Praticamente todos os moradores do distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, que sobreviveram ao rompimento de duas barragens na semana passada estão hospedados em hotéis e pousadas da cidade. A maior parte deles pode ser vista do lado de fora dos estabelecimentos, sentada nas calçadas, conversando na rua e tentando manter os costumes.
No centro movimentado de Mariana, quando conversam com a imprensa, eles deixam claro que pouco sabem sobre o futuro, já que a maioria perdeu tudo - casa, carro, móveis, documentos, fotos, memórias. Mas há uma unanimidade na fala de todos os que foram ouvidos: querem reerguer a comunidade num cantinho só deles, como um dia foi o distrito carinhosamente chamado de Bento.
A saudade é demais. É o que mais incomoda a gente. Não ter pra onde voltar é muito ruim," desabafou a dona de casa Edna Aparecida Euzébio, de 34 anos. Ela, o marido e três filhas moravam numa casa de tês quartos no povoado, que foi arrasado pela lama e pelo barro. A família costumava ir até Mariana apenas para pagar contas e cumprir um compromisso ou outro, nada mais.
"Lá era tranquilo demais. A gente dormia com as portas abertas, papeava na porta de casa, jogava truco até mais tarde.
Sem conseguir deixar de ouvir a conversa, o encarregado José Luiz da Silva, de 44, concorda com tudo o que a dona de casa diz. Depois da tragédia ele sequer tentou buscar o que poderia ter sobrado de suas coisas em Bento Rodrigues, porque viu pela televisão que só a estrutura da casa permaneceu de pé.
"Não tenho vontade de voltar lá não, mas tenho uma saudade danada de casa. É uma mistura de emoções muito fortes. Do tipo quero voltar, mas não quero, disse, numa tentativa de explicar o que sente. José destacou ainda o medo, compartilhado por muitos da comunidade, a preocupação com a barragem de Germano, da mesma mineradora, que permanece cheia.
"Há mais coisa lá em cima.
O servente Paulo Madalena Fernandes, de 56, morava sozinho em uma casa de quatro quartos em Bento Rodrigues. A casa era da mãe dele, repleta de lembranças que não vão mais ser recuperadas. Quando as duas barragens de romperam, Paulo estava em casa. Correu como nunca.
"Dentro de hotel, não aguento ficar. Venho sentar aqui fora, papear. Perdemos muita memória e isso ninguém consegue dar de volta. É por isso que queremos uma nova vila, longe da cidade, como era antes. Só assim pra conseguir recomeçar a vida.".