Se o rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, em 5 de novembro, é a maior tragédia socioambiental da história brasileira, a onda de doações vindas de todas as partes do país, que chega diariamente à cidade histórica também é impressionante. E a tendência é este movimento solidário aumentar ainda mais com a proximidade do Natal, deixando sem ação as autoridades do município encarregadas de administrar o imenso volume de objetos e alimentos doados. Segundo a Secretaria de Ação Social, já são seis galpões lotados até o teto de doações, sendo dois emprestados pela mineradora Samarco, incluindo o antigo ginásio da cidade e a Arena Mariana, com roupas de crianças e adultos, alimentos, itens de higiene e de limpeza, brinquedos e, principalmente, água mineral.
“Por favor, não doem mais roupas nem água”, implora João Paulo Paranhos, secretário municipal de Desenvolvimento, Ação Social e Cidadania, que adiou ser consagrado padre para assumir o cargo na área de direitos humanos da prefeitura local, exatamente no período da catástrofe. Ele manifesta preocupação com o fato de receber toda semana pelo menos três ligações de grandes empresas no país e até no exterior, que estão se mobilizando internamente para arrecadar donativos. “Só nesta última semana recebi telefonemas de dois grupos empresariais, além de comunicados de colégios e instituições religiosas que ficaram de enviar doações às populações atingidas pela lama”, explica.
Oficialmente, a entrega de doações está suspensa desde 14 de novembro. No entanto, basta aguardar meia hora em frente a um dos galpões de armazenamento, diante da prefeitura, para perceber o tamanho do coração dos brasileiros. “Ficamos sabendo que havia risco de perder a validade dos mantimentos e viemos ajudar a separar os materiais”, contam os mochileiros João, de 21 anos, e Lídia, de 19, que chegaram anteontem de Jundiaí (SP). Apenas ela tinha experiência anterior em trabalhos com moradores de rua em sua cidade de origem. O rapaz confessava a estreia como voluntário: “Ficava mais confortável no meu canto, mas acho que sempre existiu disposição para ajudar as pessoas”. Nenhum dos dois autorizou publicar nome ou foto: “Filantropia é algo que se faz sem anunciar”.
“Já estamos aceitando inscrições de creches e outras instituições cadastradas nos seus respectivos Cras, que queiram receber cestas básicas ou roupas”, afirmou João Paulo, que também firmou termo de ajustamento de conduta (TAC) com a Promotoria de Defesa de Direitos Humanos de Mariana, comprometendo-se a repassar as doações de maneira preliminar aos atingidos pela catástrofe. Segundo ele, as doações em dinheiro que estão sendo feitas nas contas proporcionadas pelo poder público, apesar da resistência da maioria das pessoas por medo de desvios, já atingem cerca de R$ 1 milhão. “Criamos uma comissão para discutir o que será feito com esse dinheiro. A primeira sugestão seria depositar os recursos em uma poupança a ser criada em nome de cada criança das comunidades atingidas”, diz.
EXCESSO DE ÁGUA MINERAL Em um único galpão de Mariana chama a atenção uma montanha de cerca de cinco metros de altura, com rolos de papel higiênico, esperando ser organizada. De altura semelhante, as pilhas de arroz e de feijão se destacam em meio ao restante, sendo suficientes para montar de 1,5 mil a 2 mil cestas básicas, segundo cálculos dos voluntários que ajudam a montar kits de doações, inclusive nos fins de semana. O volume de água mineral engarrafada em recipientes individuais ou galões é algo impossível de se mensurar a olho nu.
“Quando chegam carretas de água, dá vontade de sair correndo! Não tem mais onde colocar”, desabafa Alisson José dos Santos, um dos 40 voluntários que chegam diariamente dos mais variados estados se oferecendo para ajudar na logística dos materiais, distribuídos por meio de caminhões ou helicópteros para as comunidades atingidas de Paracatu de Baixo, Barra Longa e Camargos.
“Em Mariana mesmo, não precisamos de água, pois os atingidos pela lama estão morando em hotéis”, esclarece Santos. Ele explica que as cidades onde está faltando água potável são aquelas que eram abastecidas diretamente pelo Rio Doce, casos de Periquito, Galileia, Tumiritinga, Alpercata, Governador Valadares, Belo Oriente, Itueta e Colatina (ES). “Ai meu Deus, não te falei? Acaba de chegar outro caminhão de água!”, diz Alisson, mostrando a chegada da mercadoria. Segundo ele, quando recebe galões fechados é possível trocar por alimentos nas distribuidoras da cidade, mas a troca é inviável em se tratando de embalagens pequenas.
Segundo ele, há também muita gente que doa seu tempo e também auxilia na busca por mais alimentos, como, por exemplo, um músico de São Paulo, que pediu para não ser identificado. Ele permaneceu a semana inteira passada em Mariana trabalhando nos galpões. Ao notar a necessidade de alguns dos itens, como sabão em pó, o cantor acionava a rede de amigos, que enviava a quantidade necessária para completar a cesta. Assim foi feito também com biscoitos.
“Estou aqui desde o dia seguinte ao rompimento da barragem. É a sétima tragédia em que largo tudo o que faço e vou até o local para ajudar”, afirma o voluntário carioca Douglas Sant’Anna, de 31, que da última vez ajudou os desabrigados em Teresópolis, no Rio de Janeiro. Ele não pôde se deter por muito tempo na entrevista, pois precisava ajudar a descarregar mais um caminhão de água mineral que acabava de chegar. Na verdade, alguém tem de fazer o serviço pesado, além de responder pela logística dos seis galpões, com a separação e etiquetagem das roupas por tamanhos e tipo, tais como pijamas masculinos e blusas de frio femininas. “As pessoas sentem uma necessidade muito grande de doar itens materiais nas maiores tragédias, mas o gesto mais bonito que presenciei foi no tsunami do Japão, em 2011, quando o imperador japonês curvou-se diante das vítimas, conferindo a elas dignidade.”
