Os sobreviventes da tragédia que devastou Bento Rodrigues e atingiu outros seis distritos de Mariana (Paracatu, Águas Claras, Ponte do Gama, Barra Longa, Pedras e Gesteira) calculam, incrédulos, as perdas causadas pela força da onda de lama e destroços que arrasou tudo por onde passou na tarde de quinta-feira. Muitos perderam todos os pertences e só têm a roupa do corpo. Outros viram carros arrastados, as casas completamente destruídas. Muitos, além do prejuízo material, ainda tiveram que lidar com o desaparecimento de familiares. Embora o Corpo de Bombeiros, a Samarco e a Prefeitura de Mariana tenham informado que, oficialmente, há 13 funcionários da empresa de mineração desaparecidos, entre os sobreviventes os relatos dão conta que o número de soterrados pode ser maior.
O EM ouviu histórias sobre pessoas que não conseguiram escapar e ainda estão desparecidas. No pronto-atendimento de Santa Rita, assim como no Hospital em Mariana, moradores de Bento Rodrigues buscavam informações sobre parentes. Na Arena de Mariana, onde foi montado um alojamento para os desabrigados, a movimentação foi grande ontem. Mesmo com colchões espalhados pela quadra, muitos não conseguiram dormir depois do dia tormento.
“Foi a noite mais longa da minha vida”, conta o professor de Educação Física Paulo Leandro Freitas Eleutério, 28 anos, que ajudou no resgate dos alunos da Escola Municipal Bento Rodrigues, totalmente soterrada pela lama. Foi a conta da gente escapar. Deixamos a escola e fomos para a parte mais alta. Uns cinco minutos depois ela foi tomada pela lama”. Ele conta que inicialmente ouviu um barulho forte e pensou que fosse um helicóptero sobrevoando a escola. “Mas ele foi aumentando e quando resolvi sair para ver o que era vi a diretora gritando para todo mundo sair e um onda de poeira muito grande e muita lama chegando”. Na hora, segundo ele, havia cerca de 40 alunos, inclusive adultos que participam de um programa de alfabetização.
O comandante-geral do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, Coronel Gualberto, informou que foram resgatadas cerca de 500 pessoas. Ele admitiu que pode haver moradores desaparecidos - além dos 13 funcionários da Samarco -, mas disse ser prematuro afirmar quantos. Ele informou que corporação está fazendo um levantamento entre os que foram salvos para saber se há desparecidos.
‘MINHA MÃE MACHUCOU A PERNA’
‘SE EU TENTASSE SALVÁ-LA, MORRERIA’
Vestido de camisa de malha, bermuda e chinelos, Sebastião Felipe dos Santos, de 55 anos, mostrava os arranhões por todo o corpo decorrentes da fuga da onda de lama que tomou conta de todo o distrito de Bento Rodrigues. Ele conseguiu escapar e salvar a irmã Esdra Felipe Ribeiro, de 70. Sem conter a emoção, ele lembrou que a sobrinha do marido da irmã não teve a mesma sorte. De acordo com ele, Maria chegou ao distrito na última quarta-feira para passar alguns dias de descanso. No momento em que a barragem estourou, ela estava pescando em um dos rios que passa pelo distrito. “A avalanche veio de uma vez. Era muita lama. Maria estava do lado de fora pescando. Não tive como fazer nada. Se eu tentasse salvá-la, eu morreria.” Sebastião disse que o filho e o marido de Maria vieram de Contagem para tentar localizá-la, mas até a tarde de ontem, não havia qualquer notícia.
‘ERA A NOSSA FAMÍLIA GRITANDO’
Os primos Jeferson Inácio, de 28 anos, e Altieris Caetano, de 33, lembravam revoltados as dificuldades para salvar familiares e conhecidos no distrito de Bento Rodrigues.
‘FIQUEI MUITO ASSUSTADO COM TUDO’
Solidariedade e dor em todos os cantos. O educador, dono de um brechó na rua Praia do Canela, Geraldo Henrique Silva, prestou suas homenagens às vítimas pendurando um tecido preto com a palavra “luto” em branco. “Presto minha homenagem às pessoas atingidas. Fiquei muito assustado com tudo”, disse Geraldo Henrique, que usou o manequim com a placa da loja para pendurar a faixa.
‘FOI COMO UM FILME DE TERROR’
“Foi como um filme de terror. Gente gritando, correria”, diz o morador de Bento Rodrigues Marcone de Souza, de 19 anos. Na tarde de ontem, no ponto em que a polícia fez um bloqueio para que as pessoas não ultrapassassem a área atingida pela onda de lama, ele olhava perplexo toda destruição de onde vivia. Desempregado, o jovem não sabe como será o futuro.
'A GENTE VIA A ÁGUA COBRINDO BENTO'
.