Os arrastões testemunhados durante o carnaval foram as cenas mais extremas da insegurança que ronda a Savassi. Situações que levaram o comandante do policiamento da região a declarar que a Praça Diogo de Vasconcelos não é local adequado para grandes eventos, com aglomeração de milhares pessoas. A mesma posição foi expressada pelo diretor do Conselho Savassi da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), Alessandro Runcini. “A violência na Savassi fica em evidência por causa da importância que o bairro tem para Belo Horizonte. A Polícia Militar faz um excelente trabalho, somos parceiros com a rede de comerciantes protegidos por aplicativo de celular, o que lhes permite ter 250 olhos e ouvidos, mas cobramos mais efetivo e a instalação de câmeras de vigilância”, afirma Runcini.
De acordo com ele, está prevista ainda para este ano a instalação de 10 câmeras para operação da polícia. “Com isso, podemos chegar a 18 câmeras que vão ajudar a prevenir crimes que assustam a comunidade, como roubos e arrombamentos”, acrescentou. Para ele, a violência está em toda a cidade, mas se destaca mais na Savassi. “Para começo de conversa, precisamos ter em mente que não estamos nem na Suécia nem no Canadá. Considerando isso, a Savassi ainda está entre os bairros com menor índice de violência, apesar da grande movimentação de pessoas. Tirando os grandes eventos, no dia a dia é bem tranquila”, considera Runcini.
A farmacêutica Ruth Marins Cereda Melo, de 35 anos, mora na Savassi há cinco e gosta de sair pelo bairro para passear com a filha Lara Cereda Melo, de 1 ano e 2 meses. Mas não o faz sem preocupação, pois considera que a violência ocorre também em dias comuns. “Aqui tem um clima aconchegante, apesar dos riscos sobre os quais a gente fica sabendo, como a ação de trombadinhas. Já vi gente sendo roubada às 9h, bem na minha frente. Falta um pouco mais de segurança. Flanelinhas importunam muito a gente. Nisso, os shoppings são mais tranquilos”, considera.
Um ícone esquecido
Sem perspectiva de requalificação de mais quarteirões da Savassi, uma das opções para retomar atividades culturais na região seria reativar o Cine Pathé. Em 2013, a Fundação Municipal de Cultura (FMC) propôs ao proprietário da edificação usar um maior potencial construtivo para erguer um edifício no local, tendo como contrapartida a recuperação do cinema e seu uso como espaço para atividades artísticas. Estava previsto o funcionamento da sala de exibição de filmes, um centro cultural e um café, a serem abertos até o ano passado. Contudo, segundo a FMC “o proprietário voltou atrás e as negociações atualmente se encontram estagnadas”.
O cinema é um dos remanescentes do bairro original e um ponto de encontro da vizinhança. “As pessoas se encontravam na Padaria Savassi, de manhã e no fim da tarde, quando saía o pão quentinho, e depois iam ao Cine Pathé”, lembra a socióloga e ex-secretária municipal de Cultura, Maria Celina Pinto Albano, que escreveu um livro sobre o cinema. “A Savassi era o bairro de BH com o comércio mais sofisticado. Hoje, passo por lá e vejo a crise atacando, um bom número de lojas fechadas ou para alugar e o próprio cinema abandonado e desativado. Poderia ser um ator de reversão dessa decadência. Para reverter um cenário em ruína, pois temos de criar um polo de atrações”, disse. Para a ela, trazer atrações como o carnaval não será suficiente para reerguer o bairro. “O carnaval é muito efêmero, não reverte a ocupação de um espaço urbano. Os próprios comerciantes teriam de se juntar ao poder público para trazer propostas de um cotidiano mais envolvente”, disse.
Decadência ate às portas
Em praticamente todos os quarteirões da Savassi há lojas de portas fechadas ou com placas para aluguel. O fenômeno, que muitos associam ao desinteresse pelo local, para representantes do setor comercial e imobiliário tem mais a ver com as obras de requalificação. “Os comerciantes da Praça Diogo de Vasconcelos ficaram um ano com as portas praticamente fechadas, e isso trouxe muitos prejuízos. Minha recomendação era de fechar cada um dos quatro quarteirões a cada seis meses, mas a prefeitura preferiu atacar tudo de uma só vez”, disse Edwiges Leal, autora do projeto.
Após a inauguração, os comerciantes sofreram outro baque. “Os preços dos aluguéis subiram demais, acima da realidade. Os proprietários dos imóveis acharam que seus edifícios se valorizaram, mas imóveis comerciais só se valorizam se aumenta o público comprador, não são como as residências”, pondera o diretor do Conselho Savassi da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), Alessandro Runcini.
"Mudou muito quando fecharam as ruas Pernambuco e Antônio de Albuquerque. Isso reduziu as vagas de estacionamento e também um pouco o movimento em alguns quarteirões. A gente acreditou que isso seria bom, que faria da Savassi um shopping ao ar livre, mas só trouxe aluguéis mais caros”, conta José Gonçalves Lopes, de 69 anos, do Salão do Lopes, que funciona há 38 anos na Savassi.
Os dourados
Muitos dos clientes se lembram das épocas douradas do bairro, como o empresário Ernesto Lolato, de 64. “O comércio na Savassi era diferente do encontrado no Centro. Você sempre sabia em que loja procurar exatamente o que estava precisando e se tornava cliente, como sou do Salão do Lopes há 20 anos.” O engenheiro Marcos Oroncio Dutra, de 58, frequenta o bairro desde a infância, pois a casa da avó era lá. “É muito interessante ver que ocorreram mudanças radicais. A Savassi era um dos poucos points dos jovens, assim como a Pizzarella, na Avenida Olegário Maciel, a Brunela e a Pizzaria Mangabeiras, no alto da Afonso Pena. Hoje, todos os bairros têm restaurantes e bares para as pessoas se encontrarem.”
Proprietário de um dos bares mais antigos em atividade na Savassi, João Pimenta diz que tem uma fórmula simples de manter seus negócios e, na direção contrária da onda de decadência, está ampliando o estabelecimento. “A Savassi é o charme da cidade. Nestes 30 anos, muitos dos clientes costumeiros têm sido os mesmos, enquanto outros vão se renovando, entre estudantes de faculdades, principalmente. Aqui é muito frequentado por metaleiros, intelectuais e jornalistas”, conta. “Daqui, vi muitas fases: dos metaleiros, dos hippies, dos pagodeiros... Agora tem até ponto de Uber aqui na porta. Na década de 1990, a Bartucada de Diamantina começava aqui os encontros, sempre duas semanas antes do carnaval”, lembra. “Fizemos até um álbum de figurinhas com os clientes. Meu bar é como a Savassi: acolhe bem as pessoas, recebe gente de todo tipo, que, por isso, se sente bem e volta.”