A reunião tratava de segurança do trabalho, por volta de 15h30, na quinta-feira que ficou marcada pelo trágico rompimento da Barragem do Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana, na Região Central de Minas. Participavam da teleconferência o presidente da empresa, o engenheiro metalúrgico Ricardo Vescovi, de 45 anos, no escritório da Savassi, em Belo Horizonte, e suas equipes de Minas e Ponta Ubu, unidade do litoral do Espírito Santo. “De repente, o meu gerente-geral de Saúde e Segurança se aproximou e disse: ‘Ricardo, recebi a informação agora de que a Barragem do Fundão se rompeu’. Na hora eu gelei. Perguntei para ele, como assim? E ele disse: ‘Se rompeu inteira’”. A recordação congelada na memória de Vescovi é do momento em que ele recebeu a informação sobre a tragédia em Mariana, com o vazamento de mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos da mineração de ferro. Em entrevista ao Estado de Minas concedida ontem, na sede da empresa, o executivo relembrou esses momentos com os olhos marejados, o que se repetiu quando foi perguntado se tinha medo de ser preso. Demonstrou, ainda, que a situação é de extrema preocupação para quem vive no rastro da lama ou próximo às barragens, ao admitir que as exigências de segurança da legislação sobre barragens se mostraram insuficientes, assim como os planos de emergência, e que os outros represamentos, de Germano e Santarém, no mesmo complexo, levarão até 90 dias para receber reforço no nível preconizado pelas normas. Acrescentou que as investigações sobre as causas do acidente, feitas por especialistas contratados pela Samarco, devem demorar de seis meses a um ano, e que a empresa não pode garantir os empregos dos cerca de 3 mil trabalhadores do quadro direto de pessoal depois do retorno da dispensa, em 4 de janeiro.
Qual foi a primeira atitude ao saber do rompimento da Barragem do Fundão?
Foi uma notícia inacreditável. Como rompeu? É inacreditável, porque uma barragem não se rompe inteira. A minha preocupação foi com as pessoas. Onde está todo mundo? Por isso, nossas ações foram imediatas e em 24 horas conseguimos providenciar hotéis para todos os desabrigados.
O senhor disse que recebeu a notícia do rompimento por volta de 15h. E quanto ao tremor ou anomalia que foi sentida antes?
Só soube do rompimento. Os laboratórios de sismologia da USP e da UnB informaram ter registrado eventos sísmicos (tremores) na nossa região. Eventos de baixa profundidade. Funcionários relatam que perceberam.
As formas de aviso das comunidades têm sido criticadas, inclusive por ter havido mortes. O plano de emergência não previa avisos sonoros, por exemplo. Houve falha na execução desse projeto?
O plano de emergência foi executado, mas a perda de vidas, para a Samarco, é inadmissível. O plano existiu, foi elaborado e o que foi enviado para as autoridades foi executado.
Pode-se, então, dizer que as exigências das autoridades no plano talvez sejam insuficientes?
Sim. Depois de um acidente dessa proporção, todo mundo tem de voltar a discutir. Necessitamos rediscutir muitas coisas. O que aconteceu foi instantâneo, não foi progressivo, como normalmente ocorre em modelos de barragens. Isso é um fato muito importante. O plano de atendimento a emergência é feito para contemplar várias coisas, mas o modo de ruptura trouxe dimensões diferentes do que se previa.
As barragens remanescentes do complexo Germano recebem reparos, mas podem se romper? Sim ou não?
A gente fala de fator de segurança. O Dique da Selinha (da Barragem do Germano) está com fator de segurança de 1,22, ou seja, está 22% acima do ponto de equilíbrio. Queremos que chegue a 1,5, ou seja, a 50%, mais do que preconiza a norma. Em Santarém, está 1,37, 37% acima do ponto, e queremos também elevar a 1,5 (50%). Desde o primeiro momento estamos monitorando com radares, escâneres eletrônicos, topografia por drone e visual. E as duas não se deformaram mais. Estamos com um trabalho de reforço das paredes.
Mas há risco de rompimento? Sim, ou não?
Falo sempre em fator de segurança. Não tem uma resposta assim. O fator de segurança é a maneira técnica como os especialistas se referem. A gente está vendo o trabalho que é feito 24 horas por dia.
E o andamento desse reforço estrutural? Qual é o prazo de conclusão?
