Passado o impacto dos primeiros seis meses, Diego decidiu declarar sua nova condição de soropositivo, tanto na vida real quanto na internet (Orkut, Facebook, Instagram), bem como iniciou o tratamento com a terapia antirretroviral, que já está disponível no Brasil desde a década de 1990. Fez radicalmente o oposto do parceiro: “Seria indelicado culpar meu namorado, que veio a óbito (Diego evita falar a palavra morte) para não descobrir que tinha Aids. Ele tinha tanta fobia do diagnóstico e de ser rejeitado que pagou com a própria vida. Quando se internou nunca tinha feito antes o teste. A Aids se instalou muito rápido, ele teve uma série de complicações hepáticas e não resistiu. Chegou a me pedir perdão, mas acho que perdão é com Deus, não é comigo. Ele não me devia nada”.
Batalhador, Diego explica que se deu o tempo de seis meses para mergulhar no assunto e se empoderar, absorvendo conhecimentos sobre a forma de transmissão e sua nova rotina. Só então contou para os pais, a esteticista Aparecida Agostinho, a Cida, e o gráfico José Antônio Callisto, ambos de 57 e de Juiz de Fora. Separados desde os seis anos do filho, os dois voltaram a se falar em função da descoberta da sorologia de Diego. “O apoio da família é muito importante, fundamental. Minha mãe absorveu melhor a situação, também começou a ler muito a respeito e, a partir do momento em que me entendeu começou a trabalhar a situação com meu pai, com os outros familiares e até com os antigos professores, que ligavam lá para casa querendo saber o que estava acontecendo”, diz o jovem, que esperava que os pais reagissem de maneira pior, por terem vivenciado a época em que as propagandas oficiais proclamavam: Cuidado, Aids mata.
QUEBRA DO SIGILO Estudante do 6º período de medicina da UFMG, Gustavo Cardoso, de 23, já havia se submetido a dois testes rápidos anti-HIV, até por dever de ofício. Estimulado pelas últimas campanhas nacionais do Ministério da Saúde, que atualizaram o já batido slogan ‘use camisinha’ por #partiuteste, o universitário decidiu refazer o exame rápido no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) do PAM Sagrada Família, por uma questão de rotina, em 13 de maio do ano passado. Foi acompanhado de uma amiga, que aguardou até sair o resultado, em meia hora. Deu positivo. “Peguei o resultado de manhã e, à tarde, já estava na faculdade. Em função do meu conhecimento, já sabia tudo o que teria de fazer e achei que não era motivo para deixar de viver. Obviamente, tive meu momento de choro, mas acho que foi mais porque olhei para minha amiga e ela estava em prantos”, explicou.
Apesar do aparente distanciamento clínico, Gustavo buscou um caminho diferente em relação a outros colegas e amigos médicos, que também descobriram o diagnóstico do HIV, mas optaram pelo direito ao sigilo a respeito da sorologia positiva. “Para meus amigos mais íntimos já contei no primeiro dia e aos outros vou dizendo aos poucos. Dentro do código de ética médica, me sinto protegido do risco de sofrer preconceitos tanto de colegas quanto de pacientes, mas respeito aqueles que não queiram se consultar comigo”, afirma ele, que se identifica com a clínica médica e não tem planos de se tornar cirurgião. “No entanto, se por hipótese o cirurgião se cortar com os instrumentos se ele estiver tomando regularmente seus medicamentos, sua carga viral vai ser indetectável”.
MARCAS DO PASSADO
"Se pudesse voltar no tempo, eu teria mais cuidado e menos confiança no parceiro, ainda que fosse de um relacionamento de longo tempo"
Gustavo Cardoso, de 23 anos, estudante de medicina, soropositivo
Para Gustavo Cardoso, o maior tabu da Aids ainda está longe de ser vencido. “É difícil no Brasil chegar para um parceiro de longo prazo e propor a sorologia mútua: ‘E aí, vamos fazer a sorologia para ver como a gente está?’. O pedido ainda soa como uma quebra de confiança no outro, tanto em um relacionamento homoafetivo quanto heterossexual”, acredita o jovem, para quem essa seria uma atitude importante na guerra contra a Aids. “Ainda não dei início ao uso dos medicamentos, porque descobri recentemente, mas sempre converso com as pessoas com quem saio e aviso da minha sorologia, como eu gostaria que tivessem feito comigo. Levo a vida numa boa. Não é todo mundo que está preparado para aceitar, mas procuro conversar sempre e explicar tudo o que sei sobre o HIV. Tenho a expectativa de que, no futuro, quem me rejeitou consiga pensar melhor”, aposta. Agora, é regra: camisinha em 100% das relações sexuais.