Chuva faz bairro de Juatuba virar ilha

Ribeirão transborda e obriga 70 pessoas a deixarem suas casas em Juatuba, na RMBH. Bombeiros tiveram que usar cordas, boias e até helicóptero para resgatar moradores

Guilherme Paranaiba
A água, que subiu por volta das 4h, ainda era alta na tarde de ontem, transformando ruas de Juatuba em verdadeiros córregos - Foto: Edésio Ferreira/EM/DA Press

"A água veio de uma vez, foi uma coisa meio assustadora. O que mais chama a atenção é que eu não tinha percebido que estava chovendo tanto. Por volta das 4h, de repente, ela começou a entrar e tivemos que deixar a casa com água já no joelho. Somos sete pessoas e tivemos que sair às pressas para não ficarmos presos”, afirma a empregada doméstica Onália Etelvina dos Santos, de 43 anos. A casa dela foi uma das mais atingidas pelo transbordamento do Ribeirão Mateus Leme, que inundou parte do Bairro Cidade Nova de Mateus Leme, em Juatuba, na Grande BH, tirando cerca de 70 pessoas de suas casas e atingindo 41 residências em maior ou menor escala. Bombeiros tiveram que salvar vários moradores que ficaram ilhados. Equipes por terra usaram cordas e boias para tirar cerca de 25 pessoas, enquanto o helicóptero Arcanjo também ajudou e resgatou uma família com quatro pessoas. A prefeitura decretou estado de emergência.


Segundo o coordenador da Defesa Civil de Juatuba, José Iraldo Androciolli, começou a chover forte na noite de terça-feira, por volta das 21h. “Choveu muito mesmo. Nem parecia que eram gotas de chuva, de tanta água que desceu. Por volta das 3h, fomos acionados por alguns moradores por conta do início de um alagamento. Não é a primeira vez que o Ribeirão Mateus Leme enche”, afirma o chefe da Defesa Civil. O manancial é um afluente do Rio Paraopeba, que também registrou uma cheia considerável na região, mas não passou por cima da calha. Outros pontos do Ribeirão Mateus Leme transbordaram, mas não houve registros de prejuízos da mesma forma.

Na casa do pedreiro Eneias Ribeiro dos Santos, de 40, o susto foi grande porque as ruas do bairro foram transformadas em córregos bem na sua porta, mas ele deu sorte de não ter o imóvel alagado. “Chegou na beirada do alicerce. Fiquei bem assustado porque a água subia com força contra o rio. Na verdade, nem dava mais para perceber onde estava o rio”, diz Eneias. Além das pessoas que precisaram de ajuda, animais também ficaram ilhados e mobilizaram os moradores. A reportagem flagrou uma mulher entrando nas ruas alagadas para resgatar dois cachorros.

Um dos primeiros militares do Corpo de Bombeiros a chegar ao local para auxiliar no salvamento dos ilhados foi o sargento Sérgio Aquino, do Pelotão de Juatuba.
“Nós entramos a pé, com coletes e boias. Fomos pegando todos que estavam nas casas atingidas, até porque não tínhamos tempo para esperar, graças ao risco de a água causar algum dano maior, como desabamento”, diz o militar. A equipe do sargento Sérgio tinha três bombeiros e foi auxiliada por outro grupo, com quatro militares. Mais quatro bombeiros trabalharam a bordo do helicóptero Arcanjo, comandado pelo major Anderson Passos. “Nós sobrevoamos o local para avaliar se havia alguma necessidade de salvamento e encontramos uma família acenando para nós do outro lado de uma rua que tinha correnteza forte. Desembarcamos um militar e um cabo de aço e resgatamos um por um”, afirma o major.

Ainda segundo Passos, cerca de 40% das mortes decorrentes do período chuvoso ocorrem pela atitude deliberada das pessoas, que tentam transpor algum curso d’água no momento de desespero. “Chegamos à conclusão que se elas tentassem fazer alguma coisa poderiam até morrer por conta da correnteza, sendo que se ficassem onde estavam o risco seria muito menor. Então, achamos melhor agir. Quando a enxurrada está na canela, não pise nela”, alerta o militar.

Na parte da tarde, depois que o nível da água diminuiu, algumas pessoas caminharam nas ruas alagadas para tentar chegar às suas casas. Um dos que não quiseram esperar foi o pedreiro Hilton de Souza, de 35.
Ele foi até a casa cercada de água nas ruas, mas ficou aliviado ao perceber que seu imóvel não chegou a ser inundado. “Um pouco de água chegou à minha entrada. Se minha casa fosse mais baixa eu estava lascado. Não pude esperar para entrar porque precisava pegar uma roupa. Agora é torcer para abaixar logo e eu voltar com minha família”, afirma. Na casa de Onália Etelvina, a água ainda cercava o imóvel à tarde.

O coordenador da Defesa Civil, José Iraldo, disse que quando o nível do ribeirão voltar ao normal será feita vistoria no local. A prefeita de Juatuba, Valéria Aparecida dos Santos (PMDB), informou que 13 famílias, totalizando 41 pessoas, se cadastraram para receber apoio da prefeitura. “Temos condições de acomodar os que se cadastraram. Os demais foram para casas de parentes ou conseguiram voltar para seus imóveis. Os animais resgatados, entre cachorros, gatos, galinhas, vacas e cavalos foram levados para o ginásio da cidade.

- Foto: Edésio Ferreira/EM/DA Press
"Como vou conseguir refazer tudo"
Onália Etelvina dos Santos, 43 anos, empregada doméstica

A água subiu de repente?
Sim, foi uma coisa meio assustadora. Os cachorros começaram a latir, mostrando que tinha alguma coisa errada. Porém, só percebemos o problema quando a água começou a entrar. Saímos já com água no joelho, não deu tempo de fazer nada, agora é contabilizar o prejuízo. Na minha casa, somos três famílias, somando sete pessoas.

Dá para ter ideia do que se perdeu?
Só sei que estou muito triste. Meu armário era novinho, eu tinha duas geladeiras. Isso tudo deve ter ido embora. A gente trabalha para isso. Eu saí do aluguel no Centro de Juatuba para morar em um lugar só meu e acontece isso. Ainda estou pagando o financiamento. Quase todos os móveis eram novos.

E agora, já sabe para onde ir?
Vou para o abrigo da prefeitura. Só me resta esperar essa água passar para ver o que aconteceu. Como vou conseguir refazer tudo? Não sei o que vai ser de mim e da minha família.
.