Mariana – Uma manhã de tristeza, mas também de esperança.
As famílias se encontraram por volta das 8h, no Centro de Mariana, de onde partiram em dois ônibus com destino a uma área de 100 hectares onde poderão começar vida nova. O terreno, que pertence à Arcelor Mittal, foi o escolhido pela maioria dos desalojados para sediar o distrito a ser reconstruído. “A Samarco tem de nos apresentar três opções de terreno. Mas nós pedimos prioridade para este. É o que a maioria deseja”, disse Antônio Gonçalves Pereira, o Da Lua, um dos integrantes da comissão de ex-moradores do povoado devastado pela lama.
A área fica a 12 quilômetros do Centro histórico de Mariana, metade do caminho entre a sede da cidade colonial e o antigo povoado de Bento Rodrigues.
“Eu vendia ovos em Ouro Preto nos fins de semana. Só de galinha botadeira eu tinha 26. Sem contar as frangas e os pintinhos. Também tinha muitos patos. Uns 20 filhotes morreram na lama. Deu dó de ver”, conta seu Aílton, enquanto ouve, a alguns metros, a brincadeira feita pelo amigo Antônio Lopes, de 40: “Já vou marcar o meu lote”.
Antônio morava em uma chácara no antigo povoado. Um dos charmes do lugar era o fogão a lenha. As jabuticabeiras garantiam uma sombra valiosa nas tardes ensolaradas. “Hoje estou num apartamento, sem fogão a lenha e sem quintal. Torço muito para que as casas fiquem prontas rapidamente”, planejava o rapaz.
Na próxima quarta-feira, o promotor Guilherme de Sá Meneghin, que acompanha o drama dos ex-moradores e algumas das ações judiciais decorrentes do desastre, visitará o local.
RUÍNAS E CICATRIZES Eva Aparecida de Souza, de 48, ficou encantada com o lugar. Depois de conhecer o terreno, ela e os amigos aproveitaram para uma visita ao antigo povoado. Tão logo chegou em frente à casa onde morava, ela se emocionou. “Pensar que tudo o que a gente conseguiu na vida foi embora em minutos... Recordo de a gente correndo na frente e a lama atrás.”
Houve quem chorasse. Uma criança que aparentava 10 anos, aos gritos, pedia ao pai para não ir até o meio das ruínas: “Vai não, vai não, papai”. A mãe da garota, confortando-a nos braços, tentou acalmá-la: “Ele vai voltar filha. Mas pode chorar, pode desabafar”.
Um deles era Antônio Prisco de Souza, que tinha 71 anos. Era tio de Helena da Silva, de 47. Nascida e criada no povoado, ela andou a passos lentos entre as ruínas. “Já chorei muito. Não tenho mais lágrimas. A gente vê as coisas da gente, desse jeito, tudo perdido. Pensei, logo depois que a barragem estourou, que eu ia entrar em depressão. E quase aconteceu.”
O leito do Rio Gualaxo do Norte, que margeia o povoado, continua turvo. A quantidade de lama ainda impressiona quem chega ao lugar, onde uma cerca de arame farpado foi montada para evitar a entrada de estranhos. Algumas árvores frutíferas, contudo, resistiram à avalanche de rejeitos de minério. Goiabas e mamões, por exemplo, carregaram alguns pés.
O povo aproveitou para levar frutas para casa. Seu Aílton, o homem que criava galinhas e patos, planejou em voz alta: “Quando o novo Bento for construído, vou ter novamente um pé de mexerica, um de laranja e um de pêssego”..