promotores de Justiça de Mariana, Antônio Carlos de Oliveira; de Ouro Preto, Domingos Ventura de Miranda Júnior; o coordenador regional das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente das Bacias Hidrográficas dos Rios das Velhas e Paraopeba, Mauro da Fonseca Ellovitch, e a promotora de Belo Horizonte Andréa Soares.

Em nota a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informou que uma equipe do Núcleo de Emergências Ambientais (NEA) está no local do acidente para verificar a ocorrência e tomar as providências necessárias. Informou ainda que dois comitês para avaliar as causas do acidente foram instaurados, sendo um convocado pelo governador Fernando Pimentel e outro pelo secretário de Estado de meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Sávio Souza Cruz.



SEM ACASO
Na avaliação do promotor Carlos Eduardo, ainda é cedo para falar sobre as causas do acidente, mas uma certeza existe: “Nenhuma barragem rompe por acaso”, alerta. Ele lembrou também que não está chovendo forte na região de Mariana, o que poderia ter ocasionado um rompimento da barragem. Ambientalistas consideram que o acidente de Bento Rodrigues é resultado de um processo de licenciamento pouco rigoroso.

O processo é criticado pela coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Andréa Zhouri. “Há falhas no processo de licenciamento e também no monitoramento”, critica.
Segundo ela, a situação pode ficar ainda pior se houver a aprovação do Projeto de Lei (PL) 2946/15, de autoria do governo, que tramita na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O projeto propõe novas diretrizes para o licenciamento ambiental no estado. O geógrafo Paulo André de Barros, da organização não-governamental Arca Amaserra, afirmou que o que ocorreu em Bento Rodrigues não é um problema recorrente em Minas devido à baixa tecnologia para fazer estruturas de contenção nas minerações. “As barragens de terra não são seguras. O risco é muito alto”, disse.
- Foto: Arte Valf/Marcelo Monteiro/Paulinho Miranda/Janey Costa
.