Ouro Preto – A 1.380 metros acima do nível do mar, na Serra do Espinhaço, nascem as águas límpidas, sem um turvo de barro ou lodo, que formam o Rio Gualaxo do Norte, em Ouro Preto, Região Central de Minas. Cercado pela Mata Atlântica, que serve de reserva aos carcarás, esse trecho preservado contrasta com o manancial de calha devastada por 62 milhões de metros cúbicos de lama, equivalentes a 20 mil piscinas olímpicas, que vazaram da Barragem do Fundão, no complexo minerário da Samarco, em Mariana, no dia 5. O desastre dizimou a mata ciliar do rio, arrebatou peixes que ninguém sabe onde foram parar e transformou 48 dos 60 quilômetros de extensão do manancial num canal de lama vermelha em meio a um deserto de barro e minério de ferro. A reportagem do Estado de Minas foi ontem à nascente do Rio Gualaxo do Norte para mostrar a vitalidade do primeiro curso d’água soterrado nessa que é a pior tragédia ambiental do Brasil.
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POLUENTES Nessa pesquisa, poluentes químicos prejudiciais tanto aos peixes quanto aos homens, como mercúrio e arsênio, foram encontrados em quantidades nocivas nas amostragens de sedimentos coletadas ao longo de todo o Gualaxo do Norte. A conclusão do trabalho é que a garimpagem de ouro vinha envenenando o curso d’água e que poderia degradar ainda mais o manancial. Agora, a lama que chegou a se elevar por mais de 20 metros de altura e a atingir quase um quilômetro de largura, arrasou o rio e o maquinário dos garimpeiros.
A importância do Gualaxo do Norte é também histórica. Foi desbravando seu vale que os bandeirantes abriram caminho para a Região Central de Minas Gerais, chegando a fundar o arraial que originou Alvinópolis, no século 17.