No combate ao Aedes aegypti, transmissor da dengue, chikungunya e zika vírus, o perigo muitas vezes vem do alto e passa despercebido dos olhos dos agentes da área de zoonoses. Em Belo Horizonte, o Estado de Minas registrou vários possíveis criadouros do mosquito em locais de difícil acesso, como marquises e coberturas de prédios, onde a água acumulada da chuva formar poças semelhantes a piscinas.
Somente na cobertura do Mercado Novo, que ocupa um quarteirão inteiro na Avenida Olegário Maciel, no Centro, as vigas de concreto da laje formam espaços similares a mais de 20 tanques, com cerca de 8 metros quadrados cada um, todos com água parada e sem proteção. Quem trabalha ou frequenta o prédio muitas vezes não tem noção do perigo, mas moradores de edifícios da vizinhança, conseguem enxergar o problema das suas janelas e se sentem ameaçados. É o caso da geógrafa Marisa Percope, síndica no prédio onde mora, na Avenida Bias Fortes com Praça Raul Soares. “Estou preocupada com uma possível infestação do mosquito na região”, alerta.
Perigo também na zona boêmia da capital. Na Rua Guaicurus, também no Centro, marquises acumulam água de chuva em uma distribuidora, localizada no número 698, e em uma lanchonete, no número 644. Mas, a situação é pior na Avenida Santos Dumont, 636, onde funciona o depósito de uma distribuidora no térreo e um hotel de alta rotatividade no andar de cima. A marquise do imóvel está repleta de água acumulada. Uma gambiarra de fios sobre a laje, submersos na água, ainda pode causar curto-circuito. Um prédio inacabado da Tupis com Rio Grande do Sul, no Hipercentro, tem várias poças de água no teto.
A geógrafa Marisa conta que quase todos os dias sobe na marquise e no telhado do prédio onde mora para olhar se há água acumulada. Ela conta que percorre também os 18 andares do imóvel em busca de possíveis focos de reprodução do mosquito. Mas, segundo síndica, a preocupação tem que ser de todos e muitas vezes o perigo mora ao lado. “O prédio vizinho mantinha a caixa d’água descoberta. A gente só descobriu porque o nosso prédio é mais alto. Reclamamos e eles vedaram a caixa com placas de metal”, disse. A preocupação da geógrafa agora é com o Mercado Novo. “O mosquito pode chegar ao meu prédio, mas quem trabalha ou frequenta o mercado corre mais risco ainda. Quem passa na rua, nem imagina a situação em cima dos prédios”, alerta a síndica.
A exemplo de cidades como Limeira e Santos, no estado de São Paulo, e Chapecó, em Santa Catarina, municípios mineiros como Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e Campo Belo, no Sul do estado, estão usando o drone para detectar possíveis focos do mosquito da dengue em locais de difícil acesso para os agentes de fiscalização, como telhados, marquises, coberturas de prédios e imóveis fechados ou abandonados.
O veículo aéreo não tripulado e manobrado por controle remoto sobrevoa os locais para mapeamento fotográfico. A tecnologia tem sido grande aliada para os mutirões de limpeza e campanhas educativas. Em Campo Belo, quando o drone identifica acúmulo de água em imóveis fechados, o dono que não tomar providências pode ser acionado judicialmente para acabar com a água acumulada.
PBH reage com cloro e multa
A Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) informou que em 2015 foram lavradas 75 multas por acúmulo de lixo, entulho, mato, água parada, reservatórios e outros recipientes abertos contendo água ou quaisquer outras condições que propiciem o criatório e abrigo para o Aedes aegypti. Sobre o Mercado Novo, que mantém verdadeiras piscinas no teto, a Saúde Municipal informou que o espaço é considerado um ponto estratégico e que é monitorado de 15 em 15 dias, quando os agentes colocam cloro e larvicida na água de chuva acumulada.
Em 2015, Belo Horizonte registrou 16.439 casos confirmados de dengue. Ainda há 2.820 casos suspeitos, de 2015 sob investigação. Em 2016, até o dia 22, a capital apresentou 229 casos confirmados de dengue. Há 2.699 casos notificados, pendentes de resultados. Além dos 229 confirmados, durante o ano de 2016, outros 98 notificados foram investigados e descartados. A regional com o maior número de casos confirmados é o Barreiro, com 57 ocorrências, seguida pelas regionais Noroeste (38) e Norte (29).
Ainda de acordo com a SMSA, a prefeitura, Coordenadoria Municipal de Defesa Civil e a Câmara do Mercado Imobiliário (CMI)/Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais, assinaram na quinta-feira termo de compromisso para adotar ações de combate aos focos do Aedes aegypti. “A campanha “Sim, nós temos a chave” tem o objetivo de mobilizar corretores, captadores, avaliadores, vistoriadores e clientes que visitam os imóveis desocupados, para que adotem atitudes simples, mas importantes para o combate ao mosquito transmissor da dengue, zika e chikungunya”, afirmou a SMSA.
“Durante as visitas aos imóveis, os corretores vão realizar um checklist de acordo com as especificidades do local, como: verificar se os ralos estão fechados; se as tampas dos vasos sanitários estão abaixadas; se há acumulo de água em algum local ou inservíveis nos quintais. Nos casos de imóveis novos e que não têm tampa no vaso, os corretores vão dar descarga sempre que visitá-los. As ações serão planejadas pela CMI”, informou a SMSA, por meio de nota.
Ainda de acordo com a secretaria, a Portaria 007/2007 autoriza o município a fazer a entrada forçada em imóveis, abandonados ou não, mas essa medida somente é executada em último caso, quando são esgotadas todas as tentativas para a visita dos agentes comunitários de endemias ao imóvel.
Nesses casos, 24 horas após a publicação da lista do endereço no Diário Oficial do Município (DOM), um agente vai até o local e coloca uma notificação no portão, avisando sobre a dificuldade de entrar no imóvel. Depois, o proprietário tem mais 24 horas para entrar em contato com a Gerência de Zoonoses para resolver o problema.
PALAVRA DE ESPECIALISTA
Erna Kroon, professora do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG
Risco até na menor fresta
“Certamente, os locais altos também são um risco para a proliferação do mosquito Aedes aegypti. Os telhados dos imóveis devem ser drenados. Se só tiver telha, a água escore paraaterra e vai embora. Agora, se tiver algum tipo de contenção, há risco, sim. E o problema não está apenas nos tetos e marquises. Nas casas, às vezes se drena a água de tubulações, mas há telhas abertas elas também acumulam água. Calhas também podem ser um criadouro se a água não for bem drenada. Não é um trabalho fácil, pois o mosquito é muito pequeno e entra em pequenas frestas.O drone pode ser um grande aliado nessa guerra contra o mosquito da dengue. Aliás, acho que vamos precisar de todas as possibilidades pensáveis e impensáveis, pois a luta é dura. Afinal,a gente sabe que atéu ma tampa de refrigerante que acumula água pode ser um criadouro.