Diante do primeiro grande teste do carnaval de 2016 de Belo Horizonte, a experiência que inaugurou a festa mostra que o aumento do público acabou criando conflito entre a animação dos foliões e o trânsito da cidade. O crescimento do Bloco Chama o Síndico, que este ano arrastou 40 mil pessoas – o dobro do ano passado –, pela Avenida Afonso Pena, no Centro da capital, segundo a Belotur, acende o alerta sobre o que vem por aí.
Com público mais discreto, mas animação de sobra, ontem quem comandou a festa foi o bloco Roda de Timbau, que misturou pré-carnaval e happy hour debaixo do Viaduto Santa Tereza, no Centro de Belo Horizonte.
A cor vermelha é a marca registrada do bloco que nasceu de um grupo de estudo sobre o timbau, instrumento muito usado na cultura africana e em rituais religiosos, como no candomblé e umbanda. A pedagoga Priscilla Bahiense, de 29 anos, foi vestida de melindrosa, tudo em vermelho, até a peruca. A estudante Ariana Ribeiro, de 25, caprichou no turbante e se divertiu com o ritmo e com clássicos da música baiana. “Tenho vários conhecidos tocando na banda. Muitos são de outros blocos e criaram o Roda de Timbau” disse Ariana.
Mas se ontem o grupo não trouxe maiores transtornos, até pelo local de sua concentração, a situação muda de hoje até terça-feira, quando mais de 250 blocos, alguns com previsão de público na casa das dezenas milhares de pessoas, vão percorrer ruas e avenidas de grande importância para a circulação em Belo Horizonte. A primeira experiência com o Chama o Síndico deixou isso bem claro.
Na quarta-feira, com o trânsito fechado na Afonso Pena inicialmente apenas no sentido rodoviária, não foi difícil encontrar carros e ônibus ilhados no sentido contrário, em meio à multidão que tomou conta dos dois sentidos da via quando o Chama o Síndico desfilava. A organização do bloco diz ter sentido falta de uma ação prévia mais abrangente da BHTrans, mas tanto a empresa que gerencia o trânsito em BH quanto a Belotur garantem que foi necessário agir pontualmente em tempo real, diante do aumento do número de pessoas que compareceram à festa.
Inicialmente, a previsão da BHTrans e da Belotur era de que apenas um sentido da Afonso Pena seria suficiente para absorver a demanda do bloco, o que justificaria o fechamento prévio das pistas em direção à rodoviária na altura da Avenida Getúlio Vargas. Porém, já durante a concentração, algumas pessoas passaram para a Rua Professor Morais e também para a pista contrária da Afonso Pena. A ocupação foi ainda maior na hora que o bloco saiu da concentração na Bernardo Monteiro para começar o desfile. A situação gerou tumulto no trânsito, já que não havia bloqueios para o tráfego em direção ao Mangabeiras.
Ônibus e carros ficaram presos, contando apenas com o diálogo entre motoristas e foliões para resolver o impasse e garantir a passagem, mesmo que lentamente, de quem precisava seguir motorizado. Os problemas foram observados em maior escala nos cruzamentos da Afonso Pena com as ruas Rio Grande do Norte e Bernardo Guimarães e com a Avenida Brasil. O tenente Abílio de Moura Barbosa Lima, que esteve à frente do policiamento em boa parte do desfile, disse que os policiais militares se depararam várias vezes com pessoas que não sabiam como iriam embora ou onde passava determinada linha de ônibus diante do trânsito fechado. “As pessoas sentiram falta de mais informações para se programar”, diz o militar.
Produtora do Chama o Síndico, Sílvia Andrade conta que, desde o ano passado, vem participando de discussões com órgãos públicos e que o trajeto do bloco que homenageia Tim Maia já estava informado a todas as autoridades. Ela explica que o percurso foi uma sugestão da própria BHTrans, diferente de duas opções dadas pela organização do bloco. “Na prática, entendi que o suporte da Belotur funcionou muito bem, mas havia poucos agentes da BHTrans, o que acabou complicando a situação, especialmente no início do deslocamento. Mas é claro que, como o bloco tem crescido demais, a gente sempre vai ter que pensar em estratégias para evitar problemas”, afirma Sílvia. A produtora reconhece que a situação melhorou à medida em que o bloco foi chegando perto do Hipercentro, com fechamentos mais organizados e melhor fluidez do desfile.
O diretor de Operações e Eventos da Belotur, Felipe Barreto, destaca que, por ser um evento em um dia de circulação normal na cidade e no fim de expediente, o Chama o Síndico teve características próprias, marca da folia na capital mineira. “Não temos em Belo Horizonte uma área em que a gente fecha tradicionalmente a cidade, como ocorre na Bahia, no Recife e no Rio de Janeiro. Como a festa transcorre de forma espontânea em pontos diferentes, há coisas que realmente são operadas em tempo real. Porém, isso não acontece por imprevisibilidade, mas sim garantindo que sejam atendidas as duas demandas: a comemoração dos foliões e a circulação das pessoas”, diz o diretor.
OPERAÇÕES Barreto acredita que mesmo com públicos maiores em blocos como Então, Brilha!, Juventude Bronzeada e Baianas Ozadas, a operação tende a ser mais fácil pois os desfiles ocorrerão durante o feriado prolongado. Mas, hoje, o desafio ainda persiste em blocos como o Tchanzinho da Zona Norte, que se concentra no Bairro Jaraguá, Região da Pampulha.
Em nota, a BHTrans afirma que quando se percebeu que o público do Chama o Síndico extrapolou a área prevista inicialmente, “prontamente os agentes realizaram ações operacionais para minimizar o impacto no trânsito”.
UMA PRÉVIA DA MISSÃO
Raio-X do Bloco Chama o Síndico
Público - 40 mil pessoas participaram do desfile, segundo a Belotur, o dobro da estimativa do ano passado
Trânsito - Sem fechamentos prévios no sentido Mangabeiras da Afonso Pena, houve muito tumulto com carros e ônibus que ficaram presos em meio à multidão. A situação melhorou quando o desfile se aproximou do Hipercentro
Banheiros - Houve reclamações sobre falta de banheiros, mas a Belotur avalia como suficiente os 300 que foram colocados na concentração, trajeto e dispersão, em cinco pontos diferentes. Serão disponibilizados 8 mil sanitários químicos para todo o carnaval
Sujeira - A SLU retirou 4 toneladas de lixo incluindo o trajeto do bloco e adjacências. Oitenta contêineres de 240 litros foram colocados nos pontos de concentração e dispersão, mas as pessoas reclamaram da falta de recipientes no trajeto, já que as lixeiras não suportaram a demanda. Três caminhões-pipa foram usados para lavar as ruas