PBH revê plano contra poluição na Pampulha

Prefeitura desiste de instalar jardins filtrantes em córregos e aposta no cumprimento de metas da Copasa para despoluir 95% da lagoa

Guilherme Paranaiba
Líder comunitário do Bairro Vila Pérola, em Contagem, Renato Gherardi mostra esgoto lançado em córrego que chega à lagoa à espera de saneamento. - Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press
A ideia de tentar diminuir a quantidade de poluição que chega à Lagoa da Pampulha pelos oito córregos afluentes da represa usando plantas para segurar a matéria orgânica está descartada pela Prefeitura de Belo Horizonte. A tecnologia, que foi batizada de jardins filtrantes pela Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), não será implantada porque a prefeitura confia nos compromissos firmados pela Copasa de que, em junho e dezembro, a companhia de saneamento alcançará uma cobertura de 90% e 95%, respectivamente, de esgoto canalizado na área de drenagem da bacia da lagoa, que atinge a capital e Contagem, na Grande BH. Atualmente, um total de 88% do esgoto que chega ao cartão-postal que concorre ao título de patrimônio mundial da humanidade já é coletado e tratado. Outro fator que levou a administração municipal a desistir da ideia, anunciada pelo próprio prefeito Marcio Lacerda em fevereiro do ano passado, foi a contratação dos serviços de recuperação química da qualidade da água da represa, com previsão de início no mês que vem e investimento público de R$ 30 milhões. Essa era a oitava intervenção prevista desde a década de 1970 para despoluir a lagoa.

“A Sudecap entende como mais adequado que se aguarde os resultados que serão alcançados tanto pelas ações da Copasa quanto pelos serviços de recuperação da qualidade da água da lagoa, a partir do entendimento de que ambas se configuram como aquelas necessárias e suficientes para o atingimento das metas pretendidas”, diz texto encaminhado pela assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura de Belo Horizonte. A intenção da prefeitura era iniciar com uma estação piloto no Córrego D’Água Funda/Bom Jesus. O modelo custaria R$ 6 milhões e seria estendido aos outros sete córregos que desembocam na represa. Em julho, Marcio Lacerda chegou a afirmar que as estações seriam viabilizadas em mais de um córrego antes da conclusão das obras de canalização do esgoto feitas pela Copasa.
A empresa estatal enfrentou diversos problemas de desapropriações para viabilizar as intervenções, o que atrasou os trabalhos e jogou as novas iniciativas para junho deste ano (90% do esgoto canalizado) e dezembro (95%).

Na Vila da Lua, Copasa faz intervenção para evitar poluição de curso d'água - Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A PressEnquanto isso, moradores da Vila Pérola, em Contagem, na Grande BH, continuam convivendo com o lançamento de esgoto a céu aberto em cursos d’água que chegam até a lagoa. O bairro é um dos que está incluído na previsão da Copasa para alcançar a marca prevista de 100 quilômetros de redes coletoras e interceptoras implantadas na atual licitação de obras em vigência. O presidente da Associação Comunitária dos Moradores da Vila Pérola (ACMVP), Renato Gherardi, mostra o córrego que passa pela região e recebe lixo e esgoto espremido em uma viela no meio de casas. “O grande problema é que ele fica muito fechado, praticamente escondido. Se fosse aberto no meio da rua, algum órgão público já teria resolvido esse tormento, que contribui para o mau cheiro e proliferação de ratos e baratas”, critica o líder comunitário.

O engenheiro Tonimar Oliveira, de 40 anos, mora na Rua Iguaçaba, na mesma Vila Pérola, e ainda guarda uma carta que recebeu de uma empreiteira contratada pela Copasa no ano passado avisando da necessidade de desapropriação de uma parte do terreno para a passagem da rede de esgoto, o que ainda não ocorreu. “Essa situação é muito triste, principalmente porque esse córrego é formado em uma nascente bem perto daqui, com água totalmente limpa. Esse recurso já era para estar separado do esgoto e revertido para o bem da população”, afirma.

Ligações Se em alguns lugares o drama da falta de saneamento persiste, em outros, as intervenções da Copasa vão dando um alento à população. Ontem, a reportagem flagrou trabalhadores fazendo ligações na Rua C, na Vila Lua Nova da Pampulha, também em Contagem. Morando há um ano em uma residência nessa rua, a dona de casa Laurentina Botelho, de 58, não aguentava mais o mau cheiro que o despejo irregular de esgoto causa na região. “Eu cuido diariamente da minha sobrinha e fico preocupada também por causa dela, que tem só um aninho. Aqui em casa já está tudo pronto, falta só ligar”, disse ela, enquanto aguardava os técnicos concluírem o serviço em uma casa antes de passar para a dela.

