O barro nas galochas da faxineira Marilde Aparecida Isaias Severino, de 45 anos, mostra o calvário que ela enfrentou ontem para chegar em casa no Bairro Castanheiras, em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). No caminho, muita lama, pedaços de muros, troncos de árvores, ferros retorcidos. “Aqui está parecendo Mariana”, diz, em referência à lama que cobriu o subdistrito de Bento Rodrigues e parte de Paracatu de Baixo, no município da Região Central de Minas. Sabará foi o primeiro município mineiro a decretar estado de emergência pelos estragos da chuva, mas o temporal também traz transtornos aos moradores da capital mineira.
Em Sabará, a casa de Marilde é uma das dezenas ameaçadas no Bairro Castanheiras. Aconselhada pela Defesa Civil a deixar a residência onde vive com os filhos, sem ter aonde ir, a faxineira resistia. “Deixei a casa por horas e já veio alguém pegar nossas coisas. À noite, tinha gente tentando roubar as galinhas que meu marido cria.” De acordo com a Defesa Civil, já são 300 desalojados e desabrigados no município e esse número tende a crescer.
A cada hora, ela vê parte do terreiro deslizar em direção à casa do cunhado, localizada pouco abaixo no mesmo lote. Não há sequer vestígios da rua que antes dava acesso à sua residência.
Ontem, técnicos da prefeitura de Sabará levantaram o perfil dos desabrigados para receber o auxílio-moradia, um salário-mínimo para pagar o aluguel no período de um ano. Os afetados serão orientados a procurar terreno para reconstruir a casa. “A família providencia o terreno e, depois, a prefeitura ajuda a construir.” Das oito regionais do município, cinco enfrentam problemas em decorrência da chuva. “Por enquanto, a situação está sob controle, mas a chuva intensa causa muito dano”, informou o secretário de Defesa Civil, tenente Marcelo Queiroz.
A situação que preocupa os moradores em Sabará também coloca em alerta autoridades em Belo Horizonte. Dezenas de famílias no Taquaril e Vera Cruz, na Região Leste, e no Bairro Maria Goretti, na Região Nordeste, veem a chuva prolongada como ameaça. A faxineira Arilze de Jesus Felipe Braz, de 60, teme que a casa onde vive, há 55 anos, na rua Expedicionário Inocêncio Rosa, não resista às chuvas.
Depois da averiguação feita pela prefeitura, ela esperava ajuda para a construção de um muro de contenção. No entanto, disse ter sido informada que há 160 pessoas na sua frente. “Eu não sei como a minha casa ainda está de pé. Essa noite não dormi.” Mesmo com a constatação, ela não quer se mudar. “A Defesa Civil me pediu para sair várias vezes, mas para onde eu vou? Onde posso colocar meu irmão deficiente?”, questiona.
No Taquaril, muitos moradores tiveram que pegar a enxada para retirar o barro que tomou as casas. O comerciante Alexandro Bruno Lopes, de 32, foi um dos que recebeu a visita da Defesa Civil.
Em todo período chuvoso, a região do Taquaril é uma das mais afetadas pelas águas. “O Taquaril é uma área que tem risco geológico que, neste período chuvoso, é agravado pela saturação do solo. É uma região que tem muita presença de filito, um tipo de rocha que não é muito estável”, afirmou o vistoriador da Defesa Civil, Cleomar Silva. O risco é agravado pela topografia e as construções na encosta. “Nessas regiões, fazemos um monitoramento constante”, disse, sem detalhar a periodicidade da vistoria..