Jornal Estado de Minas

Ano termina com batalha contra Aedes aegypti, que agora carrega o zika vírus

Veículo abandonado na Região Leste é preocupação extra para moradores - Foto: Euler Júnior/EM/DA Press
Belo Horizonte fecha o ano de 2015 travando uma guerra contra um antigo adversário – o mosquito Aedes aegypti. Mas, como se já não bastasse o fato de os casos de dengue terem mais do que quintuplicado em relação ao ano passado, saltando de 3.307 para 15.645, a cidade se vê diante de uma nova ameaça: a circulação do zika vírus, que é transmitido pelo mesmo mosquito e já é realidade no Nordeste do país. A relação do agente infeccioso com a microcefalia – que é a diminuição do perímetro cranioencefálico dos bebês – e com a síndrome de Guillain-Barré, que leva à paralisia dos músculos, já foi confirmada pelo Ministério da Saúde. A situação levou a União a determinar vistorias em 100% dos imóveis do país para eliminar criatórios do inseto. Em BH, o risco de epidemias culminou na decretação de estado de emergência para a infestação do mosquito. Um grupo formado por vários setores da administração municipal pretende varrer as áreas mais sensíveis da cidade, para evitar que surtos como o de microcefalia no Nordeste cheguem à capital mineira. Porém, apesar da mobilização, o trabalho será árduo, já que até mesmo prédios públicos sofrem com pontos de acúmulo de água, condição fundamental para a reprodução do transmissor.


Isso ocorre até em pontos nobres da cidade, como a Praça da Liberdade. Apesar da bela vista que tem do  complexo, uma coisa preocupa a arquiteta Cláudia Ramos Claro, de 58 anos, quando olha de uma das janelas de seu apartamento no prédio da esquina da Avenida João Pinheiro.
Dali é possível ver as poças de água de chuva na lage do antigo prédio do Ipsemg, cedido para futuras instalações da Uemg. “Algumas janelas estão abertas, não dá para ver como está lá dentro, mas posso imaginar. Já denunciei para a prefeitura, eles dizem que vão olhar, mas nunca fazem nada”, afirma Cláudia, acrescentando que a obra está parada. “Fico preocupada, principalmente porque o prédio fica ao lado de uma praça que várias crianças e idosos frequentam”, explica. A arquiteta conta que fez a primeira reclamação no ano passado. Depois das chuvas, segundo Cláudia, a água chega a ficar acumulada por dias.

ABANDONO
Na Região Leste da cidade, a Estação José Cândido da Silveira, localizada no Bairro Santa Inês, é uma importante porta de entrada de pessoas que vêm da Região Nordeste do país, onde se concentra a maior incidência da microcefalia. Apesar de ser um ponto sensível, a aproximadamente um quilômetro da estação há potencial foco do mosquito.
Trata-se de um veículo abandonado há mais de seis meses na Praça Coronel Assis Duarte. Com vidros quebrados, sem algumas portas e rodas, o veículo chama a atenção dos moradores, que temem que, com a chegada das chuvas, ele se torne mais um criadouro do Aedes aegypti. “Como o antigo dono da casa foi para os Estados Unidos e não tirou o carro, o novo morador o deixou aí”, relata Frederico dos Santos Vieira, dono de uma padaria localizada na mesma praça.

A pouco mais de dois quilômetros da estação, no cruzamento entre a avenida Itaituba e a Rua Pirassununga, um terreno baldio se transformou em um grande bota-fora de lixo e entulho. Lá é possível ver sofás e todo tipo de móveis, assim como pneus, baldes e vasilhas que acumulam água da chuva. Isso sem contar os próprios buracos do terreno, que também formam poças. Em frente a esse local está a Escola Municipal Padre Francisco Carvalho Moreira, cujos alunos ficam expostos às doenças transmitidas pelo mosquito.

Estado investiga doença paralisante

Depois do alerta disparado pelo surto de microcefalia no Nordeste e sua relação com o zika vírus, outra enfermidade que também tem relação comprovada com o zika fez pelo menos uma vítima em Minas Gerais. Um jovem de 16 anos foi diagnosticado com a síndrome de Guillain-Barré, problema neurológico que leva à paralisia dos músculos e pode até matar. O caso, ocorrido em Pedra Bonita, na Zona da Mata mineira, ainda não foi oficialmente notificado, segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES), apesar de a Gerência Regional de Saúde de Manhumirim (Zona da Mata) ter sido comunicada pela Casa de Caridade de Carangola, onde o adolescente foi atendido, para solicitar a medicação de alto custo.

