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Estado de Minas

Ministério Público quer prender 300 condenados pela Justiça em Minas

MP do estado reage à decisão do STF que permite a prisão de condenados em 2ª instância e defende detenção de três centenas de réus no estado. Juristas divergem sobre novidade, mas consenso é que impacto será forte no sistema carcerário


postado em 25/02/2016 06:00 / atualizado em 25/02/2016 07:29

O Ministério Público de Minas Gerais quer ver atrás das grades 300 condenados pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que estão hoje em liberdade. Para isso, o MP embargou a análise de três centenas de decisões judiciais de segunda instância – em tramitação na Procuradoria de Justiça de Recursos Especiais e Extraordinários Criminais – e já solicitou ao Judiciário estadual que seja aplicado novo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o assunto. Há uma semana, a corte decidiu mudar a jurisprudência sobre a prisão para o cumprimento da pena, autorizando que ela ocorra antes do trânsito em julgado da condenação – quando não há mais possibilidade de recursos. A decisão não é vinculante e, portanto, sua aplicação não é obrigatória. Mas, no entendimento de promotores, desembargadores e advogados, pode resultar em uma enxurrada de prisões de condenados que lançam mão de todas as possibilidades de recursos e agravos na tentativa de se manter soltos.

De acordo com o desembargador Alexandre Victor de Carvalho, da 5ª Câmara Criminal do TJMG, cerca de 70% dos réus que são condenados recorrem das decisões. Destes, metade fica presa preventivamente, enquanto os outros 50% apelam em liberdade. Apesar de se posicionar contrário à nova jurisprudência, o integrante da Justiça estadual estima que cerca de dois terços dos 35 desembargadores que integram as sete câmaras criminais do TJ devem seguir a decisão do STF. “Ainda não houve uma reunião para discutir o assunto e cada magistrado vai decidir de acordo com seu entendimento. Mas a tendência é de que as câmaras criminais sigam o posicionamento do STF. Com isso, a esmagadora maioria dos condenados deve ser presa, ainda que estejam recorrendo nos tribunais superiores”, afirma.

O desembargador explica que aqueles que decidirem acompanhar a decisão do STF terão como base o artigo 5º da Constituição Federal, defendendo que o trânsito e julgado seria a decisão de segunda instância. A partir daí, recursos podem ser interpostos, mas sem efeito suspensivo sobre a decisão do TJ. “Esses recursos nos tribunais superiores não versam sobre o fato ou a autoria. Se o crime aconteceu, se foi o réu o criminoso, isso já está esgotado na segunda instância. Aos demais tribunais cabe analisar se a lei foi devidamente cumprida, se os prazos foram respeitados, se as partes foram tratadas com igualdade ou se as normas constitucionais foram seguidas”, explica Alexandre Victor de Carvalho. Com a mudança, os desembargadores, que antes só poderiam determinar a prisão preventiva quando entendiam ser necessária, agora já podem determinar a execução da pena.

Os contrários à postura do STF podem se apoiar no entendimento, também embasado na Constituição, de que o trânsito em julgado significa não ser mais possível a interposição de recursos. “Com isso, o réu pode aguardar o recurso em liberdade”, acrescenta o desembargador, a não ser que exista a necessidade de prisão preventiva.

Contrário à decisão do STF, o criminalista Sérgio Leonardo, diretor da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Minas Gerais (OAB-MG) destaca três problemas no novo entendimento do Supremo. Ele entende que, do ponto de vista jurídico, foi ferida uma garantia constitucional. “Somente o Congresso Nacional poderia alterar a garantia da presunção de inocência, que na Constituição atual vai até o trânsito em julgado, ou seja, quando não cabem mais recursos”, afirma. Do ponto de vista prático, ele defende que o sistema carcerário já não suporta o excesso de presos provisórios e, com mais detenções, chegaria ao completo caos. O advogado ainda questiona o fundamento classificado como central pelos ministros, que foi o de atender aos anseios da sociedade. “Isso é inadimissível para um tribunal constitucional, que tem que respeitar a Constituição e as leis, sejam elas favoráveis ou não aos anseios da sociedade”, critica.

GIL RUGAI Apesar da controvérsia, o fato é que, com base na decisão STF, um caso emblemático no país já mudou de rumo. O ex-seminarista Gil Grego Rugai voltou a ser detido na noite de segunda-feira, horas depois ter a sua prisão decretada pela Justiça de São Paulo. Em 2013, ele foi condenado a 33 anos e nove meses de prisão pelo assassinato de seu pai, Luiz Carlos Rugai, e de sua madrasta, Alessandra de Fátima Troitino. O crime ocorreu em 2004, dentro da residência do casal em Perdizes, na Zona Oeste da capital paulista.

Em Belo Horizonte, um caso de homicídio escapou à nova regra. No último dia 4, o ex-empresário Leonardo Coutinho Rodrigues Cipriano, de 39, foi preso preventivamente depois de a Justiça manter, em segunda instância, sua condenação pelo assassinato do sócio Gustavo Felício da Silva, dentro da Boate Pantai Lounge, na Avenida Prudente de Morais, no Bairro Cidade Jardim, Região Centro-Sul. Preso preventivamente – e não para já iniciar o cumprimento da pena – ele foi colocado em liberdade no dia seguinte, beneficiado por um recurso ao Superior Tribunal de Justiça. Se o julgamento fosse após o novo entendimento do Supremo, o TJ poderia ter determinado que fosse iniciado o cumprimento da pena, ainda que houvesse apelação.

MAIS RIGOR Na avaliação do coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do MP, Marcelo Mattar Diniz, a decisão do STF foi uma das mais acertadas dos últimos tempos. “Vai ajudar a reduzir a sensação de impunidade. O Brasil estava na contramão da história. A maioria dos países no mundo não permite a liberdade depois da segunda instância. O réu pode até recorrer em liberdade na primeira instância, mas depois de condenado, fica preso. Nos Estados Unidos o rigor é ainda maior, já que a pessoa fica presa já quando condenada pelo primeiro tribunal”, disse.

Desembargado e promotor concordam sobre o impacto das mudanças no sistema prisional diante da enxurrada de decisões de prisão por parte do TJ. “Isso vai ter interferência direta no sistema carcerário, que já enfrenta o desafio da superlotação. A situação vai ficar ainda pior. E a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) vai ter que fazer uma reavaliação do seu planejamento carcerário dia a dia, diante da falta de vagas”, concluiu Alexandre Victor de Carvalho.

Em nota, a Seds informou que não tem uma avaliação sobre o impacto do novo entendimento sobre o sistema carcerário. Atualmente, a população carcerária de Minas Gerais é de 68.810 presos, sendo 59.747 encarcerados em unidades da Subsecretária de Administração Prisional (Suapi); 4.399 em unidades da Polícia Civil; 2.661 nas associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apacs); 89 em dependências da Polícia Militar; e 1.914 monitorados por tornozeleira eletrônica. Do total de presos no estado, 65.401 são homens e 3.409 são mulheres.

Jurisprudência

Por 7 votos a 4, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no último dia 17, admitir que um réu condenado na segunda instância comece a cumprir pena de prisão, ainda que esteja recorrendo aos tribunais superiores. Com a mudança, bastará a sentença condenatória de um tribunal estadual ou de um tribunal regional federal para a execução da pena. Desde 2009, o STF entendia que o condenado poderia continuar livre até que se esgotassem todos os recursos no Judiciário, por respeito ao princípio da presunção de inocência. Com isso, desembargadores só poderiam expedir pedidos de prisão preventiva, mas não de execução da pena.


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