Depende muito das condições climáticas. Com chuva e raios, não podemos trabalhar. Estimamos que leve de 45 a 60 dias para os reparos no Dique da Selinha e até 90 dias para a Barragem de Santarém.
Em quanto tempo saberemos o que realmente ocorreu?
Pela experiência com outros eventos de grande porte, isso deve levar de seis meses a um ano. Para que os especialistas que contratamos levantem e testem hipóteses. E isso é muito importante. Acho que há muita responsabilidade nessa resposta, porque interessa, e muito, para nós saber o que aconteceu. De imediato, com a ocorrência da tragédia, já trouxemos especialistas. Ainda está chegando gente. À medida em que vão trocando informações entre eles, vão nos requisitando outros especialistas, como em sismologia. É uma investigação complexa, que está sendo feita agora. Não podemos precisar ainda todos os momentos. O que de fato ocorreu nessa barragem envolve várias ciências: geotecnia, geologia, mecânica de solos, mecânica de fluidos. Temos uma barragem que estava sendo operada, monitorada, licenciada, dentro dos padrões que se entende serem os melhores. Tínhamos auditoria e um corpo de governança internacional que vinha três vezes por ano fazer monitoramento.
O que, de fato, ao saber da enxurrada, a Samarco fez para tentar conter a lama e os rejeitos?
A gente tentou, junto com o Ibama, fazer um teste com floculação, que é uma aceleração da decantação, para a lama afundar mais rápido. Seria com o uso de um extrato natural da flor acácia-negra, que vinha sendo usado em nossos processos e no tratamento das captações atingidas. O composto se chama Tanfloc, fizemos estudos para ver se poderia ser usado, mas o volume do rio é muito grande e a efetividade, pelo nível de turbidez, não seria suficiente. Compramos todo o estoque de Tanfloc do Brasil, mas não seria suficiente. Em 24 horas conseguimos desmontar e levar equipamentos da Minas de Germano para os locais atingidos. Uma vez que o acidente ocorreu, tentamos o que foi possível. Não havia tempo para construir uma nova barragem para conter a lama. Até fizemos a instalação de 9 mil metros de barreiras em Linhares (ES) para proteger os estuários e mangues, e conseguimos uma efetividade de 80%. Isso foi reconhecido pelo pessoal da foz, pescadores, Projeto Tamar e Instituto Chico Mendes.
A Samarco vai procurar limpar e recuperar o que foi atingido nos rios?
Tanto a assistência humanitária quanto a ação social estão sendo feitas. Para melhorar as condições dos rios, contratamos uma empresa de renome internacional, a GolderAssociates, para, com muitas outras instituições do Brasil, diagnosticar e definir onde vamos limpar, entender o que será feito e colocar em ação.
O senhor tem carta branca dos acionistas para tomar qualquer decisão neste momento? Eles também são responsáveis?
O contato é diário com os acionistas, que têm nos dado todo o suporte. Há pessoas tanto da Vale quanto da BHP Billiton (coproprietárias da Samarco) em campo. Ninguém está me colocando nenhuma limitação em relação a recursos. Os melhores recursos deles também estão sendo colocados para nos ajudar, mas posso falar pela Samarco. É uma empresa sólida e que tem história. Sobre os valores que construímos e praticamos é que temos de trabalhar agora, na gestão mais imediata dessa crise e depois na recuperação e no reerguimento dela, se a sociedade assim desejar.
Especialistas dizem que a Samarco vai precisar de pelo menos mais três anos para voltar a operar. Até lá, Mariana corre o risco de conviver com o aumento do desemprego?
Sempre respeitamos muito o conhecimento, o comprometimento e a confiança nos empregados. Tudo isso é levado em consideração. No primeiro momento, nossos funcionários entraram em licença remunerada e, depois, em férias coletivas. Esse é um tempo importante para nós pensarmos em alternativas. Foi o tempo para que a gente pudesse vencer esse foco inicial de ajuda humanitária e meio ambiente, além desse trabalho de estabilização das barragens. Temos, agora, de pensar em que soluções podemos dar daqui para frente. Ninguém sabe ao certo qual será esse prazo. Temos um cenário claro com os empregados até o fim ano, tempo para que alternativas sejam estudadas e medidas, adotadas.
Em razão de todas as repercussões do acidente, inclusive aquelas questões previstas na lei, o senhor tem medo de ser preso?
