Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado e São José do Goiabal – Um manancial que já é um dos mais degradados de Minas, sofrendo com a estiagem e a superexploração, agora é assolado por milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, entulho, galhos, sujeira, animais e peixes mortos. Essa é a dupla agonia enfrentada pelo Rio Doce, historicamente pressionado por esgoto, assoreamento e desmatamento que passa a enfrentar a onda de lama liberada pelo rompimento de barragens da Samarco em Mariana. O rio sofre o impacto desde o início do seu curso, na Zona da Mata, até o Espírito Santo, onde a cheia liberada pelo desastre deve chegar hoje. Especialistas acreditam que o novo episódio de degradação, que culminou com a suspensão da captação de água para abastecimento humano em pelo menos cinco cidades mineiras e causou grande mortandade de peixes, é o golpe de misericórdia no curso d'água que já não tinha forças para chegar à foz por seu caminho mais tradicional, conforme mostrou o Estado de Minas na série de reportagens “Amarga agonia”, publicada em julho.
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O prefeito de Periquito, Geraldo Godoy (PMDB), chama a atenção para o desabastecimento que enfrentam os cerca de 7 mil moradores. A Copasa precisou interromper a captação no Rio Doce para atender ao distrito de Pedra Corrida e foi impedida de usar o manancial para suprir a seca do Rio Periquito, que normalmente abastece o restante do município. "Desde ontem (domingo) a população está sentindo falta de água.
Em Naque, a onda de lama amontoou peixes mortos na beira do Rio Doce e também causou a suspensão da captação. A Copasa precisou interromper o sistema mesmo se abastecendo do Rio Santo Antônio, já que a mancha de lama invadiu o afluente. Em Resplendor e Tumiritinga, a companhia de saneamento também teve que desligar as bombas para não distribuir água sem condições de tratamento.
Na avaliação do professor Duque-Brasil, a biodiversidade foi arrasada no Vale do Rio Doce. “O dano ambiental é irremediável, pois tudo o que respira no ecossistema está morrendo: peixes, tartarugas, pequenos mamíferos e aves. Houve interrupção na cadeia alimentar”, diz. Para as matas ciliares, as consequências foram igualmente nocivas. Com a lama de mineração, o assoreamento do Rio Doce vai aumentar. “É engano dizer que esta lama não é tóxica.
SETOR PRODUTIVO Os problemas para os ribeirinhos não foram menores. Ao longo do curso d'água, diz o biólogo, há muitas comunidades que vivem da agricultura e que precisam do rio para produzir. Além disso, há comunidades indígenas, como o povo krenak. “A situação é muito triste para quem precisa da irrigação. Nesse tempo seco, sem poder usar a água do rio, tudo fica inviável”, diz o agroecólogo Filipe Fernandes de Souza. Atuando no Centro Agroecológico Tamanduá, organização não-governamental que dá assessoria a 20 municípios no entorno de Valadares, Filipe diz que a lama quebrou a cadeia de produção. “Tememos a contaminação do solo por metais pesados”, afirma.
ESPÍRITO SANTO Enquanto a mancha de lama varre o curso do Rio Doce ainda em Minas Gerais, autoridades capixabas tomam providências para tentar minimizar os impactos da passagem dos resíduos por cidades como Baixo Guandu, Colatina e Linhares. A Defesa Civil do estado vizinho já removeu comunidades ribeirinhas das margens do rio em Colatina.
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