Ferros – “Perdi tudo que você tá vendo aí”, murmurou Raimundo da Fonseca, de 52 anos. Ele acabara de passar por uma poça d’água que batia no tornozelo para poder entrar em casa e mostrar a geladeira, o computador e os móveis destruídos pela cheia do Rio Santo Antônio no município de Ferros, no Região Central, a 180 quilômetros de Belo Horizonte. O vigilante trabalhava duro para tentar limpar o imóvel, que ele comprou em novembro graças a um empréstimo e que ontem tinha marcas de água barrenta na altura do armário da cozinha. Ele, a mulher e a filha são três dos cerca de 600 desalojados pela enchente de quarta-feira na cidade, considerada a maior desde 1979. Por causa dos estragos, o município chegou a decretar calamidade pública, na quarta-feira, mas corrigiu a medida para estado de emergência – nível menor de vulnerabilidade–, já que não houve mortes.
Um dia depois da cheia do Rio Santo Antônio, a cidade de pouco mais de 10 mil habitantes ainda exibia as marcas de água e lama. Havia vestígios até na parte alta, mas o cenário era pior nos bairros Sentinela, Areias, Rua do Campo e Loteamento do Célio. Em uma das ruas mais próximas do rio, o barro cobriu pedras do calçamento que havia sido construído recentemente. Em meio ao mau cheiro, famílias tentavam limpar o que era possível e reunir o que havia sobrado.
Uma escola estadual e o ginásio da cidade foram disponibilizados pela prefeitura para abrigar famílias atingidas pela enchente, mas todas preferiram levar pertences para esses locais e ficar em casas de parentes. Duas famílias foram levadas pela prefeitura para uma pensão a 12 quilômetros do município. Entre os moradores que tentavam ontem recuperar móveis e objetos, muitos demonstravam desolação ao descobrir que quase tudo se perdeu. “Aqui tem 200 reais, moça”, lamentou Rosali, esposa do vigilante Raimundo Fonseca, ao mostrar a mochila com livros e cadernos da filha, de 6 anos, totalmente molhados. Na casa dela, nem o kit de manicure que Rosali usa para trabalhar escapou. Vizinho da família de Raimundo, o motorista Jose Lucivânio de Oliveira, de 37, também contava os prejuízos. Ele perdeu porcos, galinhas e até o cachorro na enchente.
Ponte O prefeito de Ferros, Carlos Castilho Lage, também teve os fundos da casa onde mora atingido pela água do Santo Antônio. Ontem, ele se emocionou ao lembrar quando viu que a ponte de passagem de pedestres tinha sido destruída. “Eu perdi até a noção quando vi”, disse. Com medo de um desastre maior, ele determinou a interdição parcial da ponte de pedra, construída em 1949 e um dos pontos turísticos da cidade. O Corpo de Bombeiros chegou a avaliar que não havia necessidade de fechamento, mas diante de análises de técnicos da prefeitura que indicavam abalo na estrutura, o tráfego de caminhões pesados foi proibido – apenas veículos leves e caminhões-baú menores passavam ontem pelo local.
Quatorze localidades da região, entre distritos e povoados, foram atingidos pela enchente.