Desde o começo, do dia do acidente até agora, estou totalmente envolvido em liderar a Samarco neste momento difícil da nossa história, em que precisamos do esforço de todo mundo. Estou à frente do trabalho, passando confiança às pessoas, agradecendo a elas pelo esforço, motivando-as e promovendo esse engajamento. Para tratar dessas questões nós temos nosso corpo jurídico.
Foi noticiado, inclusive, que o senhor conseguiu um habeas corpus preventivo...
Volto a dizer que o meu foco está no trabalho. Essas questões estão sendo encaminhadas pelo nosso departamento jurídico. É importante frisar o tanto que isso está consumindo da gente na condição de ser humano, líder, e o tanto que a gente está engajado nisso, para que as pessoas se sintam cada vez mais amparadas e motivadas em fazer o trabalho que tem de ser feito.
Qual foi a primeira atitude ao saber do rompimento da Barragem do Fundão?
Foi uma notícia inacreditável. Como rompeu? É inacreditável, porque uma barragem não se rompe inteira. A minha preocupação foi com as pessoas. Onde está todo mundo? Por isso, nossas ações foram imediatas e em 24 horas conseguimos providenciar hotéis para todos os desabrigados.
O senhor disse que recebeu a notícia do rompimento por volta de 15h. E quanto ao tremor ou anomalia que foi sentida antes?
Só soube do rompimento. Os laboratórios de sismologia da USP e da UnB informaram ter registrado eventos sísmicos (tremores) na nossa região. Eventos de baixa profundidade. Funcionários relatam que perceberam.
As formas de aviso das comunidades têm sido criticadas, inclusive por ter havido mortes. O plano de emergência não previa avisos sonoros, por exemplo. Houve falha na execução desse projeto?
O plano de emergência foi executado, mas a perda de vidas, para a Samarco, é inadmissível. O plano existiu, foi elaborado e o que foi enviado para as autoridades foi executado.
Pode-se, então, dizer que as exigências das autoridades no plano talvez sejam insuficientes?
Sim. Depois de um acidente dessa proporção, todo mundo tem de voltar a discutir. Necessitamos rediscutir muitas coisas. O que aconteceu foi instantâneo, não foi progressivo, como normalmente ocorre em modelos de barragens. Isso é um fato muito importante. O plano de atendimento a emergência é feito para contemplar várias coisas, mas o modo de ruptura trouxe dimensões diferentes do que se previa.
As barragens remanescentes do complexo Germano recebem reparos, mas podem se romper? Sim ou não?
A gente fala de fator de segurança. O Dique da Selinha (da Barragem do Germano) está com fator de segurança de 1,22, ou seja, está 22% acima do ponto de equilíbrio. Queremos que chegue a 1,5, ou seja, a 50%, mais do que preconiza a norma. Em Santarém, está 1,37, 37% acima do ponto, e queremos também elevar a 1,5 (50%). Desde o primeiro momento estamos monitorando com radares, escâneres eletrônicos, topografia por drone e visual. E as duas não se deformaram mais. Estamos com um trabalho de reforço das paredes.
Mas há risco de rompimento? Sim, ou não?
Falo sempre em fator de segurança. Não tem uma resposta assim. O fator de segurança é a maneira técnica como os especialistas se referem. A gente está vendo o trabalho que é feito 24 horas por dia.
E o andamento desse reforço estrutural? Qual é o prazo de conclusão?
Depende muito das condições climáticas. Com chuva e raios, não podemos trabalhar. Estimamos que leve de 45 a 60 dias para os reparos no Dique da Selinha e até 90 dias para a Barragem de Santarém.
Em quanto tempo saberemos o que realmente ocorreu?
Pela experiência com outros eventos de grande porte, isso deve levar de seis meses a um ano. Para que os especialistas que contratamos levantem e testem hipóteses. E isso é muito importante. Acho que há muita responsabilidade nessa resposta, porque interessa, e muito, para nós saber o que aconteceu. De imediato, com a ocorrência da tragédia, já trouxemos especialistas. Ainda está chegando gente. À medida em que vão trocando informações entre eles, vão nos requisitando outros especialistas, como em sismologia. É uma investigação complexa, que está sendo feita agora. Não podemos precisar ainda todos os momentos. O que de fato ocorreu nessa barragem envolve várias ciências: geotecnia, geologia, mecânica de solos, mecânica de fluidos. Temos uma barragem que estava sendo operada, monitorada, licenciada, dentro dos padrões que se entende serem os melhores. Tínhamos auditoria e um corpo de governança internacional que vinha três vezes por ano fazer monitoramento.