A enfermidade representa mais uma ameaça atribuída ao mosquito Aedes aegypti por meio da transmissão do zika vírus, que em 2015 atormentou as autoridades de saúde de todo o país e também de Minas Gerais.
Apesar de não ter sido notificada, a SES garante que é necessário investigar esse tipo de diagnóstico, justamente para saber se existe associação com o micro-organismo. O jovem deu entrada na Casa de Caridade de Carangola em 18 de dezembro e relatou que teve paralisia nas pernas, que irradiou para o quadril, braços e pescoço. Porém, com a administração da medicação indicada, ele conseguiu recuperar os movimentos e passa bem.


Força especial contra o vetor


Na luta contra o Aedes aegypti, este mês foi marcado pela decretação de estado de emergência em Belo Horizonte devido à infestação do mosquito. A Prefeitura de BH teme que o inseto possa causar uma epidemia de dengue e de zika vírus. Entre as linhas de combate traçadas pelo grupo criado pela administração municipal e coordenado pela Defesa Civil está a parceria com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para convocar proprietários de casas fechadas e de lotes vagos que não forem limpos. A intenção é trabalhar com três pilares nos próximos seis meses, data de vigência do decreto de emergência: comunicação, mobilização e ampliação da força operacional.

Na vertente da comunicação, o objetivo é usar painéis de trânsito, visores do Move, o telefone 156 da prefeitura e faixas de pano nos bairros com maior infestação do mosquito da dengue, chikungunya e zika para veicular a necessidade de eliminação dos criatórios. No pilar da mobilização, a intenção é agregar as lideranças religiosas e entidades de classe para disseminar as informações necessárias ao combate do Aedes aegypti. Por fim, a capacidade operacional será ampliada. Agentes de saúde que vistoriam as casas ganham a companhia de funcionários da Defesa Civil e guardas municipais. A Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) vai aumentar o número de veículos e trabalhadores nas ações de limpeza.

A Secretaria Municipal de Saúde da capital mineira destaca que em 2015 foram mais de 4 milhões de visitas domiciliares feitas pelos agentes de combate a endemias até o mês de novembro, 173 mutirões de limpeza até 23 de dezembro e 286 ações de mobilização das comunidades.


Já a Secretaria de Estado de Saúde afirma que em 2015 revisou as diretrizes para o enfrentamento de dengue, chikungunya e zika e fez seminários em todas as unidades regionais de saúde, orientando os municípios sobre como se preparar para o período de infestação. Houve repasse de R$ 36 milhões para ações de controle do vetor e em novembro foi lançada a campanha “10 minutos contra a dengue”, que convida cada cidadão a tirar 10 minutos por semana para vistoriar a própria casa em busca de criatórios do mosquito. A estimativa da prefeitura dá conta de que 86% dos criatórios na capital estão dentro das residências.

VISTORIAS
Sobre as situações levantadas pela reportagem nas ruas da capital, a Secretaria Municipal de Saúde informou que a retirada das carcaças de veículos das ruas da cidade está prevista em lei e envolve atuação da SLU. Quando necessário, é feito o tratamento contra o vetor da dengue, chikungunya e zika, com aplicação de biolarvicida. Sobre o terreno localizado na esquina da Avenida Itaituba com a Rua Pirassununga, o local é considerado um ponto estratégico. É vistoriado de 15 em 15 dias e tratado conforme a demanda. A secretaria está estudando ações para diminuir ou solucionar os problemas do local.

Por fim, o prédio do Ipsemg está sendo reformado e, segundo a pasta, é vistoriado frequentemente para identificar focos do mosquito. O local chegou a ser considerado ponto estratégico durante alguns meses, até que todas as solicitações de controle ambiental fossem atendidas. Neste mês foram três vistorias, atendendo a pedidos pelo telefone 156 (GP).

Prontuário

Os números das ameaças que voam com o Aedes


Casos de dengue confirmados em Minas


2014
49.360

2015
147.657 (até 21/12) %2b199%

Casos de dengue confirmados em BH


2014
3.307

2015
15.645
(até 21/12) %2b373%

Casos de microcefalia notificados que podem ter relação com zika vírus no Brasil *
2.782

Casos de microcefalia notificados que podem ter relação com zika vírus em Minas
52

Casos de microcefalia notificados que podem ter relação com zika vírus em BH
13

*As notificações de microcefalia começaram a ser obrigatórias a partir de 11 de novembro, segundo portaria do Ministério da Saúde, devido à circulação do zika vírus no Nordeste e ao surto da malformação cranioencefálica

Fonte: Ministério da Saúde, Secretaria de Estado de Saúde e Secretaria Municipal de Saúde

.