Está longe de terminar o sossego dos moradores da Bacia do Rio Doce, em Minas e no Espírito Santo, mergulhados há mais de um mês na dúvida: tem ou não tem metais pesados nessas águas após o rompimento da Barragem do Fundão, da mineradora Samarco? Diante da falta de clareza quanto à toxicidade e das análises conflitantes (na água e sedimentos) apresentadas pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e por um grupo de cientistas das universidades de Brasília (UnB) e Federal de São Carlos (UFscar), de São Paulo, especialistas acreditam que serão necessários muitos estudos, por longo tempo, para se chegar a uma conclusão. Precaução e investigação, indicam, são fundamentais no momento.
"Quando não há evidência da ausência de risco, deve-se agir como se houvesse risco", afirma o relator da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito humano à água e ao esgotamento sanitário, Leo Heller, também pesquisador do Centro René Rachou, em Belo Horizonte. Ao citar o "princípio da precaução", Heller destaca que, em primeiro lugar, é preciso pensar na saúde da população e minimizar de todas as formas os riscos sobre ela. De prático, acrescenta, não se deve interromper o abastecimento público, cuidando para que as pessoas não consumam água de baixa qualidade, como a proveniente de poços, as engarrafadas sem confiança na procedência e outras fontes.
Uma medida fundamental, segundo Heller, é intensificar o monitoramento permanente, inclusive da água tratada, fazer mais análises e ampliar o conjunto de informações para se ter uma visão mais clara da situação. E informa que a ingestão de metais pesados, como cádmio, chumbo e manganês, entre outros, pode causar intoxicação, no estado agudo, e acúmulo no organismo, no estado crônico. “O sistema de vigilância deve ficar atento aos sintomas da população, pois, havendo qualquer alteração, é preciso acender a luz amarela”, diz o relator da ONU. A divergência dos resultados das análises pode decorrer, na sua avaliação, das técnicas usadas, locais de coleta e outros fatores.
Para o geólogo Adilson do Lago Leite, professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), a questão e a resposta não são simples, sendo necessárias pesquisas, coletas, enfim, muito trabalho pela frente. Ele explica que o rejeito de minério de ferro é inerte, não perigoso, e não causaria uma “lama tóxica” no leito do Rio Doce. “Esse curso d’água está poluído há muito tempo, tem garimpos abandonados, enfim, se encontra muito comprometido, conforme mostram pesquisas feitas pela Ufop e outras instituições. Uma possibilidade seria o acondicionamento de outros produtos na barragem da Samarco, o que demandaria investigação, pois não há indícios de que isso tenha ocorrido. Não se pode afirmar nada, a não ser com apuração”, pondera o professor. A respeito dos resultados conflitantes das instituições, o geólogo também acha que pode haver divergências nas metodologias, nos locais de coleta ao longo do rio e outros fatores que interferem no resultado.
O Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) fez análise das águas e sedimentos, depois do estouro da barragem, com pontos de coleta em afluentes como o Gualaxo do Norte e no Rio Doce, no distrito de Paracatu, em Mariana, e nas cidades de Rio Doce e Barra Longa, ambas na Zona da Mata. Os resultados apontaram a presença de metais pesados nos sedimentos, e não nas águas. Segundo o coordenador do Projeto Manuelzão/UFMG, médico Marcus Vinícius Polignano, a questão é se esses elementos químicos vão se desprender e se tornar solúveis, sendo, portanto, carreados pelas águas. “Os estudos tentarão desvendar se haverá comprometimento da bacia por metais pesados”, afirma o médico.
Análises são conflitantes
Os últimos dados levantados pelo CPRM, divulgados na segunda-feira e publicados pelo Estado de Minas, demonstram elevação nos níveis de metais na água nos oito pontos de monitoramento localizados em cidades mineiras onde foi possível fazer uma comparação com registros de 2010. No entanto, nos dois pontos situados em municípios do Espírito Santo, foram encontradas variações para cima e para baixo na concentração para diferentes metais. Segundo o CPRM, as análises são feitas desde 6 de novembro, sendo o monitoramento da qualidade da água realizado a cada dois dias e o dos sedimentos, a cada quatro.
Já análises realizadas por um grupo de cientistas da UnB e da UFscar, de São Paulo, em amostras de água e sedimentos coletados em 10 pontos ao longo do Rio Doce e afluentes, indicaram a presença de metais pesados acima dos limites admitidos pela Resolução 357 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) em alguns locais, inclusive em água coletada para abastecimento humano. Esses pesquisadores formam o Grupo Independente de Análise de Impacto Ambiental (Giaia), que avalia os problemas causados pelo rompimento da Barragem do Fundão. A coleta foi feita entre os dias 4 e 8 deste mês.
Além das áreas afetadas pelo desastre, o contágio foi detectado em níveis superiores ao indicado pela legislação nacional em pontos acima daqueles a que os resíduos de mineração contidos na barragem chegaram e na água captada em Governador Valadares, na Região Leste. O valor encontrado em cada litro, de 0,04mg, é quatro vezes maior que o tolerável. O máximo permitido é de 0,01mg/l, de acordo com os critérios de potabilidade estabelecidos na Portaria 2.914, do Ministério da Saúde.
SEM DANOS Em nota, a Samarco informa que ,“proveniente do processo de beneficiamento do minério de ferro, o rejeito é composto basicamente de água, partículas de óxidos de ferro e sílica (ou quartzo) e não apresenta nenhum elemento químico que seja danoso à saúde. É classificado como material inerte e não perigoso, conforme norma brasileira de código NBR 10004-04, o que significa que não apresenta riscos à saúde pública e ao meio ambiente”.
