Mesmo depois de a enxurrada de lama da Barragem do Fundão, da mineradora Samarco, já ter chegado ao mar, no Espírito Santo, a população de municípios atingidos pelos rejeitos ao longo da Bacia do Rio Doce, em Minas, continua sofrendo restrições no abastecimento de água. O problema ocorre porque há impedimento da captação normal no curso d’água, que ainda apresenta níveis de metais fora do padrão de normalidade para consumo humano, ainda que com tratamento. De acordo com relatório de ontem do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), a situação piorou nos últimos dias, já que a chuva arrastou parte da lama estacionada às margens do rio e precipitou materiais depositados no leito. Nos municípios atingidos, persistem problemas de saúde como casos de diarreia e vômito, devido ao consumo de água de má qualidade.
Além de indicar as alterações nos índices de metais e outros elementos, a conclusão do Igam é a mesma em seus dois relatórios: “Não é possível prever quando as condições do Rio Doce retornarão à normalidade, devido às proporções do impacto causado pelo evento (passagem da lama) e a possibilidade de novos revolvimentos ocasionados por fatores externos”, diz o documento. O Igam informou que vai manter o monitoramento.
O relatório aponta problemas nos níveis de chumbo, manganês, ferro e alumínio. O mais grave, segundo o levantamento, é com relação ao primeiro elemento, que esteve fora de conformidade em todos os pontos do Rio Doce. “O chumbo é um problema gravíssimo, porque é cumulativo no organismo e pode causar doenças, a exemplo do saturnismo, enfermidade com sérias complicações”, explica o mestre em saneamento e meio ambiente e professor da PUC Minas José Magno Senra Fernandes. Com relação aos três demais índices, foi observado, no dia 20, que os valores estavam acima do limite de classe 2. Este parâmetro serve para indicar águas que podem ser destinadas, entre outras finalidades, ao abastecimento e consumo humano, após tratamento convencional.
Segundo o professor, há pesquisas em andamento que relacionam a presença de alumínio com o desenvolvimento do Alzheimer, doença degenerativa que pode levar à morte. A última análise do Igam mostrou oscilação nos parâmetros de turbidez, mudança associada à ocorrência de chuvas na região. Segundo o documento, os valores dos metais podem cair paulatinamente, com o passar dos dias.
DIARREIA Enquanto isso, a água transportada em caminhões-pipa e que chega às casas ainda não é considerada de boa qualidade. Por isso, moradores enfrentam longas filas para receber água mineral distribuída pela Samarco e que é usada para o consumo humano. A mineradora atende a uma decisão judicial, que a obriga a garantir o fornecimento de água potável à população nas cidades de Resplendor, Governador Valadares, Itueta, Belo Oriente, Aimorés, Tumiritinga, Periquito e Alpercata, além de Galileia.
De acordo com a secretária municipal de Saúde de Galileia, Meiremárcia Gonçalves Santos, 15 caminhões-pipa cedidos pela Samarco buscam água no município vizinho de Conselho Pena (60 quilômetros distância). A água chega às torneiras em sistema de rodízio, em alguns casos, de até três dias. É o caso da professora Neidiane Magalhães. “O jeito é economizar”, diz Neidiane. Mas, segundo ela, houve moradores que foram obrigados a comprar água, pagando R$ 50 por mil litros.
Também no Leste do estado, Periquito sofre com o problema do abastecimento. De acordo com a prefeitura, foram registrados pelo menos 15 casos de vômito, diarreia e alergia nos últimos dias.
Por meio de nota, a Samarco informou que todas as cidades da Bacia do Rio Doce já tiveram o fornecimento de água potável normalizado, seja por meio de manutenção em estações de tratamento de água desativadas mesmo antes do acidente, ou por contratação de caminhões-pipa e outras ações.