“Por favor, não doem mais roupas nem água”, implora João Paulo Paranhos, secretário municipal de Desenvolvimento, Ação Social e Cidadania, que adiou ser consagrado padre para assumir o cargo na área de direitos humanos da prefeitura local, exatamente no período da catástrofe. Ele manifesta preocupação com o fato de receber toda semana pelo menos três ligações de grandes empresas no país e até no exterior, que estão se mobilizando internamente para arrecadar donativos. “Só nesta última semana recebi telefonemas de dois grupos empresariais, além de comunicados de colégios e instituições religiosas que ficaram de enviar doações às populações atingidas pela lama”, explica.
Oficialmente, a entrega de doações está suspensa desde 14 de novembro. No entanto, basta aguardar meia hora em frente a um dos galpões de armazenamento, diante da prefeitura, para perceber o tamanho do coração dos brasileiros. “Ficamos sabendo que havia risco de perder a validade dos mantimentos e viemos ajudar a separar os materiais”, contam os mochileiros João, de 21 anos, e Lídia, de 19, que chegaram anteontem de Jundiaí (SP). Apenas ela tinha experiência anterior em trabalhos com moradores de rua em sua cidade de origem. O rapaz confessava a estreia como voluntário: “Ficava mais confortável no meu canto, mas acho que sempre existiu disposição para ajudar as pessoas”. Nenhum dos dois autorizou publicar nome ou foto: “Filantropia é algo que se faz sem anunciar”.
“Já estamos aceitando inscrições de creches e outras instituições cadastradas nos seus respectivos Cras, que queiram receber cestas básicas ou roupas”, afirmou João Paulo, que também firmou termo de ajustamento de conduta (TAC) com a Promotoria de Defesa de Direitos Humanos de Mariana, comprometendo-se a repassar as doações de maneira preliminar aos atingidos pela catástrofe. Segundo ele, as doações em dinheiro que estão sendo feitas nas contas proporcionadas pelo poder público, apesar da resistência da maioria das pessoas por medo de desvios, já atingem cerca de R$ 1 milhão. “Criamos uma comissão para discutir o que será feito com esse dinheiro. A primeira sugestão seria depositar os recursos em uma poupança a ser criada em nome de cada criança das comunidades atingidas”, diz.
EXCESSO DE ÁGUA MINERAL Em um único galpão de Mariana chama a atenção uma montanha de cerca de cinco metros de altura, com rolos de papel higiênico, esperando ser organizada. De altura semelhante, as pilhas de arroz e de feijão se destacam em meio ao restante, sendo suficientes para montar de 1,5 mil a 2 mil cestas básicas, segundo cálculos dos voluntários que ajudam a montar kits de doações, inclusive nos fins de semana. O volume de água mineral engarrafada em recipientes individuais ou galões é algo impossível de se mensurar a olho nu.
“Quando chegam carretas de água, dá vontade de sair correndo! Não tem mais onde colocar”, desabafa Alisson José dos Santos, um dos 40 voluntários que chegam diariamente dos mais variados estados se oferecendo para ajudar na logística dos materiais, distribuídos por meio de caminhões ou helicópteros para as comunidades atingidas de Paracatu de Baixo, Barra Longa e Camargos.
“Em Mariana mesmo, não precisamos de água, pois os atingidos pela lama estão morando em hotéis”, esclarece Santos. Ele explica que as cidades onde está faltando água potável são aquelas que eram abastecidas diretamente pelo Rio Doce, casos de Periquito, Galileia, Tumiritinga, Alpercata, Governador Valadares, Belo Oriente, Itueta e Colatina (ES). “Ai meu Deus, não te falei? Acaba de chegar outro caminhão de água!”, diz Alisson, mostrando a chegada da mercadoria. Segundo ele, quando recebe galões fechados é possível trocar por alimentos nas distribuidoras da cidade, mas a troca é inviável em se tratando de embalagens pequenas.
Segundo ele, há também muita gente que doa seu tempo e também auxilia na busca por mais alimentos, como, por exemplo, um músico de São Paulo, que pediu para não ser identificado. Ele permaneceu a semana inteira passada em Mariana trabalhando nos galpões. Ao notar a necessidade de alguns dos itens, como sabão em pó, o cantor acionava a rede de amigos, que enviava a quantidade necessária para completar a cesta. Assim foi feito também com biscoitos.
“Estou aqui desde o dia seguinte ao rompimento da barragem. É a sétima tragédia em que largo tudo o que faço e vou até o local para ajudar”, afirma o voluntário carioca Douglas Sant’Anna, de 31, que da última vez ajudou os desabrigados em Teresópolis, no Rio de Janeiro. Ele não pôde se deter por muito tempo na entrevista, pois precisava ajudar a descarregar mais um caminhão de água mineral que acabava de chegar. Na verdade, alguém tem de fazer o serviço pesado, além de responder pela logística dos seis galpões, com a separação e etiquetagem das roupas por tamanhos e tipo, tais como pijamas masculinos e blusas de frio femininas. “As pessoas sentem uma necessidade muito grande de doar itens materiais nas maiores tragédias, mas o gesto mais bonito que presenciei foi no tsunami do Japão, em 2011, quando o imperador japonês curvou-se diante das vítimas, conferindo a elas dignidade.”