Um post publicado no Facebook por uma candidata a uma vaga no curso de Letras da UFMG é atualmente pivô de grande repercussão nas redes sociais.
B.T., que tentou ocupar um dos 260 assentos da graduação, não foi admitida na Universidade - e, num desabafo, atribuiu o resultado ao sistema de cotas adotado pela Universidade, que, em obediência à Lei nº 12.711/12, guarda 50% de suas matrículas a estudantes de escolas públicas. Deste montante, um percentual é destinado ainda a candidados autodeclarados pretos, pardos ou indígenas.
“Para o curso de Letras da UFMG há 260 vagas, fiquei na posição 239, mas não vou conseguir entrar por quê? Por causa dessa m* de cota”, vociferou a jovem.”
A polêmica tomou ainda mais corpo quando Lorena Cristina de Oliveira Barbosa, de 20 anos aprovada no processo seletivo dentro da modalidade de reserva que considera a etnia e renda dos concorrentes - respondeu a publicação. “Pode ter certeza de que farei jus à minha 15ª colocação nesse curso. Vou ser uma aluna excelente e uma ótima profissional que, futuramente, vai roubar seu emprego também”, escreveu a moça que, mais tarde, fez ainda outro post sobre o assunto.
“Desculpem-me por não aceitar nenhum filho de burguês apontando o dedo para mim e dizendo que sua não aprovação foi culpa minha. Não foi. A universidade pública deveria atender muito mais pessoas como eu. Teoricamente, ela nasceu para isso. Eu ocupo este lugar agora. E ele será tão meu quanto de vocês”, extravasou
Antes de tudo, obrigado a todos que me mandaram mensagens de carinho e apoio. Juro que responderei cada um quando...
Publicado por Lorena Morena em Quarta, 20 de janeiro de 2016
Procurada pela reportagem, B.T não se manifestou sobre o caso e apagou a publicação feita nesta manhã. Em outras postagens públicas de perfil, entretanto, constam diversas manifestações de usuários da rede de Zuckerberg. Algumas corroboram a revolta da estudante. A maioria, contudo, é de apoio à Lorena que comemora a vitória: “Fiquei muito feliz. Uma chama de esperança começou a nascer”, diz a belo-horizontina.
DIFÍCIL TRAJETÓRIA Aprovada com 920 pontos na redação, Lorena estava pessimista quanto ao resultado da seleção. Eu não esperava a aprovação do Enemestava me sentindo perdida”, revela a universitária. Postura compreensível para quem a ouve falar sobre a hostilidade que o ambiente escolar tantas vezes impôs a ela.“Na escola, uma professora de matemática gritou na minha turma que eu seria empregada doméstica para limpar o chão das filhas dela”, conta.
Após a conclusão do Ensino Médio, chegou a ingressar como bolsista numa escola particular de jornalismo, onde permaneceu por um ano e meio. Desistiu da instituição e do ofício - segundo ela por não suportar o ambiente racista tanto tanto da academia, quanto do mercado de trabalho.
“Meus professores viviam me mandando mensagens com convites para sair. Nos estágios, já fui demitida sob justificativa de ser negra demais para a comunicação. Me disseram isso abertamente. O meu ex chefe dizia que se eu quisesse ter sucesso, era só usar a minha sexualidade negra para transar com todos os empresários”, diz.
Após quatro meses de cursinho - frequentado após jornada diária de 8 horas de trabalho para ajudar a família como pagamento das mensalidades - tornou-se,oficialmente, aluna da Faculdade de Letras da UFMG. “Trabalhava o dia inteiro e ia direto para o cursinho. Voltava para casa beirando meia-noite e meia. Mas eu sempre fui muito boa com redação e uma amiga se dispôs a me ajudar aos finais de semana, E assim eu fazia. Assistia aulas online, estudava de madrugada.”, demonstrando ainda a consternação com que recebeu o post da concorrente B.T.
“Eu vim de uma família negra que sempre seguiu a mesma história de serviçais. Eu nunca tive nada, sabe? Ralei muito para entrar na UFMG. A minha escola não tinha nem estrutura para comportar alunos. Por isso não acho justo uma pessoa que sempre teve tudo apontar isso como privilégio. Acota é o mínimo que o governo me deve por ter me feito passar por tudo isso só por ser preta e pobre. Aquela faculdade é minha também e eu tenho o direito de estar nela”