O biólogo e especialista em recursos hídricos Rafael Resck reconhece que a recuperação química das águas da lagoa, prevista para começar em fevereiro, é uma medida importante para acelerar um processo que poderia durar anos. Porém, ele adverte que o ideal seria começar o serviço com a interrupção brusca do esgoto que ainda entra todos os dias na lagoa. “Não adianta limpar a água da Pampulha com o tanto de esgoto que chega.
É imprescindível que a fonte de material orgânico e de nutrientes seja minimizada radicalmente. Por ser um reservatório, a depuração desses resíduos é bem mais lenta na Pampulha”, afirma.

A Copasa sustenta que investiu R$ 102 milhões para garantir a implantação de 100 quilômetros de redes coletoras e interceptoras, além de nove estações elevatórias de esgoto na Bacia da Pampulha em BH e Contagem. Porém, para viabilizar todas essas obras, foi necessário desapropriar 17 áreas, cujos processos judiciais se arrastaram por um ano e meio, atrapalhando o prazo inicial de conclusão antes da Copa do Mundo. O segundo percalço enfrentado foi a desistência da empresa contratada para terminar essas obras, previstas para o mês passado, o que jogou para junho a conclusão dos 100 quilômetros de rede, que vão significar 90% do esgoto captado.

A terceira situação que dificulta o trabalho da companhia de saneamento é a expansão geográfica na área da bacia, o que levou a empresa a licitar uma segunda etapa de obra, para mais 13,4 quilômetros de redes, ao custo de 14 R$ milhões e o suficiente para captar os resíduos de mais 10 mil imóveis. A previsão de conclusão dessa parte é dezembro de 2016, chegando a 95% do esgoto que vai para a lagoa devidamente captado e levado até a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Onça. A Sudecap garante que a realização das obras de captação de esgoto até dezembro não vai atrasar a recuperação da qualidade da água da lagoa.

BALANÇO DE INTERVENÇÕES

Veja alguns planos postos em prática e outros que não saíram do papel para tentar despoluir a Pampulha

AGUAPÉS 1
Em meados da década de 1970 a lagoa foi invadida pelos aguapés. Segundo moradores mais antigos, a planta foi introduzida para tentar “limpar” o reservatório, que recebia grande quantidade de esgoto.

AGUAPÉS 2
Tentativa de solução, os aguapés viraram novo problema. Na década de 1990 começam as ações para retirar as plantas, que se tornaram problema crônico e cobriam grande parte do espelho d’água.

BARCO
No início de 2000, com a queda da oxigenação na água, foram usados barcos de forma emergencial, com algum efeito positivo. Ao girar, a hélice da embarcação misturava ar e água, permitindo introdução do oxigênio.

REDES COLETORAS
Também no ano de 2000, a Copasa dá início à construção das redes coletoras de esgoto e interceptação das ligações clandestinas.
Trata-se de um novo tempo na trajetória do reservatório. A intervenção segue em curso atualmente e a previsão é que em dezembro de 2016 a Copasa chegue a 95% do esgoto interceptado.

FLOATFLUX
Em 2004, um sistema chamado floatflux entra em operação nos córregos Ressaca e Sarandi, para retirar 80% de matéria orgânica e 90% de fósforo – nutriente que propicia o crescimento de algas.

DRAGAGEM

Em 2013/2014 é feita dragagem para retirar sedimentos da lagoa. No total, foram 800 mil metros cúbicos de material.

RECUPERAÇÃO DA QUALIDADE DA ÁGUA
A licitação dos Serviços de Recuperação da Qualidade da Água da Lagoa da Pampulha chegou a ser suspensa por decisão da Prefeitura de BH, até que estivessem integralmente implementadas as ações de coleta e interceptação de esgotos na Bacia da Pampulha. O certame foi retomado, mas suspenso novamente por determinação do Tribunal de Contas do Estado (TCE). A prefeitura conseguiu reverter a decisão na Justiça. A previsão de início dos trabalhos, com duração de 22 meses, é fevereiro deste ano.

JARDINS FILTRANTES

Anunciada em fevereiro de 2015, a intervenção prometia usar plantas para segurar a matéria orgânica que entra na lagoa pelos oito córregos afluentes. Não saiu do papel e foi descartada, com aposta na soma das redes coletoras com a recuperação da qualidade da água.

Caçada ao esgosto

A Copasa mantém um programa denominado Caça-Esgoto, para identificar lançamentos indevidos e chegar a 100% dos resíduos coletados na Bacia da Pampulha. “Esse programa tem detectado lançamentos de esgoto que, para serem corrigidos, exigem melhorias na urbanização. Portanto, qualquer ação para aumentar o percentual do esgoto coletado terá que passar por ações conjuntas com Contagem e Belo Horizonte”, afirma a empresa em nota..