A mineradora esclarece ainda que “laudos do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e de empresa especializada SGS Geosol atestaram que os rejeitos não oferecem riscos à saúde humana e ao meio ambiente. Análises dos sedimentos do Rio Doce e do rejeito proveniente da Barragem do Fundão, operada pela Samarco, mostram que em nenhum dos materiais há aumento da presença de metais que poderiam contaminar a água”.
"Quando não há evidência da ausência de risco, deve-se agir como se houvesse risco", afirma o relator da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito humano à água e ao esgotamento sanitário, Leo Heller, também pesquisador do Centro René Rachou, em Belo Horizonte. Ao citar o "princípio da precaução", Heller destaca que, em primeiro lugar, é preciso pensar na saúde da população e minimizar de todas as formas os riscos sobre ela. De prático, acrescenta, não se deve interromper o abastecimento público, cuidando para que as pessoas não consumam água de baixa qualidade, como a proveniente de poços, as engarrafadas sem confiança na procedência e outras fontes.
Uma medida fundamental, segundo Heller, é intensificar o monitoramento permanente, inclusive da água tratada, fazer mais análises e ampliar o conjunto de informações para se ter uma visão mais clara da situação. E informa que a ingestão de metais pesados, como cádmio, chumbo e manganês, entre outros, pode causar intoxicação, no estado agudo, e acúmulo no organismo, no estado crônico. “O sistema de vigilância deve ficar atento aos sintomas da população, pois, havendo qualquer alteração, é preciso acender a luz amarela”, diz o relator da ONU. A divergência dos resultados das análises pode decorrer, na sua avaliação, das técnicas usadas, locais de coleta e outros fatores.
Para o geólogo Adilson do Lago Leite, professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), a questão e a resposta não são simples, sendo necessárias pesquisas, coletas, enfim, muito trabalho pela frente. Ele explica que o rejeito de minério de ferro é inerte, não perigoso, e não causaria uma “lama tóxica” no leito do Rio Doce. “Esse curso d’água está poluído há muito tempo, tem garimpos abandonados, enfim, se encontra muito comprometido, conforme mostram pesquisas feitas pela Ufop e outras instituições. Uma possibilidade seria o acondicionamento de outros produtos na barragem da Samarco, o que demandaria investigação, pois não há indícios de que isso tenha ocorrido. Não se pode afirmar nada, a não ser com apuração”, pondera o professor. A respeito dos resultados conflitantes das instituições, o geólogo também acha que pode haver divergências nas metodologias, nos locais de coleta ao longo do rio e outros fatores que interferem no resultado.
O Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) fez análise das águas e sedimentos, depois do estouro da barragem, com pontos de coleta em afluentes como o Gualaxo do Norte e no Rio Doce, no distrito de Paracatu, em Mariana, e nas cidades de Rio Doce e Barra Longa, ambas na Zona da Mata. Os resultados apontaram a presença de metais pesados nos sedimentos, e não nas águas. Segundo o coordenador do Projeto Manuelzão/UFMG, médico Marcus Vinícius Polignano, a questão é se esses elementos químicos vão se desprender e se tornar solúveis, sendo, portanto, carreados pelas águas. “Os estudos tentarão desvendar se haverá comprometimento da bacia por metais pesados”, afirma o médico.
Análises são conflitantes
Os últimos dados levantados pelo CPRM, divulgados na segunda-feira e publicados pelo Estado de Minas, demonstram elevação nos níveis de metais na água nos oito pontos de monitoramento localizados em cidades mineiras onde foi possível fazer uma comparação com registros de 2010. No entanto, nos dois pontos situados em municípios do Espírito Santo, foram encontradas variações para cima e para baixo na concentração para diferentes metais. Segundo o CPRM, as análises são feitas desde 6 de novembro, sendo o monitoramento da qualidade da água realizado a cada dois dias e o dos sedimentos, a cada quatro.
Já análises realizadas por um grupo de cientistas da UnB e da UFscar, de São Paulo, em amostras de água e sedimentos coletados em 10 pontos ao longo do Rio Doce e afluentes, indicaram a presença de metais pesados acima dos limites admitidos pela Resolução 357 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) em alguns locais, inclusive em água coletada para abastecimento humano. Esses pesquisadores formam o Grupo Independente de Análise de Impacto Ambiental (Giaia), que avalia os problemas causados pelo rompimento da Barragem do Fundão. A coleta foi feita entre os dias 4 e 8 deste mês.
Além das áreas afetadas pelo desastre, o contágio foi detectado em níveis superiores ao indicado pela legislação nacional em pontos acima daqueles a que os resíduos de mineração contidos na barragem chegaram e na água captada em Governador Valadares, na Região Leste. O valor encontrado em cada litro, de 0,04mg, é quatro vezes maior que o tolerável. O máximo permitido é de 0,01mg/l, de acordo com os critérios de potabilidade estabelecidos na Portaria 2.914, do Ministério da Saúde.
SEM DANOS Em nota, a Samarco informa que ,“proveniente do processo de beneficiamento do minério de ferro, o rejeito é composto basicamente de água, partículas de óxidos de ferro e sílica (ou quartzo) e não apresenta nenhum elemento químico que seja danoso à saúde. É classificado como material inerte e não perigoso, conforme norma brasileira de código NBR 10004-04, o que significa que não apresenta riscos à saúde pública e ao meio ambiente”.
A mineradora esclarece ainda que “laudos do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e de empresa especializada SGS Geosol atestaram que os rejeitos não oferecem riscos à saúde humana e ao meio ambiente. Análises dos sedimentos do Rio Doce e do rejeito proveniente da Barragem do Fundão, operada pela Samarco, mostram que em nenhum dos materiais há aumento da presença de metais que poderiam contaminar a água”.