O que, de fato, ao saber da enxurrada, a Samarco fez para tentar conter a lama e os rejeitos?
A gente tentou, junto com o Ibama, fazer um teste com floculação, que é uma aceleração da decantação, para a lama afundar mais rápido. Seria com o uso de um extrato natural da flor acácia-negra, que vinha sendo usado em nossos processos e no tratamento das captações atingidas. O composto se chama Tanfloc, fizemos estudos para ver se poderia ser usado, mas o volume do rio é muito grande e a efetividade, pelo nível de turbidez, não seria suficiente. Compramos todo o estoque de Tanfloc do Brasil, mas não seria suficiente. Em 24 horas conseguimos desmontar e levar equipamentos da Minas de Germano para os locais atingidos. Uma vez que o acidente ocorreu, tentamos o que foi possível. Não havia tempo para construir uma nova barragem para conter a lama. Até fizemos a instalação de 9 mil metros de barreiras em Linhares (ES) para proteger os estuários e mangues, e conseguimos uma efetividade de 80%. Isso foi reconhecido pelo pessoal da foz, pescadores, Projeto Tamar e Instituto Chico Mendes.
A Samarco vai procurar limpar e recuperar o que foi atingido nos rios?
Tanto a assistência humanitária quanto a ação social estão sendo feitas. Para melhorar as condições dos rios, contratamos uma empresa de renome internacional, a GolderAssociates, para, com muitas outras instituições do Brasil, diagnosticar e definir onde vamos limpar, entender o que será feito e colocar em ação.
O senhor tem carta branca dos acionistas para tomar qualquer decisão neste momento? Eles também são responsáveis?
O contato é diário com os acionistas, que têm nos dado todo o suporte. Há pessoas tanto da Vale quanto da BHP Billiton (coproprietárias da Samarco) em campo. Ninguém está me colocando nenhuma limitação em relação a recursos. Os melhores recursos deles também estão sendo colocados para nos ajudar, mas posso falar pela Samarco. É uma empresa sólida e que tem história. Sobre os valores que construímos e praticamos é que temos de trabalhar agora, na gestão mais imediata dessa crise e depois na recuperação e no reerguimento dela, se a sociedade assim desejar.
Especialistas dizem que a Samarco vai precisar de pelo menos mais três anos para voltar a operar. Até lá, Mariana corre o risco de conviver com o aumento do desemprego?
Sempre respeitamos muito o conhecimento, o comprometimento e a confiança nos empregados. Tudo isso é levado em consideração. No primeiro momento, nossos funcionários entraram em licença remunerada e, depois, em férias coletivas. Esse é um tempo importante para nós pensarmos em alternativas. Foi o tempo para que a gente pudesse vencer esse foco inicial de ajuda humanitária e meio ambiente, além desse trabalho de estabilização das barragens. Temos, agora, de pensar em que soluções podemos dar daqui para frente. Ninguém sabe ao certo qual será esse prazo. Temos um cenário claro com os empregados até o fim ano, tempo para que alternativas sejam estudadas e medidas, adotadas.
Em razão de todas as repercussões do acidente, inclusive aquelas questões previstas na lei, o senhor tem medo de ser preso?
Desde o começo, do dia do acidente até agora, estou totalmente envolvido em liderar a Samarco neste momento difícil da nossa história, em que precisamos do esforço de todo mundo. Estou à frente do trabalho, passando confiança às pessoas, agradecendo a elas pelo esforço, motivando-as e promovendo esse engajamento. Para tratar dessas questões nós temos nosso corpo jurídico.
Foi noticiado, inclusive, que o senhor conseguiu um habeas corpus preventivo...
Volto a dizer que o meu foco está no trabalho. Essas questões estão sendo encaminhadas pelo nosso departamento jurídico. É importante frisar o tanto que isso está consumindo da gente na condição de ser humano, líder, e o tanto que a gente está engajado nisso, para que as pessoas se sintam cada vez mais amparadas e motivadas em fazer o trabalho que tem de ser feito.