Parque 'plantado' em lixão de Belo Horizonte chega aos 45 anos

Após romper com o passado de degradação, área verde no Bairro Betânia é hoje um dos mais importantes espaços de lazer, prática de esportes e contato com a natureza em BH

Valquiria Lopes
A área do parque, que chegou a armazenar mais da metade do lixo de Belo Horizonte na década de 1950, serve hoje como berço para espécies arbóreas e ornamentais - Foto: Leandro Couri/EM/DA Press
Uma terra que já recebeu carcaças de veículos, animais mortos, alimentos podres e, na década de 1950, chegou a armazenar mais da metade do lixo de Belo Horizonte, serve hoje de berço para centenas de espécies arbóreas e ornamentais e como habitat de uma rica fauna. Quem vê a exuberância do Parque Municipal Jacques Cousteau - área verde de 335 mil metros quadrados, no Bairro Betânia, na Região Oeste, - pode não imaginar essa transformação, ocorrida há quase meio século.

Neste ano, o parque completa 45 anos de existência e de rompimento com esse passado de degradação. Foi em 1971, que o então depósito de lixo foi transformado em área verde, destinada à produção de mudas de pau-ferro, quaresmeiras, sibipirunas, magnólias, ipês e outras espécies que hoje se tornaram árvores distribuídas por toda a cidade. A produção chegou a um milhão de exemplares por ano, até o local tornar-se jardim botânico, também destinado à pesquisa. Foi em 1998 que a reserva ecológica abriu suas portas à comunidade. E hoje é um dos lugares de inspiração, lazer, prática de esporte e de contato com a natureza mais importantes de BH.


Mas alcançar esse estágio não foi um processo fácil. Moradores que vivenciaram o fechamento do lixão contam que chegar a esses 45 anos é motivo de vitória.

Um deles, o aposentado Antônio Tiago dos Reis, de 71 anos, lembra dos vários protestos e abaixo-assinados para que o depósito fosse desativado. “Foi muito difícil, porque ao mesmo tempo que a população queria o encerramento das atividades, houve pessoas que mantiveram resistência porque viviam da catação de materiais no lixo. “Cheguei em 1964, quando construí bem em frente ao terreno. O cheiro era insuportável e as moscas tomavam conta de tudo em casa. Foi preciso muita luta, até conseguirmos”, lembra.

Bianca visita o Jacques Cousteau com o filho sempre que está em BH - Foto: Leandro Couri/EM/DA Press
De lá pra cá, não só vizinhos comemoraram a mudança. Moradores da Região Oeste, de toda Belo Horizonte e até de cidades vizinhas da região metropolitana visitam o Parque Jacques Cousteau para aproveitar as tantas opções de lazer. São cinco trilhas para passeios, parquinho infantil, pista de caminhada, academia a céu aberto, aulas de ginástica e de alongamento destinadas à comunidade.

O espaço tem ainda áreas de contemplação da natureza e é cortado por um córrego, o Bonsucesso. Tem também espécies nativas do cerrado, de quando era uma fazenda, antes de ter sido vendido à Prefeitura de Belo Horizonte. Nos últimos tempos, a área ganhou ainda mais visitantes depois de abrir espaço para a comemoração de aniversários e realização de piqueniques, visitas guiadas de escolas, além de eventos.

A chefe do Departamento Sudoeste da Fundação de Parques Municipais, Edanise Reis, que é responsável pelo Jacques e outras áreas verdes de BH, explica a transformação ocorrida com esse novo uso. “Todo fim de semana o parque fica lotado. As pessoas estão cada vez vindo mais e ficam encantadas quando chegam aqui, porque realmente o parque está lindo. Tem muitas áreas com sombra, espaços favoráveis à atividade física, recantos para as famílias aproveitarem e ainda jardins lindos para serem admirados”, afirma Edanise.


Ela lembra ainda que todo aniversariante que comemora a data no Jacques Cousteau planta uma árvore numa área que foi batizada de bosque dos aniversariantes. “Com isso, as pessoas criam um vínculo com o lugar e querem cada vez mais visitar e cuidar do parque”, diz. Segundo Edanise, podem ser feitas até seis reservas por fim de semana e já há  data marcada para as festinhas até em outubro.

A reserva ecológica é destinada também à pesquisa e é aberta ao público - Foto: Leandro Couri/EM/DA Press
E basta dar uma volta no parque para entender. Entre os funcionários está a alegria de trabalhar em um lugar tão agradável. Em meio aos visitantes, ficam os elogios. “A gente cuida de tudo com muito amor. A cidade precisa de mais espaços assim”, afirma o funcionário em serviços gerais Maurício Antônio Augusto, de 57 anos, que há pouco mais de um ano trabalha no Jacques Cousteau.

Já a estudante de medicina Bianca França, de 38 anos, não economiza. “Eu poderia ficar falando deste parque o dia inteiro, porque ele é muito bem cuidado, acolhedor e agradável. Quando estava estudando para medicina, vinha para cá e adorava o silêncio.
Mudei-me de BH, mas sempre que venho para cá, aproveito para passear aqui com meu filho Benjamim”, contou Bianca.

Casal passeia no parque, onde podem ser realizados piqueniques e festas - Foto: Leandro Couri/EM/DA Press
LINHA DO TEMPO

Veja a cronologia da criação do Parque Municipal Jacques Costeau

1949

A Prefeitura de Belo Horizonte compra um terreno de 468,5 mil metros quadrados em uma área chamada de Várzea do Felicíssimo, hoje conhecida como Bairro Betânia.

1951
O local passa a funcionar como um depósito de lixo, como produtos alimentícios estragados, ferro-velho, cacos de vidro, lixo hospitalar, cavalos e outros animais mortos, além de diversos materiais que ofereciam risco de contaminação

Entre 1955 e 1958
A Várzea do Felicíssimo recebia mais da metade de todo o lixo da cidade.

1971
Foi determinado o fim do depósito de lixo no local, por meio do Decreto Municipal 2.065, que criou o Parque Municipal da Vila Betânia (chamado hoje de Parque Municipal Jacques Cousteau). Na ocasião, o lugar funcionou como Horto da Betânia e era destinado à produção de mudas para toda a cidade.

1977
O horto foi transformado em uma reserva biológica.

1991
O espaço foi transformado em Jardim Botânico, onde foram mantidas as funções do horto de produção de mudas arbóreas e ornamentais.

1998
O parque recebeu o nome de Jacques Cousteau, em homenagem ao francês Jacques-Yves Cousteau, cientista preocupado com a preservação da diversidade biológica, que dedicou parte de seus estudos à Amazônia.

1999
Mesmo sem inauguração oficial, o parque foi implantado e aberto à comunidade. Atualmente, o espaço tem uma área de 335 mil metros quadrados.

Fonte: Fundação de Parques Municipais.