Depois de honrar a promessa de levar ao altar a única filha, Veridiana Viana, em maio passado e de completar 60 anos de idade (em 2 setembro), o representante comercial Klinger Figueiredo Viana morreu nesta quarta-feira, às 5h20, exatamente na data em que completaria 35 anos de casamento civil com Helena Cristofolo, de 56, que nos últimos 45 dias de internação permaneceu ao lado do marido no Hospital São Lucas, em Belo Horizonte. Desde 2006, Klinger travava verdadeira batalha contra o câncer de linfoma não Hodgking nas células do manto, um dos tipos mais agressivos da doença.
“A grande lição que meu pai deixa para nós é a de acordar, todos os dias, agradecendo por estar vivo e, na hora de se deitar, fazer o mesmo. Era um exemplo da garra de viver”, registra Veridiana, que por sua vez, também se mostrou forte para falar sobre o amor incondicional pelo pai, na ocasião do funeral realizado na tarde de desta quarta-feira na Santa Casa de Misericórdia. Como não poderia deixar de ser, a desolação da filha contrastava com a alegria incontida de Klinger, seis meses antes na cerimônia na Igreja São José. Ele atravessou firme a nave da igreja restaurada, extremamente elegante no terno cinza, enfeitado com uma rosa branca na lapela.
Na verdade, o pai atendia a um pedido da filha. Na primeira reportagem concedida ao Estado de Minas, Veridiana se negava a antecipar o casamento religioso em função da doença do pai. Concordou apenas em adiantar o civil, conforme foi feito. “Já vi noivas que estão na minha situação simularem casamentos de mentirinha só para entrar na igreja de braços dados com o pai. Eu me recuso a fazer isso. Quer dizer que, depois que me casar, meu pai está liberado para morrer? Nada disso”, desabafou ela, na época, permanecendo o tempo inteiro confiante. E assim foi feito.
Com jeito brejeiro, Klinger parecia ser capaz de despistar até a morte. Desde que o câncer foi diagnosticado, a vida da família Viana passou a ser contada em números: em 14 de dezembro que vem, o paciente completaria nove anos de sobrevivência. Com expectativa de vida de dois a quatro anos, no máximo, Klinger dobrou a previsão mais otimista dos médicos. Nesse intervalo, atravessou 12 pneumonias, oito embolias, três tromboses, dois acidentes vasculares cerebrais (AVCs) e seis pontes de safena. Perdeu a conta das sessões de quimioterapia e radioterapia a que foi submetido, que ultrapassaram 200.
Klinger chegou a ser 'estudo de caso' em faculdades de medicina de Minas, Convidados a analisar seus prontuários, a maioria dos estudantes não acreditava que o paciente pudesse continuar vivo, contrariando todos os prognósticos médicos. Nos últimos meses, porém, o senhor Klinger vinha arrefecendo as energias, intercalando com maior frequência os períodos de internação e de retorno para casa. “No aniversário de 60 anos dele, fizemos um bolinho de aniversário em casa, só com a família. Papai nunca aceitava que cantassem os parabéns para ele, mas desta vez, concordou. Ele já estava adivinhando”, afirma a filha.
Em julho passado, a engenheira ambiental Veridiana largou o emprego fixo em Uberlândia, onde estava morando com o marido, Fernando Henrique dos Santos, e voltou para morar perto dos pais. No dia 20, será a vez de Fernando também concluir a obra na cidade do interior e se mudar para a capital. “Na última vez que liguei, contei que já estava indo e perguntei se ele queria que levasse alguma coisa. Ele só pediu para minha mãe transmitir o recado de que ele estava muito feliz e que eu agradecesse meu marido e que cuidasse bem dele, igual à minha mãe cuidava de mim”, disse.