Moradores de áreas próximas a barragens de rejeitos em Minas, especialmente aquelas que não têm estabilidade garantida, vivem em estado de alerta, intensificado depois da catástrofe de Mariana, na Região Central do estado. Infelizmente, trata-se de uma apreensão silenciosa: embora não haja um levantamento oficial sobre a presença de instrumentos de alerta sonoro nesses empreendimentos, o uso de sirenes para alertar comunidades vizinhas em casos de emergência, se existe, é exceção. Apenas na Região Metropolitana de Belo Horizonte 11 diques sem garantia de estabilidade não contam com a aparelhagem, que, apesar de não legalmente obrigatória, é uma das mais indicadas para alertar sobre um desastre. No caso da última tragédia, estima-se que pelo menos parte das 11 mortes e 12 desaparecimentos pudessem ter sido evitadas pelos alarmes sonoros
Conforme o último inventário da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), de 2014, Minas conta com 754 barragens, de acumulação de água, disposição de rejeitos e de resíduos industriais. Dessas, 42 não tiveram a condição de estabilidade garantida ou não houve conclusão sobre a vistoria, por falta de documentos. Levantamento do Estado de Minas mostrou que pelo menos 24 estão em média a dois quilômetros de áreas habitadas, o que dá a real dimensão do risco em caso acidentes. Quase a metade dessas barragens próximas de locais povoados está na Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde a reportagem não encontrou nenhum sistema sonoro nas áreas urbanas próximas às 11 barragens. São quatro em Brumadinho, pertencentes à MMX, três em Nova Lima, de propriedade da Vale, MBR e Mundo Mineração, três diques da Vale em Sabará e um em Rio Acima, da Nacional Minérios.
O uso de sirenes é comum na mineração para sobre a detonação de explosivos dentro das minas. Algo parecido deveria ser usado em comunidades próximas a barragens, segundo defendem especialistas em geotecnia de barragens. Nos casos de ameaça iminente de rompimento, soar a sirene seria a providência mais importante dos planos de ação emergencial (PAEs), previstos pela Lei de Segurança de Barragens (12.334/2010), além do treinamento dos funcionários das minas e de um plano completo de escape da população. “O desastre em Mariana acordou a gente para a realidade da falta de sirenes. Que eu saiba, nenhuma das 15 a 20 barragens de contenção da Bacia do Rio Santo Antônio, incluindo cinco em Itabira, jamais teve sirene de alerta. No Bairro Bela Vista, onde moro, a 500 metros de uma barragem de contenção de rejeitos de minérios, a mina passa por obras de alteamento e a população está apreensiva”, afirma Felipe Benício Pedro, presidente do comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Santo Antônio e diretor do Sindicato Metabase de Itabira. A entidade convocou reunião para hoje, na Câmara Municipal de Ferros, para tentar levantar documentos e monitorar as condições de seguranças dos dique da região.
“Sirene aqui é igual cabeça de bacalhau. O prefeito desconhece, a empresa está falando que tem mas não mostra onde é e ninguém nunca viu”, afirmou Sandoval de Souza Pinto Filho, diretor de Meio Ambiente e Saúde da União das Associações Comunitárias de Congonhas (Unaccom), que participou ontem de audiência pública na Assembleia Legislativa para discutir os riscos da Mina Casa de Pedra, da CSN, que fez acordo para a realização de obras de segurança na barragem em 2013. “Mais importante do que ter um plano de comunicação de acidentes é conseguir evitá-los. A empresa efetivamente cumpriu, ponto a ponto, todas as exigência do acordo com o Ministério Público, como a modificação do sistema hidráulico, o reflorestamento de taludes e a eliminação de focos erosivos”, afirmou o promotor de Justiça do Meio Ambiente em Congonhas, Vinícius Alcântara Galvão.
RESPOSTA RÁPIDA A Portaria 526, de 9 de dezembro de 2013, publicada pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), lista procedimentos preventivos e corretivos a serem adotados em situação de emergência, mas deixa livre ao empreendedor a descrição das ações. O professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Adilson do Lago Leite, diz que a opção de alerta sonoro é absolutamente necessária em um caso similar ao de Bento Rodrigues, onde as barragens são de alto risco. “São grandes empreendimentos que precisam de uma resposta muito rápida para garantir a evacuação das pessoas. O que aconteceu em Bento Rodrigues foi absolutamente inadequado, com ligações telefônicas para alertar algumas pessoas”, diz o professor. Ele lembra que esse tipo de alerta é comum, por exemplo, na região de Angra dos Reis, onde há duas usinas gerando energia a partir de uma fonte nuclear e são grandes os riscos em caso de acidente.
A Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) informou que os relatórios anuais de estabilidade das barragens só podem ser feitos a partir do momento em que o empreendedor começa a operar e, consequentemente, já possui licenciamento. A Samarco foi procurada pela reportagem, mas não se manifestou sobre uma possível instalação de sistema de alerta sonoro para a região das barragens de Santarém e Germano. Ninguém foi encontrado no DNPM para comentar o assunto. O prefeito de Rio Acima, Wanderson Lima, informou que há uma intenção da Nacional Minérios em colocar o sistema de alerta em sua barragem na cidade. A reportagem não conseguiu contato com representantes da MMX, MBR e Mundo Mineração para comentar o assunto.
Em nota, a Vale informa que tem Planos de Ações Emergenciais para todas as estruturas em que há exigência prevista na legislação e que todos eles contam com protocolo de alerta, bem como fluxogramas de notificação e comunicação para o caso de acidentes. A empresa não diz nada, porém, em relação a ter ou não sirenes nas barragens.